Key-words: Funding, Humans, Nutrients, Phytoplankton, Management

Florações de Algas Nocivas (FANs): Um desafio prático em Oceanografia Costeira Ricardo Ferreira Leal¹; Ana Carolina da Silva Braga² Resumo: A reavalia...
3 downloads 0 Views 426KB Size
Florações de Algas Nocivas (FANs): Um desafio prático em Oceanografia Costeira Ricardo Ferreira Leal¹; Ana Carolina da Silva Braga² Resumo: A reavaliação da política de financiamento à ciência vem causando debates sobre o valor relativo das pesquisas fundamentais versus as aplicadas. Economicamente isto é compreensível e necessário. Algumas linhas de pesquisas satisfazem a ambas, se direcionar à fatores de cunho social e econômico através de pesquisas fundamentais. Como exemplo disto, o assunto discutido neste ensaio: As Florações de Algas Nocivas (FANs). Estes fenômenos são causadores de uma série de efeitos negativos, tanto por sua toxidade quanto pelo seu excesso de biomassa, ao ambiente e a biota marinha (aquática em geral) e ao longo da cadeia alimentar, incluindo, no topo desta, os humanos. É apontado que o aumento de incidência de FANs através do planeta pode refletir o aumento da carga de nutrientes provenientes de atividades humanas, em águas costeiras através das últimas décadas. Estudos indicam que a composição das espécies de fitoplâncton nestas águas pode estar sendo alteradas devido à este aumento da disponibilidade de nitrogênio (N) e fósforo (P), favorecendo então as formas nocivas destas espécies. O uso de novas tecnologias favorece ao estudo e monitoramento de condições favoráveis ao desenvolvimento de FANs. Este ensaio descreve a natureza e a extensão de problemas causados por estas FANs. Seu objetivo foi evidenciar questões que devem ser endereçadas às oceanografias física, biológica e química para que o objetivo de um gerenciamento eficaz baseado em ciência sobre os recursos marinhos, saúde pública e ecossistemas em áreas onde FANs possam vir a ocorrer venha a ser alcançado. Palavras-chave: Financiamento, Humanos, Nutrientes, Fitoplâncton, Gerenciamento. Abstract: A re-evaluation of science funding have been causing debates over the relative value of fundamental research versus the practical or applied. Economically this is understandable and necessary. Some satisfy both, address social and economic issues through fundamental research. As an example, the subject of this essay: Harmful Algal Bloom (HAB). These are the cause of one wide range of negative effects, because of its toxicity or its excess of biomass, to the environment and to the marine life (aquatic in general) and through the food web, including, at the top of it, humans. It has been pointed that the increased incidence of HAB outbreaks worldwide could be a reflection of increased nutrient load from human activities in coastal waters through the last decades. Studys indicate that the phytoplankton species composition in these waters could have been altered by the increased availability of nitrogen (N) and phosphorus (P), favoring harmful forms of phytoplankton. The use of new technologies favors the study and the monitoring of favorable conditions to development of HAB. This essay describes the nature and the extent of problems caused a by HAB outbreaks. The objective was to put in evidence issues that must be addressed to the physical, biological and chemical oceanography to achieve the goal of a management based in science of marine resources, public and ecosystems health in areas where there is a possibility of an HAB outbreak could be achieved. Key-words: Funding, Humans, Nutrients, Phytoplankton, Management.

Florações de Algas Nocivas (FANs): Um desafio prático em Oceanografia Costeira. O debate entre o valor da pesquisa aplicada e o da pesquisa fundamental tem se aquecido muito nos últimos anos. A oceanografia não tem sido poupada da reavaliação das políticas de suporte financeiro as pesquisas cientificas. Agências com interesses em ambientes marinhos tem sempre focado suas verbas em problemas práticos e em suas soluções. Aquelas com compromissos tradicionais em pesquisas fundamentais têm aumentado sua luta pela liberdade de financiar pesquisas de qualidade sem a distinção se estas são de cunho fundamental ao invés das de aplicações práticas ou comerciais. Nesta linha de pensamento, é interessante ressaltar que certos programas científicos satisfazem a ambos os lados deste dilema da política de financiamento, programas estes dirigidos a importantes problemas de cunho social através de avanços em pesquisa fundamental. Um exemplo de pesquisas oceanográficas nesta linha são as direcionadas ao fenômeno conhecido, no passado como red tides, “marés vermelhas”, e hoje como Harmful Algal Blooms (HAB) (Anderson, 1995), “Floração de Algas Nocivas” (FAN) em português, termo cunhado pela primeira vez em 1974 durante a 1ª Conferência Internacional de Florações de Dinoflagelados Tóxicos (Castro & Moser, 2012). Convém mencionar que o termo FAN é operacional e não técnico, pois algumas FANs são seres protistas que obtém sua nutrição por “herbivoria” ao invés de fotossíntese (Glibert et al, 2005). Será descrito neste ensaio alguns aspectos da natureza e extensão dos problemas causados por estas florações súbitas e explosivas. O objetivo aqui é enfatizar questões fundamentais oceanográficas em física, biologia e química, e a interação entre estas ciências diversas. Questões estas que necessitam ser respondidas para que o objetivo de um gerenciamento efetivo de recursos de pesca e maricultura, da saúde pública e da saúde de ecossistemas em regiões ameaçadas por FANs venha a ser atingido (Anderson, 1995; Furtado, 2001; Castro & Moser, 2012). Fitoplâncton (Fig.1), macro e microscópico, são comuns em águas costeiras. A maioria das FANs (Fig.2) são causadas por dinoflagelados ou cianobactérias, mas outras classes, incluindo diatomáceas e algumas macrófitas (Fig.3), possuem membros que podem formar FANs sob certas circunstâncias (Glibert et al, 2005; Alves et al, 2010). Não há a necessidade de se postular fatores obscuros para se explicar as FANs. Existe somente a necessidade de que haja condições que favoreçam o crescimento e dominância de uma grande população de determinada espécie e condições hidrográficas e meteorológicas próprias para permitir a acumulação de organismos na superfície e afetar futuras

concentrações em áreas especificas (Ryther, 1955; Glibert et al, 2005). Podem reproduzirse explosivamente, resultando no que é chamado de “floração”. Estes organismos podem se tornar tão numerosos e concentrados que mudam a cor da água. Muitas vezes vermelhas, eram no passado chamadas de “marés vermelhas”, uma expressão hoje já obsoleta como jargão científico. Em alguns caso não produzem a descoloração da água, mas ainda assim estão presentes em número suficiente para afetar moluscos e outras formas de vida marinha (Anderson, 1995). Uma intensa floração pode produzir impactos nocivos em ecossistemas aquáticos, marinhosee dulcícolas (Moraes, 2000). Quando massas destes organismos morrem e decompõem-se, consomem e reduzem o oxigênio na água (Furtado, 2011; Castro & Moser, 2012), fazendo com que animais ou deixem a área ou morram (Fig.4) (Glibert et al, 2005). Uma pequena porcentagem pode produzir toxinas poderosas (Anderson, 1995; Castro & Moser, 2012). Moluscos geralmente não morrem por envenenamento, mas podem acumular toxina suficiente para matar um homem (Anderson, 1995). O termo “Floração de Algas Nocivas” é associado às florações que matam ou produzem sérios danos devido, ou às suas toxinas, ou ao seu excesso de biomassa (Castro & Moser, 2012). FANs são consideradas um perigo ambiental devido a sua capacidade de envenenamento. Quando frutos do mar “envenenados” são consumidos (Furtado, 2012), ou quando toxinas provenientes de FANs são ingeridas ou, em forma de aerosol, respiradas, isto pode levar à morte (Anderson, 1995; Castro & Morse, 2012). Como consequência, estes eventos afetam de forma adversa atividades comerciais como a aquacultura, a pesca comercial e recreativa, o turismo, e à preciosos e frágeis habitats, criando imenso impacto em localidades atingidas (Fig.5) (Anderson, 1995; Furtado, 2011). Nem todas as FANs apresentam propriedades tóxicas. Estas podem ser “nocivas” de duas formas: a primeira é através da produção de toxinas que podem vir a causar a morte de peixes, mamíferos aquáticos, aves, direta ou indiretamente causar envenenamento de humanos e até animais terrestres; a segunda é através da grande acumulação de biomassa, que pode levar a danos ambientais, que incluem hypoxia, anoxia e sombreamento de vegetações submersas (Fig.6) (Glibert et al, 2005; Castro & Moser, 2012). Nesta mesma linha de não tóxicas, as espécies de FANs que possuem estruturas fisicas, como espinhos, podem alojar-se em guelras, causando irritação e, eventualmente, sufocamento do organismo (Anderson, 1995; Glibert et al, 2005). As toxinas produzidas por FANs, que não são poucas, tem como exemplos as brevetoxinas, que causam envenenamento neurotóxico por moluscos (NSP); saxitoxinas, que causam envenamento com paralisia por moluscos (PSP); ácido okadaico, que causa envenamento diarrético por

moluscos (DSP); ácido domoico, causador de amnésia por envenamento também por moluscos (ASP) e a toxina ciguatera, que causa o envenenamento ciguatera por peixes (CFP). É importante mencionar que a mesma espécie pode às vezes apresentar impactos muito diversos em duas regiões diferentes, sendo tóxica em um local e não tóxica em outro (Anderson, 1995; Glibert et al, 2005; Alves et al, 2010; Castro & Moser, 2012). Vale a pena ressaltar que não são conhecidos antídotos a estes efeitos tóxicos (Anderson, 1995). Qualquer estudo sério e extensivo em FAN hoje em dia necessita incorporar um entendimento das condições físicas que levam a agregação e dispersão dos organismos envolvidos.

Condições

favoráveis

a

formação

de

FANs

incluem

interações

fisico/biológicas, como: 

Forças de larga escala, causados por movimentos de massa d’agua induzidos por ventos, flutuação e movimentação causada por correntes de maré.



Forças de escala intermediária, resultado da formação de zonas de convergência, frentes e ressurgência.



Forças de pequena escala, tendo sua importância na formação de camadas com integração dos fatores físicos, químicos e biológicos em sistemas costeiros estratificados. Isto produz um ambiente potencialmente favorável a organismos com capacidade de mobilidade que podem manter suas posições nestas camadas (Anderson, 1995; Glibert et al, 2005). Uma das explicações dadas atualmente ao aumento da incidência de FANs

explosivas por todo o mundo é de que estes eventos refletem o aumento de poluição e da quantidade da carga de nutrientes em águas costeiras, afetando a dinâmica destes ( Smayda, 1990; Anderson, 1995; Castro & Moser, 2012). Acredita-se que estamos presenciando uma grande alteração na composição das espécies de fitoplâncton nos ecossistemas marinhos costeiros ( Smayda, 1990), devido a atividades antrópicas trazendo nutrientes na forma de efluentes de origem industrial, pecuária e doméstica. Esta alteração é apontada como um fator que favorece a proliferação de algas potencialmente nocivas baseado na razão de certas espécies de fitoplâncton por poluição (Anderson, 1995; Castro & Moser, 2012). Smayda (1990), argumentou que esta tolerância de espécies de fitoplâncton está associada à abundância relativa de nutrientes específicos em águas costeiras e que a influência antrópica alterou esta razão em favor de algas potencialmente nocivas. Por exemplo, diatomáceas, que em sua maioria são inofensivas, requerem sílica (Si) em suas paredes celulares, ao contrário de grande parte do fitoplâncton. Como Si não é abundante em efluentes com origem antrópica, mas nitrogênio (N) e fósforo (P) o são, a

razão N:Si ou P:Si tem sido alterados através das décadas de influência antrópica (Anderson, 1995; Castro & Moser, 2012). Assim, o crescimento de diatomáceas irá cessar quando a Si no ambiente não for mais disponível, ao passo que outras classes de fitoplâncton, que possuem mais espécies tóxicas, continuam a se proliferar utilizando o excesso de N e P (Anderson, 1995). Tecnologias emergentes são de grande valia a cientistas envolvidos em estudos e monitoramento de FANs (Anderson, 1995; Castro & Morse, 2012). Dentre elas: 

Sensores remotos: As ferramentas mais úteis no monitoramento de FANs. Através do uso de satélites (Fig.7) e boias oceanográficas (Fig.8) é possível detectar a presença de “clorofila a” (e outros pigmentos), vento, temperatura e movimento de massas de água assim como o de frentes, auxiliando a uma previsão de condições propicias ao desenvolvimento de FANs.



Modelos matemáticos: Utilizam informações coletadas através de diferentes técnicas, tais como sensores remotos e derivadores empíricos, para realizarem previsões relativas a possíveis desenvolvimentos de FANs. Ainda são muito restritos em seu uso, sendo necessário aperfeiçoamento e criação de modelos relativos a interações físicas e biológicas.



Marcadores moleculares: Possuem ainda capacidade restrita de uso. Fluorescência para o rotulamento de espécies é o mais utilizado no momento. Detecção imunológica de espécies nocivas também é objeto de estudo. Marcadores genéticos em DNA e RNA de células é uma técnica promissora.

Assim, apesar de todo o esforço colocado em pesquisas e desenvolvimento de novas tecnologias e métodos voltados a previsão e monitoramento de condições favoráveis ao surgimento de FANs, ainda há muito o que ser feito. O objetivo final de todas as pesquisas relacionadas a FANs é gerar informações científicas para seja aprimorado o gerenciamento dos recursos marinhos e da saúde pública em regiões ameaçadas pela ocorrência de FANs. Existe assim a necessidade de uma integração entre diversas agências governamentais e instituições de pesquisas trabalhando no assunto. Nos Estados Unidos da América existe a “Força de Trabalho Interagencial em Biotoxinas Marinhas e Algas Nocivas”, que mantém suporte para investigações científicas fundamentais em um fenômeno oceanográfico que é de grande importância para a sociedade (Anderson, 1995). Este exemplo de cooperação e trabalho em equipe deveria ser seguido por outros países, sendo uma ótima demonstração da integração entre pesquisa aplicada e pesquisa fundamental posta em prática e da cooperação à diversos níveis governamentais e institucionais.

Bibliografia: ALVES, T. P., SCHRAMM, M. A., TAMANAHA, M. da S., PROENÇA, L. A. de O., 2010. Implementação e a avaliação do monitoramento de algas nocivas e de ficotoxinas em um cultivo de moluscos em Florianópolis – SC. Atlântica, 32(1): 71-77. ANDERSON, D. M., 1995. Toxic red tides and harmful algal blooms: A pratical challenge in coastal oceanography. Reviews of Geophysics, Supplement, :1189-1200. CASTRO, N. O. de, MOSER, G. A. de O., 2012. Florações de algas nocivas e seus efeitos ambientais. Oecologia Australis 16(2): 235-264. FURTADO, L.F., 2011. Causas e consequências do aumento de florações de algas nocivas no litoral brasileiro. Revista Ceciliana, Dez 3(2): 25-26. GLIBERT, P. M., ANDERSON, D. M., GENTIEN, P., GRANELI, E., & SELLNER, K.G., 2005. The Global, Complex Phenomena of Harmful Algal Blooms. Oceanography, 18(2) :136-137. MORAES, M., 2000. Levantamento dos estudos sobre cianobactérias tóxicas em águas continentais do Brasil. Dissertação de Mestrado, Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, 87p. RYTHER, J., 1955. Ecology of autotrophic marine dinoflagellates with reference to red water conditions. In: The Luminescence of Biological Systems, F.H. Johnson, ed. American Association for the Advancement of Science, Washington, D.C., USA, :347-413. SMAYDA, T. J.; 1990. Novel and nuisance phytoplankton booms in the sea: Evidence for a global epidemic. In: Toxic Marine Phytoplankton, 4th International Conference. Elsevier, Amsterdam, :29-40

Anexos:

Figura 1: Exemplo de fitoplâncton capaz de produzir HAB. (Fonte: National Oceanic and Atmospheric Administration-NOAA). < http://oceanservice.noaa.gov/hazards/hab/>. Acesso em: 26 oct. 2012.

Figura 2: Vista de uma FAN causada por fitoplâncton. Fonte: NOAA. . Acesso em: 26 oct. 2012.

Figura 3: Vista de uma FAN causada por macrófitas. Fonte: NOAA. . Acesso em: 26 oct. 2012.

Figura 4: Fitoplâncton e peixes em decomposição. Fonte: NOAA. < http://oceanservice.noaa.gov/hazards/hab/>. Acesso em: 26 oct. 2012.

Figura 5: Alerta da possibilidade de que a carne dos mexilhões esteja envenenada. Tradução: “Em quarentena. Não comer mexilhões dessas águas a partir de 1 maio a 31 de outubro. A carne escura de moluscos deve ser descartada. Carne poderia ser venenosa”. Fonte: NOAA. < http://oceanservice.noaa.gov/hazards/hab/>. Acesso em: 26 oct. 2012.

Figura 6: FAN e uma de suas consequências: Mortandade de peixes. Fonte: NOAA. < http://oceanservice.noaa.gov/hazards/hab/>. Acesso em: 26 oct. 2012.

Figura 7: Imagem por satélite demonstrando um possível desenvolvimento de uma FAN na costa Oeste da Flórida. Fonte: NOAA. < http://oceanservice.noaa.gov/hazards/hab/>. Acesso em: 26 oct. 2012.

Figura 8: Exemplo de uma boia oceanográfica. Fonte: NOAA. < http://oceanservice.noaa.gov/hazards/hab/>. Acesso em: 26 oct. 2012.

Suggest Documents