Cadernos de Estudos Leirienses – 9 * Setembro 2016

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LEIRIA SETEMBRO DE 2016

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Cadernos de Estudos Leirienses – 9 * Setembro 2016

Património industrial de Alcobaça e Nazaré nos séculos XVIII-XX Parte I Miguel Portela* António Valério Maduro**

Introdução Pretendemos com este trabalho de levantamento primário de fontes dar um contributo para a história da indústria dos concelhos de Alcobaça e Nazaré. O objetivo prioritário deste artigo e sequentes consiste apenas em elencar as atividades de natureza industrial e tecnológica que animavam o tecido socioeconómico da região estabelecendo naturalmente as relações consideradas convenientes. Ficam por apurar ou aprofundar inúmeras questões que se prendem com a representatividade destas indústrias ao nível da criação de riqueza, empregabilidade, rentabilidade e capacidade de exportação. Outras interrogações podem ser levantadas tais como os custos do trabalho com matéria-prima, mão-de-obra e energia, sabendo de antemão que muitas destas pressupostas indústrias filiam-se em paradigmas protoindustriais (a meio caminho entre a oficina e a fábrica) e que representavam, na maior parte dos casos, sociedades de tipo familiar. Indústria de Louça D. António da Costa de Sousa Macedo, na sua obra, Estatística do Distrito Administrativo de Leiria, editada em 1855, asseverou que no distrito de Leiria, e concretamente em Alcobaça, não existiam fábricas de louça nessa * Investigador ** ISMAI, CEDTUR/CETRAD, [email protected]

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época. Todavia, considerava a existência de quatro donos de olarias, onde trabalhavam quatro mestres e três aprendizes (MACEDO, 1855: 91; 338). Anos mais tarde, a Chrographia Moderna do Reino de Portugal, de 1876, refere que no concelho de Alcobaça existiam nesse ano apenas 4 olarias não mencionando qualquer fábrica de louça (BATISTA, OLIVEIRA, 1876: 10). São vários os indivíduos que surgem nos finais do século XIX, em Alcobaça, ligados ao ramo do fabrico de louça. A maior parte oriunda de Coimbra, como foi o caso de Dário Ramos, natural dessa cidade e que sendo empregado na fábrica de louça, contraiu matrimónio em Alcobaça, a 8 de setembro de 1884, com Maria da Ajuda (A.D.L., Livro de Casamentos de Alcobaça [1884-1888], Dep. IV-24-A-48, assento n.º 10, fl. 2v-3). De idêntico modo, a 16 de janeiro de 1886, casou em Alcobaça, José dos Reis dos Santos, com Joana Maria Cândida Alves Ferreira, “Elle de cincoenta e nove annos de idade, viuvo d’Anna Rainha Santa, falecida no Hospital de São José de Lisboa, fabricante de louça, e parochiano residente nesta villa: filho legitimo de Miguel dos Reis, e Anna da Conceição, natural da freguezia de Santa Cruz de Coimbra, donde seus paes tambem eram naturaes. Ella de cincoenta oito annos de idade, solteira, domestica, natural do lugar do Cazalito, freguezia de Penacova, diocese de Coimbra, filha legitima d’Antonio Ferreira, e Maria Antonia Alves, do mencionado lugar e freguezia, e parochiana residente nesta villa e freguezia d’Alcobaça”. Neste matrimónio “elles nubentes declararam, que tinham em sua companhia uma filha de maior idade havida antes deste seu matrimonio, por nome Rozalina Joanna Reis Gomes, e que neste acto a reconhecem por sua legitima // [fl. 18v] filha, a qual estando prezente declarou, que sempre se considerou filha dos mesmos nubentes, e como tal para o futuro assim seria considerada como filha legitima, e que assim assignava o presente assento, segundo o disposto no artigo cento e vinte seis do Codigo Civil em vigor. Foram testemunhas presentes, que conheço serem os proprios, Antonio José Junior, solteiro, proprietario residente n’esta freguezia, e Adelino de Moura, solteiro, fabricante de louça, tambem residente nesta mesma freguezia” (Ibidem, assento n.º 3, fl. 17v-18v). José dos Reis dos Santos surge em diversos registos paroquiais como testemunha, nomeadamente no registo de casamento de Emílio dos Reis, como assinou nesse ato, com Joaquina do Rosário, celebrado em Alcobaça a 2 de fevereiro de 1885 (Ibidem, assento n.º 2, fl. 6v-7), e no registo de casamento de António Alves Belo com Maria de Jesus, celebrado nessa freguesia a 2 de maio de 1885 (Ibidem, assento n.º 9, fl. 11v-12). Surge também, como padrinho, em 366

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29 de agosto de 1897, na celebração de batismo de Manuel, “filho legitimo de Bruno Augusto Ferreira, e de Maria José Jordão, oleiros, naturaes de Coimbra, recebidos, parochianos e moradores n’esta freguezia. Neto paterno de Francisco Ferreira Alves e de Maria Lucas Ferreira; materno de Joaquim Jozé dos Reis da Costa, e de Rosa Jordoa. Foi padrinho Jozé dos Reis da Costa e de Rosa Jordoa. Foi padrinho Jozé dos Reis dos Santos, cazado, duma fabrica de Louça, e madrinha sua filha Maria Candida Gomes da Silva, solteira, domestica, os quaes todos sei serem os proprios” (A.D.L., Livro de Batismos de Alcobaça [1897], Dep. IV-24-A-38, assento n.º 24, fl. 10v-11). A procura de matéria-prima pela Companhia de Faiança das Caldas da Rainha conduziu, no ano de 1885, à assinatura de dois contratos de exploração de barro no sítio da Confeteira (Vestiaria) pelo período de 5 anos. O primeiro contrato de arrendamento foi celebrado em 15 de janeiro de 1885, entre António Henriques Bixto, jornaleiro, morador na Vestiaria, e José Martins da Cunha Nery, proprietário, residente nas Caldas da Rainha como procurador do gerente da Fábrica de Faiança das Caldas da Rainha, Feliciano Bordalo Pinheiro (A.D.L., Livro Notarial de Alcobaça (L.N.A.), Dep. V-1-C-51, fl. 5354). António Henriques Bixto asseverou que era “senhor e possuidor d’uma gleba de terreno inculto no sítio da Confeteira da mesma freguezia, a confrontar de norte com João de Souza da Felippa, sul com Thereza de Jezus, nascente com serventia, e do poente com Gracinda Cesteira, foreira a mesma Junta da Parochia”, tendo procedido ao arrendamento desta gleba pelas seguintes condições: “Que este arrendamento é pelo tempo de cinco annos que terão seu principio hoje, e hãode findar no anno de mil oitocentos e noventa. Que o rendeiro pagara a renda annual de quatro mil e concoenta reis, metal sonante, pago adiantadamente, recebendo n’este acto a renda do primeiro anno na digo n’este acto o senhorio a renda do primeiro anno, devendo as outras rendas ser pagas em igual dia dos annos futuros. Que o rendeiro poderá proceder á exploração do barro e quaesquer outros mineraes que forem encontrados no terreno arrendado: Que elle senhorio tem a faculdade sempre que lhe aprouver de apascentar os seus gados no predio arrendado, bem como poderá roçar e aproveitar todo o matto que produzir o referido terreno não podendo todavia o senhorio com a tiragem e roça d’esses mattos a exploração do barro digo mattos impedir a exploração de barro e de quaesquer outros mineraes que convenha d’ali extrair” (Ibidem, fl. 53-54). O segundo contrato de arrendamento foi celebrado precisamente na mesma data, entre Policarpo Luís, jornaleiro, morador na Vestiaria, e o 367

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supracitado José Martins da Cunha Nery, proprietário, como procurador de Feliciano Bordalo Pinheiro (Ibidem, fl. 54-54v). De igual modo, Policarpo Luís, afiançou que era senhor “e possuidor d’uma gleba de terreno no baldio da Confeteira, a confrontar do norte com Thereza de Jezus, sul com Quinta do Cidral, nascente com caminho, e do poente com Antonio Pinheiro, foreiro á mesma Junta da Parochia”, tendo procedido ao arrendamento desta gleba pelas seguintes condições: “Que este arrendamento é pelo tempo de cinco annos que terão seu principio hoje e hãode findar em igual dia do anno de mil oitocentos e noventa. Que o rendeiro pagará // [fl. 54v] a renda annual de dose mil quatrocentos e oitenta reis, metal sonante, pago adiantadamente, recebendo n’este acto o senhorio a renda do primeiro anno, e devendo as outras rendas ser pagas em igual dia dos annos futuros. Que o rendeiro poderá proceder á exploração do barro e quaesquer outros mineraes que forem encontrados no terreno arrendado. Que elle senhorio tem a faculdade sempre que lhe aprouver de apascentar os seus gados no predio arrendado, bem como poderá roçar e apascentar o matto que produzir o referido terreno, não podendo todavia o senhorio com a tiragem e roça d’esses mattos impedir a exploração do barro e de quaesquer outros mineraes que convenha d’alli extrahir” (Ibidem, fl. 54-54v). Através do registo do óbito de José dos Reis dos Santos, o qual ocorreu a 17 de abril de 1898, achámos que este era gerente da fábrica de louça que estava instalada à Ponte de Santo Elias (A.D.L., Livro de Óbitos de Alcobaça [1898], Dep. IV-24-B-28, assento n.º 17, fl. 5v-6). Reconhecemos também, alguns indivíduos ligados ao fabrico de louça, especificamente no matrimónio de Celestino Duarte da Conceição, pintor de louça, natural de Coimbra, com Benedita da Conceição Helena, celebrado em Alcobaça em 15 de setembro de 1892, “Elle de vinte e um annos d’edade, solteiro, pintor de louça, natural e baptizado na freguezia de Santa Cruz de Coimbra, e residente desde creança nesta freguezia, filho legitimo de José Vieira da Conceição e Cunha, e Anna Maxima do Carmo e Cunha, naturaes de Coimbra, e parochianos residentes nesta freguezia. Ella de dezoito annos d’idade, solteira, domestica, natural e parochiana residente nesta freguezia; filha legitima de Manuel Morgado, e Maria Modesta do Sacramento, naturaes e residentes nesta freguezia” (A.D.L., Livro de Casamentos de Alcobaça [1892], Dep. IV-24-A-52, assento n.º 11, fl. 8-8v). A 5 de setembro de 1898 foi registado o batismo de Carlos, que “nasceu n’esta freguezia pelas seis horas da tarde do dia trinta e um d’agosto proximo passado; filho legitimo de José Emygdio 368

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Tavares, oleiro, natural de Coja, diocese de Coimbra, e de Maria Rosa da Silva, domestica, natural d’esta villa; foram recebidos na Egreja Parochial do Juncal, e são parochianos e moradores n’esta villa d’Alcobaça. Neto paterno de Antonio Tavares, e Anna Delfina, materno de Antonio da Silva, e Feliciana da Nazareth. Foi padrinho João Pinheiro, casado, pintor de louça, e madrinha Maria da Gloria, casada, domestica” (A.D.L., Livro de Batismos de Alcobaça [1898], Dep. IV-24-A-39, assento n.º 41, fl. 17-17v). Anos mais tarde, em 1901, Joaquim Pedro, solicitou licença para instalar uma fábrica de louça na Avenida João de Deus, em Alcobaça, tendo obtido licença para esse fim em 1902, afirmando-se no auto de autorização: “Diz Francisco Leal Valente, casado, empregado de escriptorio, morador na Avenida João de Deus, n’esta villa, que Joaquim Pedro, casado, fabricante de louça de barro ordinario, tambem residente n’esta dita villa, foi auctorizado a construir proximo da habitação do supplicnate um forno para cozer a louça de seu fabrico (…) que se lhe passasse o neccessario alvará de licença com a clausula de que: a licença para a laboração lhe seria retirada quando a chaminé do forno não tivesse um metro acima do cume dos telhados mais altos das casas situadas na area de quarenta metros de diâmetro, devendo o forno ser afastado da casa da habitação mais quatro metros e as suas paredes terem pelo menos a espessura de oitenta centimetros” (A.D.L., Autos de Concessão para licenças industriais, Governo Civil de Leiria, Atividades Económicas (A.C.L.I., G.V.L.), A.E. 1899-1901, Dep. III-79-C-4 - Autos de informação do requerente Joaquim Pedro - 1902). De igual modo, verificámos que Manuel Ferreira da Silva da Bernarda Júnior procedeu em 3 de março de 1904 ao pedido de licença para laboração de uma fábrica de louça, ficando arrolado no processo de licenciamento que: “Manoel Ferreira da Bernarda Junior, casado, pedreiro, morador n’esta villa, tomou de arrendamento a José Pereira da Silva Rino, casado, proprietario, tambem d’esta villa, uma antiga fabrica de louça de barro, ordinario, que este anteriormente e há muitos annos trazia arrendada a José dos Reis dos Santos, d’Alcobaça, fabrica situada á beira da estrada Real d’Alcobaça a Nazareth, á Ponte de D. Elias, limite d’esta villa” (A.D.L., A.C.L.I., G.V.L., A.E. 19021912, Dep. III-79-D-1 – Processo de Manuel Ferreira da Bernarda Júnior 1905), Requerimento datado de 3 de março de 1905).

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Quadro 1: Referências a indivíduos ligados à indústria da louça em Alcobaça Data 30.04.1901

Nome Joaquim Pedro

03.03.1905

Manuel Ferreira da Bernarda Júnior

Local Avenida João de Deus, Alcobaça Ponte de D. Elias

Referência documental A.D.L., A.C.L.I., G.V.L., A.E. 1899-1901, Dep. III-79-C-4 Processo de Joaquim Pedro, oleiro - 1901. A.D.L., A.C.L.I., G.V.L., A.E. 1902-1912, Dep. III-79-D-1 Processo de Manuel Ferreira da Bernarda Júnior - 1905.

A 6 de abril de 1927 foi constituída uma sociedade, denominada “Maria de Alcobaça Limitada”, com sede e fábrica em Alcobaça, que tinha por objecto a “exploração da industria de fabrico de louças de barro vidradas e faianças artísticas e de qualquer outra em que se acorde” (A.D.L., L.N.A., Dep. V-6-D57, fl. 5v-8v). Foram sócios fundadores, António Vieira Natividade, casado, industrial, o Doutor Joaquim Vieira Natividade, casado, engenheiro agrónomo e Silvino Ferreira da Bernarda, casado, industrial, todos moradores em Alcobaça. O valor do capital social foi constituído por 75.000$00, dividido por três quotas a dinheiro, nomeadamente duas de 22.500$00 a cada um dos membros da família Natividade e outra de 30.000$00 do sócio Silvino Ferreira da Bernarda. Em 6 de abril de 1927, os sócios António Vieira Natividade e Silvino da Bernarda, procederam por escritura pública, à compra de um terreno, propriedade do casal José d’Oliveira Conceição e Maria da Assunção Rodrigues Aurélio, moradores em Alcobaça, pelo valor de 15.000$00 (Ibidem, fl. 8v10v). Tratava-se de um “terreno de semeadura com casa e um barracão de pedra e cal, denominado Borda do Rio, junto á Ponte Grande, no limite da freguezia de Alcobaça, a confrontar do norte com João Duarte Peão, do sul com a Ponte Grande, do nascente com estrada nacional e do poente com rio”. Assevera-se nesta escritura que este prédio localizava-se onde outrora tinha existido uma fábrica de destilação. Indústria do Papel A riqueza do subsolo aliada ao aproveitamento das águas do rio da Abadia foi fator primordial para que se tenham desenvolvido na Fervença algumas indústrias de importância manifesta para a região e para o país, sobretudo a partir de 1537 com o aforamento a Manuel de Goes das águas dos moinhos da Abadia para instalação de engenhos do papel com o foro de duas resmas de papel. Todavia, reconhecemos que o mosteiro de Alcobaça, em 1552, arrematara os ditos engenhos com seu logradouro para neles se instalar um lagar de azeite, revelador de que a produção de papel havia sido aban370

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donada nesse local (A.N.T.T, Livro de Privilégios, Jurisdições, Sentenças, Igrejas deste Real Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça, Ordem de Cister, Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça, Liv. 92, fl. 44v). Esta indústria papeleira viria a ser retomada em Alcobaça no século XIX, conforme podemos constatar no mapa do estado das fábricas desse concelho, datado de 14 de novembro de 1843, onde se arrola que a fábrica havia sido estabelecida em julho de 1842, laborando entre os anos de 1842 e 1850. Nesse período, o seu proprietário exercia também as funções de mestre papeleiro onde era auxiliado por homens, mulheres e rapazes (PORTELA, 2014: 181-200). Alcobaça veio a ser um importante centro de fabrico de papel na região da alta-estremadura, chegando a existir simultaneamente duas fábricas do papel no início do século XX. Através de uma escritura lavrada na vila da Pederneira, em 11 de janeiro de 1853, verificamos a realização de uma sociedade entre Manuel dos Santos Libório e Francisco Xavier Pedroso, ambos de Alcobaça: “possuião cada um establecimento de fabrica de papel – e que achando-se agóra convencionados em continuarem no mesmo fabrico de papel debaixo de sociedade d’ambos, cuja sociedade por esta escriptura fica d’esde já constituida – e por tempo ilimitado – tinhão accordado que a mesma sociedade ficasse basiada nos prencipios – condições – e obrigações seguintes – Que o primeiro socio Liborio entra com o fundo de quatrocentos cincoenta e seis mil oitocentos e noventa reis – E o segundo socio Pedroso entra com o seu fundo de quatrocentos cetenta mil novecentos e settenta reis - Que estes fundos consta são de duas relações recipro corrente assignadas por ambos, e em seu poder existente a que lhe corresponder = Que os lucros e prejuisos da sociedade serão devedidos em partes igoais = Que annoalmente utilisarão da sociedade trinta e oito mil e quatrocentos reis, para saptisfação da venda do predio aonde se acha colocado o establecimento do segundo socio Pedroso = Que quando se entenda, e resolverem incorporem ambos os estabelecimentos n’um só, isto é o segundo socio, no primeiro socio Liborio - será o segundo sócio+ (que sahia da sociedade) digo socio+ Pedroso – indemnenizado (tirado da sociedade) quantia de vinte e oito mil e oitocentos reis e bem assim cinco por cento ao anno, correspondentes aos fundos com que entrou” (A.D.L., Livro Notarial de Nazaré, Dep. V-86-B-23, fl. 3v-4v). Alguns meses depois, a 29 de junho de 1853, Manuel dos Santos Libório adquiriu a parte da sociedade das fábricas de papel estabelecidas em 371

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Alcobaça, detida por Francisco Pedroso pela quantia de 350 000 réis. Francisco Pedroso devido ao que havia “sufrido em seus interesses na sociedade que tem com o dito Manoel dos Santos Liborio nas fabricas de papel estabelecidas nesta villa” e “continuando o máo estado da sua saúde, não pode desempenhar os deveres a que está ligado, por isso tinha resolvido vender como com effeito vendido tinha ao dito Manoel dos Santos Liborio os engenhos e suas pertenças que tem estabelecido em caza dos herdeiros de Francisco // [fl. 46v] de Francisco Pereira da Trindade nesta Villa, bem como o resto dos materiais que ainda conserva hinerentes á mesma fabrica por trezentos e cincoenta mil reis”. Todavia, ficou arrolado nessa escritura que Manuel dos Santos Libório aceitou que Francisco Pedroso continuasse a administrar e a «dirigir os trabalhos daquelles estabelecimentos o conservaria nessa administração, ou direcção pelo que lhe pagaria quatrocentos reis por dia, menos naquelles dias que deixou de cumprir seus deveres” (A.D.L., L.N.A., Dep. V-1-C-16, fl. 46-46v). A segunda metade do século XIX, foi marcada por uma nova geração de fabricantes de papel em Alcobaça. Um genovês de nome José Lázaro Gambino, mestre papeleiro, surgiu na época como fundador de uma importante fábrica de papel. De entre as inúmeras referências registadas nos livros paroquiais da freguesia de Alcobaça, que aludem ao fabrico de papel, assinalamos o registo de batismo de Florência, celebrado a 13 de março de 1864, onde foi padrinho, Francisco Henriques do Rosário, oficial do papel na fábrica de Alcobaça (A.D.L., Livro de Batismos de Alcobaça [1864], Dep. IV-24-A-20, assento n.º 3, fl. 7-7v); o registo de óbito de Eleutério, filho de Joaquim Luís dos Santos, papeleiro e de Ana da Conceição, moradores em Alcobaça, que ocorreu a 27 de março de 1874 (A.D.L., Livro de Batismos de Alcobaça [18731877], Dep. IV-24-A-25, assento n.º 7, fl. 29v-30); e o registo de batismo de Francisco, celebrado a 25 de setembro de 1876, filho de João Batista Gambino, papeleiro e de Maria do Nascimento Jordão, onde foi padrinho Pelegrino Gambino, casado, de profissão papeleiro, tio paterno do batizado (Ibidem, assento n.º 28, fl. 43v-44; PORTELA, 2014: 181-200; PORTELA, 2015: 16-17). Através do Diccionário Biographico Chorographico e Histórico do Districto de Leiria e Concelho de Villa Nova D’Ourém, editado em 1907 por Tito LARCHER, no campo relativo ao fabrico do papel, reconhecemos a importância desta indústria em Alcobaça: “Em 1861, era o capital empregado no estabelecimento de 250$000 réis, e pagava de foro anual 8 moios meados de trigo e milho pelo terreno em que estava a fábrica, que compreendia ainda, 2 372

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moinhos com 6 pedras. Pelo arrendamento da fábrica pagava anualmente 60$000 réis. A matéria-prima era o trapo de todas as cores, que consumia anualmente 18:238 quilogramas, que era todo comprado aos trapeiros à porta da fábrica a 22 réis o quilo.” A produção anual era de 100 resmas de papel manteigueiro e 2:000 resmas de papel pardo, que se destinava a Lisboa e Porto, sendo o preço carreto por quilo de 120 réis para Lisboa, e 240 para o Porto. O pessoal constava de 1 mestre que ganhava 480 réis, 4 homens a 160, 5 mulheres a 100 e uma rapariga a 60 réis diários. O motor era a água, que tinha com abundância. O sistema de fabrico era o seguinte: “O trapo sem escolha prévia ia ao peneiro, depois a uma tina de cilindro móvel para lavar. A lavagem er em água sem adicionamento de outra matéria. Em seguida ia para a tina de depósito, desta passava para as formas aonde se esmagava e daí para o pisão. Depois obrava-se e prensava-se em uma prensa de trancas de pau e parafusos ordinários. Depois fabricaram também papel almasso, mortalha e foguete” (LARCHER, 1907:105). De facto, numa escritura datada de 10 de agosto de 1865, João da Silva Ferreira Rino, proprietário da Quinta da Gafa, deu de arrendamento a José Lázaro Gambino “as duas propriedades seguintes – Conjunto à levada nesta villa, aonde está a maquina de destilação (que pertencia ao Mosteiro), e outra casa contigua aos moinhos que possue na rua de Santo Antonio, d’esta mesma villa” pelo tempo de dez anos, e “pelo preço, o primeiro prédio, de cem mil reis, e o segundo, cincoenta mil reis annoaes”. Todavia, ficou referenciado nessa escritura que “elle rendeiro não poderá dar às ditas propriedades outra appelicação que não seja para o uso de fabricas de papel” (PORTELA, 2015: 16-17). Em 6 de outubro de 1883, José Lázaro Gambino trespassou a fábrica de papel para o seu filho António Gambino, “com todo o papel, trapo, e utensílios, que nélle e nos respectivos armazéns e cazas d’arrecadação actualmente existem. Que faz este trespasse pela quantia de dois contos cento e quarenta e cinco mil cento e noventa reis, sendo um conto seiscentos e quarenta e cinco mil centro e noventa reis, importancia do papel e trapos, e quinhentos mil reis valor dos utensílios”. Este trespasse obrigava ainda que António Gambino desse sociedade a Francisco Gambino logo que este atingisse a maioridade (PORTELA, 2015: 16-17). Anos mais tarde, em 19 de setembro de 1898, faleceu o mestre papeleiro José Lázaro Gambino. Todavia, um ano antes do decesso desse mestre 373

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papeleiro, Francisco Gambino, solteiro e proprietário havia requerido, em 30 de novembro de 1897, ao administrador do concelho de Alcobaça licença para instalar uma fábrica de papel de embrulho nessa vila (PORTELA, 2015: 16-17). Sabemos que Francisco Gambino realizou, em 7 de novembro de 1901, a venda dos bens móveis pertencentes à fábrica de papel, a Júlio Costa Santos, pelo valor total de um milhão e cem mil réis. Os bens móveis foram arrolados nessa escritura da seguinte maneira: “uma roda eixo e chumaceira em setenta mil reis; entroses e carretos em cincoenta mil reis; cylindro e platina em cincoenta mil reis; formas tres paus em trinta mil reis; tina e tanque em trinta mil reis; prensa de ferro em cento e vinte mil reis; postes (dois) em cento e sessenta mil reis; penedouros e fintesas (?) em cinco mil reis; maço em trinta mil reis; prensa de encluso dez mil reis; caldeira de cobre, prensa e caixa em sessenta mil reis; enxugo, mesas, alavanca e pedra em te; digo em oitenta mil reis; balança e pesos em cinco mil reis; papel fabricado em tresentos e cincoenta mil reis; trapo em cincoenta mil reis” (A.D.L., L.N.A., Dep. V-4-C40, fl. 15-16). No início do século XX, o fabrico de papel é abandonado. Reconhecemos através de uma escritura celebrada em 9 de junho de 1904, que Francisco Xavier Figueiredo de Oriol Pena deu de arrendamento a Joaquim Serrano de Figueiredo, por um período de 9 anos e com uma renda de 132 000 réis por ano, o prédio junto à levada que serviu de fábrica de papel, prédio esse que havia recebido por herança do seu sogro João da Silva Ferreira Rino (A.D.L., L.N.A., Dep. V-6-B-5, fl. 19v-21). Em 14 de julho de 1911, D. Maria da Nazaré Pena Rino Oriol, esposa de Francisco Xavier de Figueiredo Oriol Pena, realizou por escritura pública a doação de certos bens a D. Maria Joana Rino Froes, solteira, moradora em Alcobaça. Esses bens eram constituídos por: “Dois moinhos contíguos movidos a agua, com quintal e serventia da levada, denominados, Moinhos da Praça, e antiga fábrica de papel, hoje também moinhos, sitos na rua desasseis de outubro em esta villa, e que confrontam do norte com rio e Silvino Villa Nova, sul com Silvino de Carvalho e outros, nascente com rio e de poente com a dita rua desasseis de outubro” (A.D.L., L.N.A., Dep. V-6-B-53, fls. 37v38v). Meses depois, em 5 de dezembro de 1911, foi lavrada escritura de convenção antenupcial entre D. Maria Joana Rino Froes, solteira, moradora em Alcobaça e José Paulino Marecos Mourinho d’Albuquerque, alferes de cavalaria, morador em Vila Viçosa (A.D.L., L.N.A., Dep. V-6-B-56, fls. 37v39). Nesse contrato antenupcial, D. Maria Joana Rino Froes, “noiva, se dota 374

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com os bens que actualmente já possue e que são: vinte acções da Companhia de Fiação e Tecidos d’Alcobaça, do valor de cem mil réis cada uma” acrescidos de “uma propriedade que se compõem de dois moinhos contíguos movidos a agua, com quintal e serventia de levada, denominados “Moinhos da Praça”, e antiga fabrica de papel, hoje tambem // [fl. 38v] moinhos, sita rua desasseis de outubro, em esta villa de Alcobaça” (Ibidem, fls. 37v-38v). Segundo Larcher, Manuel dos Santos Silvestre e Joaquim Silvério Raposo estabeleceram uma fábrica de papel na casa do Engenho, junto ao Obelisco (onde laborava a antiga serração hidráulica do mosteiro), mas posteriormente deslocalizaram a indústria “para defronte da face norte do mosteiro, onde atualmente há um moinho”, desconhecendo-se a data da fundação e o período de funcionamento desta fábrica (LARCHER, 1907:105). Indústria Naval A indústria naval teve em S. Martinho do Porto uma importância manifesta, onde os estaleiros de construção de navios eram reconhecidos no Reino de Portugal. No início do século XVII, vários mestres de construção de navios residiam nessa localidade, sobretudo, Vicente Fernandes, “mestre de fazer navios”, conforme referido em alguns registos paroquiais, especialmente, “Aos 5 de fevereiro de 1606 baptizei a Manoel filho de Thome Farto e de sua molher Juliana Baptista forão padrinhos Vicente Fernandes mestre de navios e Domingas filha de João Rodriguez. E por verdade asignei. (a) Simão do Valle” (A.D.L., Livro Misto de Batismos, Casamentos e Óbitos de S. Martinho do Porto (L.M.B.C.O.S.M.P.) [1579-1620], Dep. IV-25-E-31, assento n.º 1, fl. 36v), e “Aos 10 de janeiro de 1608 baptizei a Maria filha de Antonio d’Almeida e de Simoa Antunes sua molher forão padrinhos Amador Vicente e Silvana da Ribeira de Peniche e Domingas Pirez molher de Viçente Fernandes mestre de fazer navios. E por verdade assignei. (a) Simão do Valle” (Ibidem, assento n.º 4, fl. 37). De idêntico modo, surge arrolado nesses registos paroquiais, Diogo Fernandes, carpinteiro de navios, nomeadamente “Aos 18 de abril de 1609 baptizei a João filho de Mathias Vicente e de Lianor Vicente sua molher forão padrinhos Diogo Fernandez carpinteiro de navios e Maria filha de Antão Andre. E por verdade assignei. (a) Simão do Valle” (Ibidem, assento n.º 7, fl. 37v). Assume especial destaque a relação entre estes mestres e os pilotos de navios, conforme podemos asseverar no registo de batismo de Maria, filha do 375

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mestre Vicente Fernandes e de sua mulher Domingas Pires, onde foi padrinho da batizada, Diogo Gonçalves, piloto, natural da cidade de Lisboa: “Aos 30 de julho de 1606 baptizei a Maria filha de Vicente Fernandez e de sua molher Domingas Pirez forão padrinhos Diogo Gonçalves piloto natural da cidade de Lixboa e Vitoria Fernandes molher de Antonio Mendiz moleiro da Çella Velha. E por verdade assignei. (a) Simão do Valle” (Ibidem, assento n.º 3, fl. 36v). De igual modo, podemos observar no registo de batismo de Maria, filha de Tomé Farto e de sua mulher Juliana Batista, a referência como padrinho de Miguel Fernandes, piloto da carreira do Brasil, morador em Salir do Porto (Ibidem, assento n.º 5, fl. 39). As escrituras notariais da Nazaré revelam, a partir da década de 90 do século XIX, um grande incremento na constituição de parcerias e sociedades de pesca. Nas escrituras de fundação são assinaladas as artes de pesca a que se dedicam (tendo como principal objetivo a captura da sardinha e do carapau); o capital da sociedade (em numerário, aparelhos, redes e embarcações) que especifica o quinhão dos parceiros e que permite saber o seu número ou a presença de sócios capitalistas que se destacam dos pescadores; o tipo e número das embarcações e sistemas fixos e volantes que mobilizam (armações redondas e valencianas, cercos americanos, dando informações preciosas para a sua difusão e representatividade) e a duração do contrato (embora no caso das sociedades e parcerias de maior significado este apareça como ilimitado)1. No início do século XIX e no editorial do periódico, A Nazareth, na sua edição n.º 252, de 25 de janeiro de 1909, pode ler-se: “A Nazareth é hoje um dos pontos da costa de Portugal onde a pesca é mais intensa, empregando os apparelhos aperfeiçoados, fixos e volantes, como sejam as armações 1

Sabemos assim que a Parceria União do Pescal, constituída em 1891, se dedicava à pesca por meio de armações fixas, assim como a Parceria União de Pesca (1892) e a Parceria Fraternidade (1893). Noutras parcerias e sociedades descrimina-se a tipologia das armações de pesca, como as armações redondas (Sociedade das Armações Redondas, 1900), armações fixas com copo à valenciana (Sociedade Carvalho & Silvério, 1901), cercos americanos para a pesca da sardinha, como a sociedade Raposo & Breyner (1901) ou o Cerco do Alto Mar (1904), que também se dedicava à arte xávega (redes de arrastar para terra), assim como, em 1907 com o Cerco dos Pescadores da Nazaré e o Cerco Esperança, em 1908 com o Cerco Vitória, e o Cerco Igualdade, e em 1909 com o Cerco Naval, o Cerco Praiense e o Cerco Liberdade. Refira-se ainda a prática da pesca à linha com o auxílio de navios a vapor foi incrementada pela Parceria Aliança de Pesca (1903), trata-se de vapores utilizados para as redes de arrasto (Adolfo Loureiro fala-nos de um vapor de 75 toneladas, LOUREIRO, 1904: 275).

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Praia da Nazaré: barcos saindo do mar

valencianas e os cercos americanos. De forma que se a sardinha, o precioso e estimado peixe, se approxima da costa cae nos apparelhos fixos, e se passa mais ao largo é apanhada pelos apparelhos volantes – que hoje na maioria são propriedade de cooperativas de pescadores dando em resultado serem os lucros da pesca divididos por centenas de famílias”. Este ímpeto associativo terá sido, naturalmente, acompanhado pelo desenvolvimento dos estaleiros de construção naval. Resultante deste contexto alçámos um contrato, celebrado na Praia da Nazaré, em 28 de março de 1914, para a construção de uma traineira, contrato esse estabelecido entre José Maria Vitorino da Rosa, calafate da Praia da Nazaré, e António dos Santos, de Peniche. Passamos, em seguida, a transcrever o contrato mencionado: “Que pela presente escritura se obriga a construir para o segundo outorgante, António dos Santos, uma embarcação traineira, systema hespanhol, nas seguintes condições: Primeira – Que a referida embarcação terá as seguintes dimensões: de quilha, onze metros e sessenta centimetros; de boca, dois metros e oitenta centimetros e de pontal, um metro e treze centimetros; segunda - que se obriga a subministrar os materiaes necessarios, todos de boa qualidade, sendo as madeiras a aplicar das seguintes especies: para a quilha, madeira de sobreiro; para o cavername e braços, madeira de pinheiro manço e taboado, inteiriças, de pinheiro bravo, fornecendo tambem dois mastros e duas vergas desta especie de madeira; terceira – que esta embarcação será entregue em 377

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branco, isto é, sem pintura mas calafetada; quarta – que se obriga a ter esta embarcação construida, nas condições expostas, em trinta e um de Agosto do corrente ano, sob pena de lhe ser diminuida em cinquenta escudos a ultima prestação que houver de receber e que como abaixo será estipulado haode ser de cento e setenta escudos e se porventura a construção ainda não estiver construida em quinze do mês de Setembro seguinte e proximo, perder o restante desta prestação; quin- // [fl. 14v] ta - que a embarcação será construida nesta Praia da Nazaré. Pelo segundo outorgante foi dito: Que pela sua parte se obriga a pagar ao primeiro outorgante, nesta localidade, a quantia de duzentos e setenta escudos, preço desta empreitada, em três prestações; sendo, a primeira de cinquenta escudos e paga nesta data; a segunda, tambem de cinquenta escudos, que será paga quando a embarcação estiver encavernada e a terceira que é de cento e setenta escudos que será paga na entrega, salvo as penalidades estipuladas se a ellas der causa” (A.D.L., L.N.N., Dep. V-86-E-4, fls.13v-15). Temos também notícia, através de uma escritura lavrada em Alcobaça, em 2 de setembro de 1918, da aquisição de quatro glebas de terreno em S. Martinho do Porto – duas pertencentes a António Agostinho da Silva e esposa e duas a António Henriques Primo e esposa –, pela “Sociedade Construtora de Navios, Lda” da Figueira da Foz, com o eventual propósito de alargar a atividade nessa zona portuária (A.D.L., L.N.A., Dep. V-15-A-4, fls.44-47). Indústria de fabrico de pólvora e fogo-de-artifício Uma das primeiras referências a fábricas de fabrico de fogo-de-artifício em Alcobaça surge na obra Chrographia Moderna do Reino de Portugal, publicada em 1876, onde se refere, nesse ano, a existência de uma oficina de fogo-de-artifício (BATISTA, OLIVEIRA: 1876, 10). Já nos finais do século XIX, em 16 de janeiro de 1899, foi entregue na administração do concelho de Alcobaça por José Maria Furtado dos Santos, casado, negociante e residente nessa vila, um requerimento tendo em vista a obtenção de licença para poder vender pólvora do estado a miúdo no seu estabelecimento situado na Praça D. Afonso Henriques, o qual confrontava a norte com a Tipografia Oliveira, a sul com a dita praça, a nascente com José Coelho da Silva e a poente com a Rua de Santo António (A.D.L., A.C.L.I., G.V.L., A.E. 1899-1901, Dep. III-79-C-4 – Processo de José Maria Furtado dos Santos – 1899). Após ter sido publicitado o edital no periódico, Semana 378

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Alcobacense, edição n.º 448, de 29 de janeiro de 1899, p. 4, de acordo com a legislação em vigor à época obteve o alvará de licença a 8 de março desse dito ano. Quadro 2: Referências a indivíduos ligados à indústria da pólvora e fogo-de-artifício em Alcobaça Data 16.01.1899

Nome José Maria Furtado dos Santos

Local Alcobaça

Referência documental A.D.L., A.C.L.I., G.V.L., A.E. 1899-1901, Dep. III-79-C-4 Processo de José Maria Furtado dos Santos -1899.

Reconhecemos também que, em 19 de dezembro de 1898, foi entregue na administração do concelho da Pederneira, um requerimento apresentado por António de Sousa Romão, residente na Nazaré, onde solicitava licença para depósito de fogo-de-artifício, pólvora e foguetes, no Caxim a sul da Praia da Nazaré. Nessa data o administrador do concelho da Pederneira, Arnaldo da Costa Figueiroa, ordenou aos oficiais de diligências que intimassem o requerente da seguinte forma: “Antonio de Souza Romão, d’esta villa, que pretende licença para deposito de fogo de artificio e pólvora situado no Caxim ao sul da Praia da Nazareth, para que no prazo de dez dias faça publicar no periódico d’esta villa, o annuncio”, ou seja o edital (A.D.L., A.C.L.I., G.V.L., A.E. 1890-1898, Dep. III-79-C-3 – Processo de António de Sousa Romão 1898). Depois do edital ter sido publicitado no periódico local, cumprindo assim os trâmites legais necessários foi passado o alvará de licença em 28 de janeiro de 1899. A 26 de novembro de 1899, foi entregue na administração do concelho da Pederneira, um requerimento apresentado por José dos Santos Confeteiro, residente na Praia da Nazaré, onde solicitava licença para depósito de fogosde-artifício e pólvora fora da povoação onde morava. Este, dava conta na memória descritiva que apresentara com o respetivo requerimento que: “A casa em que vae estabelecer o deposito, é a de officina de lavoura da propriedade rustica, sita em sub-villa, limite d’esta Praia, pertencente ao Senhor Sebastião Alves, 1.º cabo da guarda fiscal, casa que confronta redondamente com a terra que esta situada e muito distante d’habitações e da estrada real n. 60" (A.D.L., A.C.L.I., G.V.L., A.E. 1899-1901, Dep. III-79-C-4 – Processo de José dos Santos Confeteiro - 1899). Asseveramos que depois de ter sido publicitado o edital no periódico, Correio da Nazareth, edição n.º 50, de 17 de dezembro de 1899, p. 3, e cumprindo os trâmites legais necessários foi passado o alvará de licença em 30 de junho de 1900. 379

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Asseveramos que, em 11 de abril de 1888, José dos Santos Confeteiro, natural do Desterro, freguesia de S. Pedro de Porto de Mós, e morador na cidade de Leiria, contraiu matrimónio na igreja de S. João Batista em Porto de Mós com Maria da Piedade, natural e moradora na Carreirinha dessa freguesia de S. Pedro de Porto de Mós, filha de Manuel da Silva e de Joana da Piedade (A.D.L., Livro de Casamentos de Porto de Mós, Dep. IV-44-C-63 [S. João Batista], assento n.º 4, fl. 3v). Quadro 3: Referências a indivíduos ligados à indústria da pólvora e fogo-de-artifício na Pederneira Data 19.12.1898 26.11.1899

Nome António de Sousa Romão José dos Santos Confeteiro

Local Caxim, Praia da Nazaré, Pederneira Praia da Nazaré, Pederneira

Referência documental A.D.L., A.C.L.I., G.V.L., A.E. 1890-1898, Dep. III-79-C-3 Processo de António de Sousa Romão - 1898). A.D.L., A.C.L.I., G.V.L., A.E. 1899-1901, Dep. III-79-C-4 Processo de José dos Santos Confeteiro - 1899).

Indústria de saboaria Em 2 de junho de 1879 foi lavrada em escritura pública uma sociedade entre Dona Teodora Amélia Augusta Froes, – moradora em Lisboa, autorizada por seu marido Francisco Pereira da Trindade, morador em Fanhais, Pederneira –, o doutor Álvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, advogado e João Nepomuceno de Brito, de Vila Real e ambos moradores em Alcobaça, com vista à instalação de uma fábrica de sabão justamente em Alcobaça (A.D.L., L.N.A., Dep. V-4-B-17, fls. 46v-47). Nessa escritura ficou estipulado pelos sócios da sociedade: “1.º Que a primeira socia, auctorizada por seu marido, e o segundo socio se obrigam a adiantar duzentos mil reis em moeda legal cada um, prefazendo estas quantias a de quatrocentos mil reis, que será empregada em utensilios e em materia prima para a dita fabrica de sabão; e este capital não poderá ser retirado se não por comum < accordo > de todos os associados, ou por se dissolver a sociedade; porem esta dissolução só terá lugar por aqulle comum accordo, ou vereficando-se que os lucros são inferiores a vinte por cento ao mez (…) 3.º Que a cargo do terceiro socio fica a administração e fabrico de todo o sabão, que se possa fazer e exportar não só com os géneros adquiridos pelo emprego do sobredito capital, mas tambem d’outro qualquer capital mais avul-

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tado que se for grangeando; e ao mesmo terceiro socio pertencerá admittir e despedir os operários” (Ibidem, 46v). Reconhecemos através dessa aludida escritura a importância desse negócio tendo ficado expresso e salvaguardada a interdição dos sócios em estabelecerem fábricas de sabão à distância de 8 léguas, nomeadamente, “Nenhum dos socios poderá na redondeza de oito legoas d’esta villa estabelecer fabrica alguma de sabão ou sabonetes, nem associar-se a outrem para taes fins, sob pena de perder parte que n’esta nova fabrica lhe pertencem, em proveito dos outros socios que o não acompanharem”. Por último, e no que respeita às instalações e localização da fábrica, arrolou-se, “Que a fabrica será provizoriamente n’uma caza e quintal d’Anna Ferreira, viuva, na Rua de Frei Fortunato em esta villa, á qual se fará titulo d’arrendamento em nome dos tres associados, e n’esta mesma caza se collocará o escriptorio da fabrica” (Ibidem, 47). Fontes e Bibliografia Fontes Arquivo Nacional Torre do Tombo – Livro de Privilégios, Jurisdições, Sentenças, Igrejas deste Real Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça, Ordem de Cister, Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça, Liv. 92 Arquivo Distrital de Leiria – Autos de Concessão para licenças industriais. Governo Civil de Leiria – Atividades Económicas 1890-1898, Dep. III-79-C-3; Atividades Económicas 1899-1901, Dep. III-79-C-4; Atividades Económicas 1902-1912, Dep. III-79-D-1 – Livro de Batismos de Alcobaça [1864], Dep. IV-24-A-20; [1873-1877], Dep. IV-24-A-25; [1897], Dep. IV-24-A-38; [1898], Dep. IV-24-A-39 – Livro de Casamentos de Alcobaça [1884-1888], Dep. IV-24-A-48; [1892], Dep. IV-24-A-52 – Livro de Óbitos de Alcobaça [1898], Dep. IV-24-B-28 – Livro de Casamentos de Porto de Mós [S. João Batista], Dep. IV-44-C-63 – Livro Misto de Batismos, Casamentos e Óbitos de S. Martinho do Porto [1579-1620], Dep. IV-25-E-31

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– Livro Notarial de Alcobaça Dep. V-1-C-16; Dep. V-1-C-51, Dep. V-4-B-17, Dep. V-4-C-40, Dep. V-6-B-5, Dep. V-6-B-53, Dep. V-6-B-56; Dep. V-6-D-57, Dep. V-15-A-4 – Livro Notarial de Nazaré Dep. V-86-B-23; Dep. V-86-E-4; Dep. V-1-C-16 – Correio da Nazareth, edição n.º 50, de 17 de dezembro de 1899 – A Nazareth, edição n.º 252, de 25 de janeiro de 1909 – Semana Alcobacense, edição n.º 448, de 29 de janeiro de 1899

Bibliografia – BATISTA, João Maria; OLIVEIRA, João Justino Batista – Chrographia Moderna do Reino de Portugal, Typographia da Academia Real das Sciencias, Lisboa, 1876, Vol. IV. – LARCHER, Tito – Diccionário Biographico Chorographico e Histórico do Districto de Leiria e Concelho de Villa Nova D’Ourém, 1907. – LOUREIRO, Adolpho – Os Portos Marítimos de Portugal e ilhas adjacentes, Imprensa Nacional, Lisboa, 1904, vol. II. – MADURO, António Valério – Cister em Alcobaça. Território, Economia e Sociedade (séculos XVIIIXX). (série: Tempos e lugares 2). Porto, ISMAI/CEDTUR, 2011. – MACEDO, D. António da Costa de Sousa – Estatística do Distrito Administrativo de Leiria, Tipografia Leiriense, Leiria, 1855. – PORTELA, Miguel – “A indústria papeleira na região de Leiria no Portugal oitocentista”, Cadernos de Estudos Leirienses- 3, Editor: Carlos Fernandes, Textiverso, 2014, pp. 181-200. – PORTELA, Miguel – “Mestres Papeleiros Genoveses em Alcobaça - Breves Apontamentos”, Jornal da Golpilheira, Diretor: Luís Miguel Ferraz, Ano XIX, Edição 217, julho - 2015, pp. 16-17.

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