RAMIRO ROCKENBACH DA SILVA MATOS TEIXEIRA DE ALMEIDA

REPRESENTAÇÃO Ao Exmo. Dr. RAMIRO ROCKENBACH DA SILVA MATOS TEIXEIRA DE ALMEIDA Ministério Público Federal – MPF Salvador/BA Salvador, 12 de maio de ...
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REPRESENTAÇÃO

Ao Exmo. Dr. RAMIRO ROCKENBACH DA SILVA MATOS TEIXEIRA DE ALMEIDA Ministério Público Federal – MPF Salvador/BA Salvador, 12 de maio de 2009

Nós, do MOVIMENTO PRÓ-RESEX BAIA DO IGUAPE (organização que integra

associações

extrativistas,

movimentos

sociais,

organizações

ambientalistas e pesquisadores de universidades públicas), baseado na legislação vigente no país, em nosso Estado da Bahia e em diversas Convenções Internacionais das quais o Brasil é signatário, vem oferecer representação contra o Governo do Estado da Bahia, em especial pela atuação da Secretaria Estadual da Indústria, Comércio e Mineração - SICM no processo de implantação do Pólo Industrial Naval na Reserva Extrativista Marinha Baia de Iguape.

Têm sido amplamente veiculado pelo Governo do Estado da Bahia informações de que o próprio Governo pretende implantar um Pólo Industrial Naval dentro da Unidade de Conservação Federal Reserva Extrativista Baia do Iguape, atendendo inclusive o interesse de grandes empreiteiras (OAS, Odebrecht e UTC). Neste sentido, já vem tomando algumas medidas, a exemplo da publicação de decretos de utilidade pública de algumas áreas para fins de desapropriação. Diante das considerações elencadas abaixo, solicitamos o que se segue:

CONSIDERANDO que a Baía do Iguape é uma região estuarina que apresenta as áreas de manguezal mais conservadas da Baía de Todos os Santos, remanescentes de Mata Atlântica e restingas que, conforme a 1

Constituição do Estado da Bahia, são consideradas Áreas de Preservação Permanente no Artigo 215;

CONSIDERANDO que os manguezais integram um sistema altamente produtivo, de insubstituível importância como maternidade e berçário da vida marinha, além de contribuir para o controle da erosão costeira, proteção de aqüíferos costeiros e outros serviços ambientais;

CONSIDERANDO que esses ambientes abrigam inúmeras espécies da fauna e da flora, aquáticas e terrestres, algumas das quais consideradas ameaçadas de extinção, conforme a Lista Nacional das Espécies Ameaçadas de Extinção (Instrução Normativa MMA No 003, de 26/05/2003);

CONSIDERANDO que estes manguezais, pela sua importância, têm papel estratégico para o equilíbrio dos estoques pesqueiros do conjunto da BTS e caso sejam afetados podem trazer impactos negativos para pescadores de outras regiões que extrapolam os limites da Baía do Iguape.

CONSIDERANDO que alguns destes ambientes constituem áreas de alimentação e descanso para aves migratórias, protegidas por convenções internacionais (Anexo I – Convenção de Ramsar);

CONSIDERANDO que nesta área existe um grande número de nascentes, fontes, cachoeiras, aquíferos e fozes de diversos rios e córregos, que são fonte

de

abastecimento

das

populações

locais

(Lei

Estadual

No

10.432/2006);

CONSIDERANDO a presença de mamíferos aquáticos na Baia de Iguape, a exemplo da espécie Sotalia guianensis (conforme Anexo II), inserindo a localidade no dispositivo do Decreto No 6.698, de 17/12/2008, que declara as 2

águas jurisdicionais marinhas brasileiras Santuário de Baleias e Golfinhos do Brasil;

CONSIDERANDO que esses frágeis ecossistemas compõem a Reserva da Biosfera

da

Mata

Atlântica

no

Estado

da

Bahia,

reconhecida

internacionalmente pela UNESCO (conforme Anexo III – Mapa da RBMA);

CONSIDERANDO que nesta área existem 25 comunidades reconhecidas como Quilombolas pela Fundação Palmares, e que existem outras três em processo de reconhecimento, utilizando-se, de forma tradicional, dos recursos naturais da Reserva Extrativista Baia de Iguape para a sua reprodução física e cultural (conforme Anexo IV - levantamento realizado pelo Projeto GeografAR, da Universidade Federal da Bahia);

CONSIDERANDO ainda que estas comunidades são protegidas por legislação constitucional e por acordos internacionais em que o Brasil é signatário como, por exemplo, a Resolução 169 da OIT;

CONSIDERANDO que, para proteger estes importantes ecossistemas e o meio de vida destas comunidades tradicionais, foi criada em 11/08/2000 a Reserva Extrativista Marinha da Baía de Iguape (Decreto de 11 de agosto de 2000);

CONSIDERANDO que “Reserva Extrativista é uma área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte, e tem como objetivos básicos proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade”, (Art.18 da Lei N. 9.985/ 2000 – Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC); 3

CONSIDERANDO que os ambientes localizados na RESEX Baía do Iguape e em seu entorno, segundo estimativa do Movimento dos Pescadores e Quilombolas da Bahia, representam o meio de vida para cerca de 6.000 famílias que correspondem a um cálculo de 30.000 pessoas;

CONSIDERANDO

que

o

Governo

do

Estado

da

Bahia

escolheu

especificamente esta área para a construção de um Pólo Industrial Naval (conforme mapas no Anexo V), desrespeitando todas as características ambientais e socioeconômicas locais, entrando em choque inclusive com a legislação federal citada anteriormente, em especial com o Decreto de 11 de agosto de 2000 que cria a RESEX Baía do Iguape;

CONSIDERANDO que o Governo do Estado da Bahia já decretou como utilidade pública duas áreas para fins de desapropriação (decretos No 11.234 de 10/10/08 e No 11.409 de 19/01/2009), objetivando a construção do referido Pólo Industrial Naval, desrespeitando a própria Lei do SNUC (Lei No 9.985 de 18/07/2000);

CONSIDERANDO que a área de interesse do Pólo Industrial Naval e das empreiteiras é uma Reserva Extrativista Federal, sendo declarada como ESPAÇO TERRITORIAL DE INTERESSE ECOLÓGICO E SOCIAL, conforme Decreto No 98.897 de 30/01/90;

CONSIDERANDO que já está sendo divulgada - através de matérias na imprensa, de vídeos institucionais, no portal eletrônico do Governo do Estado e em apresentações públicas nas escolas locais - a construção de três grandes estaleiros e de um canal que permitirá a instalação de estaleiros menores,

especializados

em

embarcações

de

alta

tecnologia,

desrespeitando o Decreto de criação da RESEX e a Lei No 9.985/2000, que 4

institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (conforme Anexo VI);

CONSIDERANDO

os

graves

impactos

sócio-ambientais

que

serão

provocados pelo empreendimento, conforme parecer técnico elaborado por pesquisadores de Universidades Baianas (Anexo VII), dos quais destacamos agressões à restinga e ao manguezal (fonte de renda dos pescadores) e agressões à Mata Atlântica (fonte de renda de extrativistas da piaçava);

CONSIDERANDO

que

existe

a

preocupação

quanto

ao

risco

de

contaminação dos aqüíferos livres e artesianos pelo uso de substâncias químicas, especialmente o Ferro, um precursor do fenômeno da maré vermelha, com impactos inestimáveis para as populações dos trabalhadores da pesca da RESEX e seu entorno;

CONSIDERANDO os aspectos de segurança no trabalho dos pescadores, cuja atividade é caracterizada pelo uso de pequenas embarcações, que certamente serão afetados pela circulação de navios de grande monta;

CONSIDERANDO os reflexos dos impactos ambientais sobre os estoques pesqueiros que certamente diminuirão a quantidade e qualidade do pescado, afetando a renda da população local que tem na pesca a principal fonte de subsistência;

CONSIDERANDO que a construção e o funcionamento de um Pólo Industrial Naval implicam em uma série de impactos sociais, culturais e ambientais, onde as atividades de caráter industrial são totalmente incompatíveis com os objetivos de uma Reserva Extrativista;

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CONSIDERANDO que o empreendimento prevê a geração de 10 mil empregos, sem especificar quais serão temporários, oferecidos apenas durante a fase de construção dos estaleiros, quantos serão permanentes, e quais os percentuais e tipos de cargos oferecidos para os moradores da região;

CONSIDERANDO que o volume significativo de pessoas a ser atraído para os municípios do entorno na fase de construção do Pólo, sugere grandes impactos sociais e na infra-estrutura destes municípios, cujas medidas de planejamento e precaução nunca foram expostas;

CONSIDERANDO os impactos paisagísticos dos estaleiros em toda a região, com efeitos negativos sobre o turismo e sobre os saberes tradicionais dos pescadores (as);

CONSIDERANDO os impactos cumulativos que indicam a falta de capacidade de suporte para outros empreendimentos industriais nesta área, especialmente de grande monta como é este caso, uma vez que a Reserva Extrativista já está afetada pela UHE Pedra do Cavalo, Gasoduto CacimbasCatu, Gasoduto Manati e Porto da Petrobrás;

CONSIDERANDO que existem indícios de que o decreto de desapropriação da área em Maragojipe foi realizado utilizando-se de práticas ilícitas (Notificação nº 355096 endereçada para SUDIC), como devastação de Mata Atlântica e desmatamento de nascentes na obtenção de coordenadas dos decretos de desapropriação (Fotos - Anexo VIII), contratando trabalhadores clandestinamente sem nenhum tipo de formalização, sem qualquer licença ambiental, havendo inclusive indícios de improbidade administrativa de participação de funcionários públicos de alto escalão do Governo do Estado da Bahia; 6

CONSIDERANDO que as ações citadas acima estão sendo realizadas pelo Governo do Estado da Bahia sem a aprovação do Estudo de Impacto Ambiental, da alternativa locacional do empreendimento e sem manifestação do Conselho Deliberativo da RESEX Baía do Iguape, criando na sociedade local a falsa impressão de que estas etapas já foram superadas;

CONSIDERANDO que ainda que venham a ser seguidos os procedimentos normativos para a declaração de interesse social, autorizando-se com isso a intervenção em área de MANGUEZAL, esta intervenção deverá ser realizada com atividades de baixo ou baixíssimo impacto, o que definitivamente não é o caso de um Pólo Industrial Naval (Resolução CONAMA No 341, de 25/09/2003); e

CONSIDERANDO que a implantação deste Pólo Industrial Naval em uma área de Reserva Extrativista, cria um precedente perigoso para todas as Reservas Extrativistas do Brasil,

O MOVIMENTO PRÓ-RESEX BAIA DO IGUAPE vem solicitar a esta Procuradoria, pelos meios disponíveis, que promova a adoção de todas as medidas necessárias para investigar os fatos denunciados, com a instauração urgente de procedimento administrativo, em especial que:

1 – oficie aos Governos Federal e ao Estado da Bahia para prestar esclarecimentos sobre a viabilidade da construção do Pólo Industrial Naval na localidade identificada e quais as alternativas locacionais levantadas;

2 – solicite toda e qualquer anulação de Decreto, ou outro dispositivo, desapropriando terras, doando para particulares e/ou com fins de utilidade pública, na Reserva Extrativista Marinha da Baía do Iguape e em seu 7

entorno, para atender a construção do Pólo Industrial Naval, uma vez que esta área já é de interesse ecológico e social destinadas a práticas extrativistas;

3 – seja requerida, por ação competente, a suspensão em caráter emergencial da veiculação do filme institucional para implantação do Pólo Naval na área da RESEX do Iguape, já que o mesmo está informando ao público, antes de aprovação legal, a exemplo do licenciamento, que o projeto será construído;

4 – solicite, por ação competente, a declaração de NULIDADE da DECLARAÇÃO

DE

INTERESSE

SOCIAL

concedida

em

favor

do

empreendimento PÓLO NAVAL;

5 – Recomende aos empreendedores que SE ABSTENHAM de realizar qualquer intervenção e atividade na área do empreendimento até que seja devidamente discutido o EIA-RIMA que solicita o licenciamento ambiental;

6 – REQUEIRA A NULIDADE de quaisquer LICENÇAS AMBIENTAIS para construção do Pólo Industrial Naval na Reserva Extrativista Marinha da Baía do Iguape e seu entorno, junto aos órgãos ambientais estadual e federal.

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