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ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO PROCURADORIA-GERAL FEDERAL PROCURADORIA FEDERAL JUNTO À UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ GABINETE DOS PROCURADORES PF/UFPR

NOTA n. 00289/2017/GAB/ PROC/PFUFPR/PGF/AGU NUP: 23075.213137/2017-19 INTERESSADOS: GABINETE DO REITOR DA UFPR ASSUNTOS: DIREITO DE GREVE

1. Cuida-se de expediente encaminhado pelo Magnífico Reitor para análise e manifestação acerca de ofício do Sindicato dos Trabalhadores em Educação das Instituições Federais de Ensino Superior no Estado do Paraná - SINDITEST-PR comunicando que em assembleia geral extraordinária do Sindicato deliberou-se pela deflagração de greve por tempo indeterminado a partir de 10/11/2017 pelas razões expostas no documento. 2. Considerando as prerrogativas constitucionalmente estabelecidas em face do Art. 131, caput, quanto à natureza consultiva da Advocacia Geral da União, bem como sua função essencial no acompanhamento dos atos da Administração Pública afim de aferir segurança jurídica, emite-se a presente manifestação em face de consulta encaminhada pelo Magnífico Reitor da UFPR sobre os aspectos formais da comunicação/notificação apresentada pelo SINTEST-PR sobre a deliberação de greve por parte dos servidores técnicos. 3. De início, cumpre dizer que o direito de greve está expressamente previsto na Constituição Federal. Todavia no que toca ao direito de greve de servidores públicos, a norma constitucional definiu que o direito será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica (Art. 37, VII). Como se sabe, até o presente momento o poder legislativo não deliberou sobre o tema. 4. Ante a ausência de atuação do legislador, coube ao poder judiciário manifestar-se acerca das consequências jurídicas incidentes sobre os servidores que aderem a movimento grevista. Nesse sentido, a jurisprudência do STF nos últimos anos evoluiu para estabelecer regras que disciplinam o direito de greve por parte dos servidores públicos. 5. Em recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (27/10/2016), ao julgar o Recurso Extraordinário 693456-RJ, que tinha repercussão geral reconhecida, aquela corte decidiu por maioria de votos que a Administração Pública deve fazer o "corte do ponto" dos servidores grevistas. Portanto, restou agora definitivamente afastada qualquer dúvida da legitimidade do não pagamento a servidores grevistas, bem como o dever de a Administração proceder a esses descontos de ofício, ressalvada a possibilidade de compensação dos dias parados mediante acordo. Por pertinente, trago à baila trecho do voto do Relator, Ministro Dias Toffolli: [...] a aplicação do art. 7º da Lei nº 7.783/89 – determinada por esta Corte -, que estabelece que a “participação em greve suspende o contrato de trabalho”, induz ao entendimento de que, em princípio, a deflagração de greve corresponde à suspensão do contrato de trabalho. Isso porque, na suspensão não há falar em prestação de serviços, tampouco no pagamento de sua contraprestação. Desse modo, os servidores que aderem ao movimento grevista não fazem jus ao recebimento das remunerações dos dias paralisados, salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento ou por outras situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão da relação jurídica de trabalho e, por consequência, da atividade pública.

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Com efeito, conquanto a paralisação seja possível, porque é um direito constitucional, ela tem consequências. Esta Corte Suprema já assentou o entendimento de que o desconto dos dias de paralisação é ônus inerente à greve, assim como a paralisação parcial dos serviços públicos imposta à sociedade é consequência natural do movimento. Esse desconto não tem o efeito disciplinar punitivo. Os grevistas assumem os riscos da empreitada. Caso contrário, estaríamos diante de caso de enriquecimento sem causa a violar, inclusive, o princípio da indisponibilidade dos bens e do interesse público. Isso não significa que o legislativo não possa, com a edição de lei regulamentadora, entender por configurar o movimento grevista como hipótese de interrupção do contrato de trabalho. É certo que, para o caso do servidor estatutário, não existe propriamente um “contrato de trabalho”. Entretanto, a leitura do dispositivo não impede sua plena adequação e a aplicação de seus efeitos jurídicos indistintamente ao empregado público e ao servidor público (em seu sentido estrito), mesmo porque, para esse último, sua participação no movimento paredista não pode ser considerada como gozo de férias, licença, abono ou compensação. Podemos concluir, portanto, que se trata de um “afastamento” não remunerado do servidor, na medida em que, embora autorizado pela Constituição Federal, essa não lhe garantiu o pagamento integral de seus proventos. Assim, em razão da ausência de prestação específica do serviço por parte do grevista, os descontos devem ser realizados, sob pena de se configurar, como frisado, hipótese de enriquecimento sem causa. [...] Ante o exposto, aderindo à proposta formulada pelo Ministro Roberto Barroso, voto para que seja fixada a seguinte tese de repercussão geral: “A administração pública deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de acordo. O desconto será, contudo, incabível se ficar demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita do Poder Público”. (Grifo nosso)

6. Superada a discussão acerca da constitucionalidade do corte de ponto de servidores grevistas, importante ressaltar as disposições do Decreto nº 1.480, de 3 de maio de 1995, o qual estabelece procedimentos a serem adotados pela Administração em casos de paralisações dos serviços públicos federais, nos termos que se seguem: Art. 1º Até que seja editada a lei complementar a que alude o art. 37, inciso VII, da Constituição, as faltas decorrentes de participação de servidor público federal, regido pela Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, em movimento de paralisação de serviços públicos não poderão, em nenhuma hipótese, ser objeto de: I - abono; II - compensação; ou III - cômputo, para fins e contagem de tempo de serviço ou de qualquer vantagem que o tenha por base. § 1º Para os fins de aplicação do disposto neste artigo, a chefia imediata do servidor transmitirá ao órgão de pessoal respectivo a relação dos servidores cujas faltas se enquadrem na hipótese nele prevista, discriminando, dentre os relacionados, os ocupantes de cargos em comissão e os que percebam função gratificada. § 2º A inobservância do disposto no parágrafo precedente implicará na exoneração ou dispensa do titular da chefia imediata, sem prejuízo do ressarcimento ao Tesouro Nacional dos valores por este despendidos em razão do ato comissivo ou omissivo, apurado em processo administrativo regular. Art. 2º Serão imediatamente exonerados ou dispensados os ocupantes de cargos em comissão ou de funções gratificadas constantes da relação a que alude o artigo precedente. Art. 3º No caso em que a União, autarquia ou fundação pública for citada em causa cujo objeto seja a indenização por interrupção, total ou parcial, da prestação dos serviços desenvolvidos pela Administração Pública Federal, em decorrência de movimento de paralisação, será obrigatória a denunciação à lide dos servidores que tiverem concorrido para o

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dano. Parágrafo único. Compete ao Advogado-Geral da União expedir as instruções necessárias ao cumprimento do disposto neste artigo. Art. 4º Este decreto entra em vigor na data de sua publicação. (Destaques acrescidos)

7. Verifica-se que o regulamento estabelece que as faltas decorrentes de participação de servidor público federal em movimento de paralisação dos serviços não poderão, em nenhuma hipótese, ser objeto de abono, compensação ou cômputo de tempo de serviço e de qualquer vantagem que o tenha por base (art. 1°). 8. No entanto, impende ressaltar que o Supremo Tribunal Federal ressalvou que não será toda ou qualquer situação que se veda a compensação, como disposto no Decreto n° 1.480/1995, conforme já apontado acima: (...) “A administração pública deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de acordo. O desconto será, contudo, incabível se ficar demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita do Poder Público”. (Recurso Extraordinário 693456-RJ)

9. De outro lado, vale registrar que a Advocacia-Geral da União, em razão da relevância da matéria e de risco de recalcitrância de órgãos da Administração Pública Federal em adotar o entendimento fixado pelo Supremo Tribunal para situações que envolvam greve no serviço público, emitiu o PARECER N. 004/2016/CGU/AGU, em 30/11/2016, fixando a orientação jurídica para a atuação dos órgãos públicos, o qual foi adotado pela Advogada-Geral da União, para os fins do art. 41 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, e aprovado pelo Presidente da República, tornando-se, portanto, vinculante para toda a Administração Pública Federal. 10.

Para o caso em exame, alguns pontos merecem destaque: 54. Ao admitir o desconto dos dias paralisados, a jurisprudência não está negando o exercício do direito do servidor público de realizar greve. Muito pelo contrário, no julgamento da referida repercussão geral, o próprio STF ratificou o seu entendimento no sentido de que a participação do servidor público em um movimento paredista não implica a prática de um ilícito. De acordo com a jurisprudência do STF, a mera participação em movimento grevista não é, por si só, justificativa para demissão do servidor, ainda que a participação seja por período superior a trinta dias , e nem motivo para gerar a imediata exoneração de servidor público em estágio probatório . 55. Contudo, e pelos fundamentos já apresentados, ainda que seja lícita a greve, e mesmo que o direito de greve seja exercido sem abusos, existem ônus e consequências jurídicas para aquele que adere à paralização. 56. Além disso, a situação jurídica de greve no serviço público impõe à Administração Pública deveres e medidas para resguardar o interesse público, até por se tratar o serviço público de atividade de importância fundamental para o Estado, sempre em benefício da sociedade. V.2. DEVER DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE REALIZAR O DESCONTO DOS DIAS DE PARALISAÇÃO 57. A greve é uma opção de risco por parte do trabalhador e a suspensão dos pagamentos constitui um risco inerente ao movimento paredista, nada impedindo, como será mais a frente demonstrado, que as consequências financeiras possam ser objeto de negociação no momento do término do movimento grevista. É curial perceber que o risco existente quanto à suspensão do pagamento pelos dias de greve é um instrumento necessário à ponderação de interesses em choque, a fim de se chegar ao fim da paralisação. O corte de ponto ou sua ameaça são inerentes à situação de greve, sob pena de se criar um desequilíbrio entre os interesses que estão em jogo em toda e qualquer greve . 58. A impossibilidade de corte de ponto, no caso de greve, ocorre apenas em situações muito excepcionais. A regra geral deve ser o corte de ponto porque, como visto, a relação de prestação de serviços estará suspensa (ainda que em hipótese de relação jurídica estatutária).

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59. Na análise do Recurso Extraordinário 693.456/RJ, o STF ratificou o entendimento anterior quanto as consequências da greve para o servidor público e, na questão do corte de ponto, foi ainda mais específico, enfatizando a existência de um dever da Administração Pública, a qual não pode simplesmente ficar inerte e passiva diante da conduta dos servidores que permanecem em greve. 60. A nenhuma autoridade da Administração Pública foi dada a autorização para permitir ou não alguém exercer seu direito de greve e de abonar previamente as faltas em razão da adesão ao movimento. Em outras palavras, se o corte dos dias paralisados é uma consequência jurídica do movimento grevista, essa medida se impõe como dever, e não como mera faculdade administrativa. Este dever, entretanto, pode ser cumprido com as formas mais convenientes para a continuidade administrativa, como desconto mensal na remuneração, compensação de horas de trabalho e assim por diante. 61. Contudo, por estarmos diante de um dever administrativo, o gestor público não pode, sem qualquer justificativa, e em razão da ausência de prestação de serviço pelo servidor público em decorrência de greve, deixar de cortar o seu ponto, abonando as faltas, ainda que não haja nesse caso, propriamente, falta injustificada ou por abandono do cargo. 62. Salvo determinação judicial em contrário, e em observância ao interesse público, o administrador público possui o dever de tomar as medidas necessárias para que não haja o pagamento ou a restituição dos dias eventualmente pagos para aquele servidor grevista. A omissão quanto a esse dever pode configurar falta grave do gestor porque, como registrado, não existe a faculdade para se abonar toda e qualquer falta. Com efeito, está o servidor público sujeito ao regime estatutário, legalmente positivado e que demanda qualquer alteração de seus fatores, inclusive o remuneratório, pela via legal, em observância ao princípio da legalidade. 63. Quanto ao modo como deve ser operacionalizado o corte de ponto, nos parece que não seria apropriado enfrentar essa questão na presente manifestação. Na medida em que os diferentes órgãos e entidades da Administração Pública Federal possuem mecanismos próprios para aferir falta e, portanto, a implementação do corte de ponto e apuração de eventuais valores que devem ser restituídos em razão da ausência do servidor são questões notadamente casuísticas. Além disso, não passa despercebido o fato de que em um movimento grevista pode ser, de fato, difícil verificar, com segurança, quem realmente estava ausente por vontade própria, até por serem comuns as tentativas de impedir a entrada de servidores em seu local de trabalho. 64. Mas nenhum desses fatores exime o gestor de tomar as medidas que estejam a seu alcance para cumprir seu dever, revelando apenas que deve haver algum grau de discricionariedade para que a Administração Pública, durante o movimento grevista, verifique, nas condições concretas e estruturais de cada órgão ou entidade, a forma e o momento do corte de ponto e de desconto dos dias não trabalhados.

11.

Por oportuno, trago as conclusões do referido parecer: "72. Estas são as razões pelas quais se assevera que a Administração Pública Federal deve observar, respeitar e dar efetivo cumprimento à decisão do Supremo,no julgamento do Recurso Extraordinário n. 778.889/PE, Relator Ministro Dias Toffoli. Em razão dessa decisão e dos fundamentos apresentados neste parecer,encaminhamos as seguintes conclusões: 1. A Administração Pública Federal deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre. 2. O desconto não deve ser feito se ficar demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita da Administração Pública Federal,conforme situação de abusividade reconhecida pelo Poder Judiciário. 3. O corte de ponto é um dever, e não uma faculdade, da Administração Pública Federal, que não pode simplesmente ficar inerte quando diante de situação de greve. 4. A Administração Pública Federal possui a faculdade de firmar acordo para, em vez de realizar o desconto, permitir a compensação das horas não trabalhadas pelos servidores."

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12. À luz do exposto acima e da legislação de regência, passa-se, portanto, à análise do documento apresentado pela entidade sindical que informa a deflagração de movimento grevista a partir de 10/11/2017 pelas razões lá expostas. Nesse sentido, diante da comunicação realizada à direção máxima da UFPR, cabe tão somente a esta Procuradoria Federal apontar para a necessidade de cumprimento do disposto no PARECER N. 004/2016 /CGU/AGU. Lembrando que o referido parecer foi aprovado pelo Presidente da República, e portanto, é vinculante para toda a Administração Pública Federal. Por fim, no que tange à tradicional discussão acerca dos limites da autonomia universitária, fixada 13. constitucionalmente no Artigo 207 da Constituição Federal (“as universidades gozam de autonomia didáticocientífica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial...”), resta evidente que a questão envolve matéria de âmbito nacional definida em caráter amplo para todo serviço público inexistindo margem para a adoção de tal princípio para afastar a repercussão geral definida pela Corte Constitucional ou mesmo o entendimento da AGU aprovado pela Presidência da República. 14. Pelo exposto, oriento à Administração da UFPR que em caso de ausência de servidores públicos em razão do exercício do direito de greve deve ser efetuado o corte do ponto, seja em razão da decisão do STF (Recurso Extraordinário 693456-RJ, com repercussão geral reconhecida), seja em razão do disposto no PARECER N. 004/2016/CGU/AGU também vinculante para toda Administração Pública Federal. Essa manifestação é exarada com lastro nos artigos 37 e 38 da Lei 13.327/2016, na Lei Complementar 15. 73/93 e nos artigos 131 e 133 da Constituição da República. Curitiba, 10 de novembro de 2017.

Tiago Alves da Mota Procurador Federal Procurador-Chefe da PF-UFPR

Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 23075213137201719 e da chave de acesso 7b651a9b

Documento assinado eletronicamente por TIAGO ALVES DA MOTA, de acordo com os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o código 88302989 no endereço eletrônico http://sapiens.agu.gov.br. Informações adicionais: Signatário (a): TIAGO ALVES DA MOTA. Data e Hora: 10-11-2017 16:17. Número de Série: 1301430773528419850. Emissor: AC CAIXA PF v2.

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