Joaquim Maria Machado de Assis, cronista, contista, dramaturgo, jornalista, poeta, novelista, romancista, crítico e ensaísta, nasceu na cidade do Rio

 Joaquim Maria Machado de Assis, cronista, contista, dramaturgo, jornalista, poeta, novelista, romancista, crítico e ensaísta, nasceu na cidade do ...
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Joaquim Maria Machado de Assis, cronista, contista, dramaturgo, jornalista, poeta, novelista, romancista, crítico e ensaísta, nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 21 de junho de 1839. Filho de um operário mestiço de negro e português, Francisco José de Assis, e de D. Maria Leopoldina Machado de Assis, aquele que viria a tornar-se o maior escritor do país e um mestre da língua, perde a mãe muito cedo e é criado pela madrasta, Maria Inês, também mulata, que se dedica ao menino e o matricula na escola pública, única que freqüentará o autodidata Machado de Assis.



De saúde frágil, epilético, gago, sabe-se pouco de sua infância e início da juventude. Criado no morro do Livramento, consta que ajudava a missa na igreja da Lampadosa. Com a morte do pai, em 1851, Maria Inês, à época morando em São Cristóvão, emprega-se como doceira num colégio do bairro, e Machadinho, como era chamado, torna-se vendedor de doces. No colégio tem contato com professores e alunos e é até provável que assistisse às aulas nas ocasiões em que não estava trabalhando.



Mesmo sem ter acesso a cursos regulares, empenhou-se em aprender. Consta que, em São Cristóvão, conheceu uma senhora francesa, proprietária de uma padaria, cujo forneiro lhe deu as primeiras lições de Francês. Contava, também, com a proteção da madrinha D. Maria José de Mendonça Barroso, viúva do Brigadeiro e Senador do Império Bento Barroso Pereira, proprietária da Quinta do Livramento, onde foram agregados seus pais.



Aos 16 anos, publica em 12-01-1855 seu primeiro trabalho literário, o poema "Ela", na revista Marmota Fluminense, de Francisco de Paula Brito. A Livraria Paula Brito acolhia novos talentos da época, tendo publicado o citado poema e feito de Machado de Assis seu colaborador efetivo. Com 17 anos, consegue emprego como aprendiz de tipógrafo na Imprensa Nacional, e começa a escrever durante o tempo livre. Conhece o então diretor do órgão, Manuel Antônio de Almeida, autor de Memórias de um sargento de milícias, que se torna seu protetor.



Em 1858 volta à Livraria Paula Brito, como revisor e colaborador da Marmota, e ali integra-se à sociedade líterohumorística Petalógica, fundada por Paula Brito. Lá constrói o seu círculo de amigos, do qual faziam parte Joaquim Manoel de Macedo, Manoel Antônio de Almeida, José de Alencar e Gonçalves Dias. Começa a publicar obras românticas e, em 1859, era revisor e colaborava com o jornal Correio Mercantil. Em 1860, a convite de Quintino Bocaiúva, passa a fazer parte da redação do jornal Diário do Rio de Janeiro. Além desse, escrevia também para a revista O Espelho (como crítico teatral, inicialmente), A Semana Ilustrada(onde, além do nome, usava o pseudônimo de Dr. Semana) e Jornal das Famílias.



Seu primeiro livro foi impresso em 1861, com o título Queda que as mulheres têm para os tolos, onde aparece como tradutor. No ano de 1862 era censor teatral, cargo que não rendia qualquer remuneração, mas o possibilitava a ter acesso livre aos teatros. Nessa época, passa a colaborar em O Futuro, órgão sob a direção do irmão de sua futura esposa, Faustino Xavier de Novais. Publica seu primeiro livro de poesias em 1864, sob o título de Crisálidas. Em 1867, é nomeado ajudante do diretor de publicação do Diário Oficial.



Sua união foi feliz, mas sem filhos. A morte de sua esposa, em 1904, é uma sentida perda, tendo o marido dedicado à falecida o soneto Carolina, que a celebrizou. Seu primeiro romance, Ressurreição, foi publicado em 1872. Com a nomeação para o cargo de primeiro oficial da Secretaria de Estado do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, estabiliza-se na carreira burocrática que seria o seu principal meio de subsistência durante toda sua vida.



Agosto de 1869 marca a data da morte de seu amigo Faustino Xavier de Novais, e, menos de três meses depois, em 12 de novembro de 1869, casa-se com Carolina Augusta Xavier de Novais.

Nessa época, o escritor era um típico homem de letras brasileiro bem sucedido, confortavelmente amparado por um cargo público e por um casamento feliz que durou 35 anos. D. Carolina, mulher culta, apresenta Machado aos clássicos portugueses e a vários autores da língua inglesa.





No O Globo de então (1874), jornal de Quintino Bocaiúva, começa a publicar em folhetins o romance A mão e a luva. Escreveu crônicas, contos, poesias e romances para as revistas O Cruzeiro, A Estação e Revista Brasileira. Sua primeira peça teatral é encenada no Imperial Teatro Dom Pedro II em junho de 1880, escrita especialmente para a comemoração do tricentenário de Camões, em festividades programadas pelo Real Gabinete Português de Leitura.

Na Gazeta de Notícias, no período de 1881 a 1897, publica aquelas que foram consideradas suas melhores crônicas.





Em 1881, com a posse como ministro interino da Agricultura, Comércio Obras Públicas do poeta Pedro Luís Pereira de Sousa, Machado assume o cargo de oficial de gabinete. Publica, nesse ano, um livro extremamente original , pouco convencional para o estilo da época: Memórias Póstumas de Brás Cubas -- que foi considerado, juntamente com O Mulato, de Aluísio de Azevedo, o marco do realismo na literatura brasileira.

Extraordinário contista, publica Papéis Avulsos em 1882, Histórias sem data(1884), Vária Histórias (1896), Páginas Recolhidas (1889), e Relíquias da casa velha (1906).



Torna-se diretor da Diretoria do Comércio no Ministério em que servia, no ano de 1889. Grande amigo do escritor paraense José Veríssimo, que dirigia a Revista Brasileira, em sua redação promoviam reuniões os intelectuais que se identificaram com a idéia de Lúcio de Mendonça de criar uma Academia Brasileira de Letras. Machado desde o princípio apoiou a idéia e compareceu às reuniões preparatórias e, no dia 28 de janeiro de 1897, quando se instalou a Academia, foi eleito presidente da instituição, cargo que ocupou até sua morte, ocorrida no Rio de Janeiro em 29 de setembro de 1908. Sua oração fúnebre foi proferida pelo acadêmico Rui Barbosa.





É o fundador da cadeira nº. 23, e escolheu o nome de José de Alencar, seu grande amigo, para ser seu patrono. Por sua importância, a Academia Brasileira de Letras passou a ser chamada de Casa de Machado de Assis.



Dizem os críticos que Machado era "urbano, aristocrata, cosmopolita, reservado e cínico, ignorou questões sociais como a independência do Brasil e a abolição da escravatura. Passou ao longe do nacionalismo, tendo ambientado suas histórias sempre no Rio, como se não houvesse outro lugar. ... A galeria de tipos e personagens que criou revela o autor como um mestre da observação psicológica. ... Sua obra divide-se em duas fases, uma romântica e outra parnasiano-realista, quando desenvolveu inconfundível estilo desiludido, sarcástico e amargo. O domínio da linguagem é sutil e o estilo é preciso, reticente. O humor pessimista e a complexidade do pensamento, além da desconfiança na razão (no seu sentido cartesiano e iluminista), fazem com que se afaste de seus contemporâneos."

Introdução 

Publicado em 1881, Memórias Póstumas de Brás Cubas, além de inaugurar o Realismo brasileiro, apresenta as mais radicais experimentações na prosa do país até então. Narrado por um defunto, de forma digressiva e agressiva, o romance apresenta a vida inútil e desperdiçada do anti-herói Brás Cubas. Utilizando recursos narrativos e gráficos inusitados, Machado surpreende a cada página com sua ironia cortante e, acima de tudo, com a inteligência que prende até o leitor mais desconfiado. Antecipando procedimentos modernistas e descobertas da psicanálise, esta obra ácida e irônica de Machado de Assis eleva a literatura brasileira a um patamar jamais antes atingido.

O PRIMEIRO ROMANCE PSICOLÓGICO 

Com Memórias Póstumas de Brás Cubas a literatura brasileira atingiu a sua maturidade. Marco inicial do Realismo, introduz o romance psicológico na Literatura brasileira. Nesta obra, Machado de Assis desloca o foco de interesse do romance. O seu enfoque central não é a vida social ou a descrição das paisagens, mas a forma como seus personagens vêem e sentem as circunstâncias em que vivem. Em vez de enfatizar os espaços externos, investe na caracterização interior dos personagens, com suas contradições e problemáticas existenciais.

DO ROMANTISMO AO REALISMO 

A obra de Machado de Assis pode ser dividida em dois momentos bem distintos: as obras da juventude, com forte influência do Romantismo e seu progressivo amadurecimento, até chegar ao Realismo de suas obras da maturidade. Entre estas, as mais destacadas e consideradas são Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891) e Dom Casmurro (1899). Se os escritores românticos, José de Alencar à frente, conseguiram estabelecer o romance como um gênero literário de respeito no Brasil, foi Machado de Assis quem elevou a prosa brasileira ao nível das melhores escritas no mundo em sua época. Sua obra não almeja mais apenas divertir, moralizar ou afirmar valores nacionais, mas visa esmiuçar o espírito humano, refletindo sobre valores universais, sem jamais perder de vista a realidade brasileira.

DOIS TIPOS DE REALISMO 



O chamado Realismo na Literatura brasileira compreende duas manifestações literárias muito diferentes, ambas marcadas pela oposição à tendência idealizante do Romantismo e pela atitude crítica em relação à sociedade.

De um lado temos o Realismo propriamente dito, ou Realismo Psicológico, inaugurado por Memórias Póstumas de Brás Cubas; de outro, o Realismo-Naturalismo, cujo marco inicial é o romance O Mulato, também de 1881, de Aluísio Azevedo (1857-1913).



A obra mais importante do Realismo-Naturalismo é O Cortiço, de Aluísio Azevedo, editado em 1890. No livro de Azevedo, a trama desenvolve-se em uma habitação coletiva do Rio de Janeiro, onde vivem e circulam operários, prostitutas e personagens das mais variadas classes sociais. A composição desses tipos e do enredo tem a intenção de descrever objetivamente a vida de uma determinada sociedade e retratar seu funcionamento. O Realismo-Naturalismo é cientificista e determinista, considerando que as ações humanas são produtos de leis naturais: do meio, das características hereditárias e do momento histórico.



Já o Realismo Psicológico de Machado de Assis despreza tanta objetividade. O escritor concentra sua narrativa na visão de mundo de seus personagens, expondo suas contradições. A classificação mais adotada para definir a escola literária a que pertence Machado de Assis na segunda fase de sua obra é Realismo Psicológico. O recurso que ele utiliza para discutir a sociedade é a abordagem, em profundidade, da individualidade e do caráter dos personagens.

POUCA AÇÃO E MUITAS SURPRESAS 

Na abertura do livro, uma dedicatória escrita sob a forma de um epitáfio anuncia o narrador desse romance inusitado: Brás Cubas, um defunto-autor que começa contando detalhes do seu funeral. Depois de algumas digressões, ele retoma a ordem cronológica dos acontecimentos, relatando a infância e a primeira paixão da adolescência, aos 17 anos, pela cortesã Marcela. Presenteia tanto a amada que o pai, irritado com o gasto excessivo, manda-o estudar Direito em Coimbra, Portugal.



Assim como foi, também volta a chamado do pai porque a mãe está à morte. Namora então Eugênia, a filha de uma amiga pobre da família, enquanto o pai procura arranjar um casamento de interesse com Virgília, a filha de um político, o Conselheiro Dutra. Ela, no entanto, casa-se com um político, Lobo Neves, e posteriormente se torna amante de Brás, mantendo com ele encontros na casa habitada por dona Plácida. Antes de o caso começar, morre o pai de Brás. Começa então um litígio entre ele e a irmã Sabina pela herança.



Em meio a tudo isso, o protagonista Brás reencontra Quincas Borba, amigo dos tempos de escola, que lhe apresenta uma doutrina filosófica que criara, o Humanitismo. Virgília parte para o Norte, acompanhando o marido, nomeado presidente de província. Brás namora então a sobrinha do cunhado Cotrim, mas a garota morre aos 19 anos. Ele, que já se tornara deputado, fracassa na tentativa de virar ministro de Estado. Frustrado, funda um jornal de oposição. Percebe, então, que Quincas Borba está enlouquecendo progressivamente.



Procurado por Virgília, já idosa, Brás ampara dona Plácida, que morre pouco depois. É um período cheio de perdas e decepções: morrem Marcela, o louco Quincas Borba, Lobo Neves e Eugênia aparece em um cortiço. Ao tentar inventar um emplasto que lhe daria a fama tão desejada, Brás Cubas adoece e recebe a visita da ex-amante Virgília e do filho dela. Morre depois de um delírio, aos 64 anos. Decide, então, contar sua vida em detalhes, mas, pouco sistemático que é, e ainda excitado pela experiência da morte, sua narrativa segue a lógica do pensamento.



O caráter inovador de Memórias Póstumas de Brás Cubas não está na história propriamente dita ou na seqüência cronológica dos fatos. A melhor chave para compreender a obra são as reflexões do personagem, como elas se encadeiam e se misturam aos eventos que ele vive.

NARRADOR – O PERSONAGEM CENTRAL 

O romance tem uma perspectiva deslocada: é narrado por um defunto, que reconta a própria vida, do fim para o começo, num relato marcado pela franqueza e inseção. "Falo sem temer mais nada", diz o morto. É Brás Cubas, personagem “esférico”, ou seja, de grande densidade psicológica, quem comenta as próprias mudanças. Brás Cubas, classificado pelos críticos como o grande hipócrita da Literatura brasileira, é um sujeito sem objetivos e muito contraditório, sempre rondando a periferia do poder. Típico burguês da segunda metade do século XIX, encarna o homem que passou a vida sem conquistar nenhuma realização efetiva



Se na infância o personagem fora uma criança abastada e protegida, torna-se um jovem adulto leviano, em busca da melhor maneira de tirar vantagem. Sua conduta fica explícita quando descreve sua formação universitária na Europa:



“Não digo que a Universidade me não tivesse ensinado alguma; mas eu decorei-lhe só as fórmulas, o vocabulário, o esqueleto. Tratei-a como tratei o latim – embolsei três versos de Virgílio, dois de Horácio, uma dúzia de locuções morais e política para as despesas da conversação. Tratei-os como tratei a história e a jurisprudência. Colhi de todas as coisas a fraseologia, a casca, a ornamentação (...)“



Quando volta ao Brasil, por causa da doença da mãe, se defronta pela primeira vez com a questão da morte e vive então um momento de introspecção e reflexão. Quando reencontra Marcela velha e doente, retoma a idéia da passagem do tempo. A isso Brás chama de teoria das edições da vida, anunciada nos primeiros capítulos, mas comentada muito depois. “Pois sabei que, naquele tempo, estava eu na quarta edição, revista e emendada, mas ainda inçada de descuidos e barbarismos; defeito que, aliás, achava alguma compensação no tipo, que era elegante, e na encadernação, que era luxuosa.”



Na maturidade, começa a buscar a compensação pela existência sem nada de notável, sem filhos ou realizações: consegue um cargo público, busca notoriedade e respeitabilidade ao querer tornar-se ministro. Pouco antes de morrer, imagina ainda um último modo de se perpetuar: inventando um emplasto, uma medicação sublime.

PERSONAGENS COMPLEMENTARES 

Os personagens criados por Machado de Assis entram e saem de cena conforme os pensamentos de Brás Cubas. Entre eles, quem merece maior destaque é Quincas Borba, que, mais tarde, será o personagem-título de outro romance do autor. Ele influencia profundamente o narrador com a sua teoria do Humanitismo. Os dois conheceram-se no colégio e reencontram-se muitos anos depois. Quincas é um mendigo que vai enlouquecendo progressivamente.



Ao morrer, está completamente fora de si. Seu Humanitismo prega que tudo o que acontece na vida faz parte de um quadro maior de preservação da essência humana. A ironia é uma das marcas da obra de Machado de Assis. Nesta obra isso fica claro quando o autor faz com que uma doutrina de valorização da vida seja defendida justamente por um mendigo que morre completamente louco.





No contexto do romance, o Humanitismo convém a Brás para justificar sua existência vazia. A teoria de Quincas Borba dá a ele uma ilusão da descoberta de um sentido para a vida. A morte de Quincas Borba reconduz Brás Cubas ao confronto com a vacuidade de sua existência. Machado confirma assim a tese anunciada no Capítulo 7 – “O delírio”, sobre a perseguição inútil da felicidade. Quincas Borba é importante porque introduz Brás Cubas na teoria que inventou, o Humanitismo. Na verdade, a teoria do mendigo é uma caricatura que Machado de Assis faz do positivismo e do evolucionismo, teorias científicas e filosóficas em voga na época que atribuem sentido de evolução mesmo às fatalidades da vida.

AS INOVAÇÕES DE MACHADO DE ASSIS 

A estrutura de Memórias Póstumas de Brás Cubas tem uma lógica narrativa surpreendente e inovadora. A seqüência do livro não é determinada pela cronologia dos fatos, mas pelo encadeamento das reflexões do personagem. Uma lembrança puxa a outra e o narrador Brás Cubas, que prometera contar uma determinada história, comenta todos os outros fatos que a envolvem, para retomar o tema anunciado muitos capítulos depois. Organizados em blocos curtos, os 160 capítulos de Memórias Póstumas de Brás Cubas fluem segundo o ritmo do pensamento do narrador.



A aparente falta de coerência da narrativa, permeada por longas digressões, dissimula uma forte coerência interna, oferecendo ao leitor todas as informações para conhecer a visão de mundo de um homem que passou pela vida sem realização nenhuma, apenas ao sabor de seus desejos. Logo nas primeiras páginas, o escritor brinca com a expectativa do leitor de chegar logo às ações do romance. Machado de Assis, por intermédio do seu narrador, se dirige diretamente ao leitor, metalingüisticamente, para comentar o livro. Diz Brás Cubas:

“Veja o leitor a comparação que melhor lhe quadrar, veja-a e não esteja daí a torcer-me o nariz, só porque ainda não chegamos à parte narrativa destas memórias. Lá iremos. Creio que prefere a anedota à reflexão, como os outros leitores, seus confrades, e acho que faz muito bem”. 

Ao usar a metalinguagem, Machado convida o leitor a refletir sobre a estrutura da obra e perceber dois níveis de leitura: a que revela diretamente o personagem e a que o faz objeto de crítica do autor.





O autor também questiona a forma tradicional de expressão, acreditando que falta a ela a capacidade plena de levar ao leitor os sentimentos do personagem. É essa preocupação que faz Machado de Assis subverter a forma para adaptá-la ao conteúdo que deseja transmitir. A ironia é um dos traços mais marcantes da obra de Machado de Assis e aparece ainda mais acentuada nos chamados romances da maturidade. Pode ser entendida como mais um recurso para combater as verdades absolutas, das quais desacreditava por princípio. A construção irônica prevê sempre outros sentidos para o que é dito.



Machado de Assis foi o mais ousado dos escritores brasileiros anteriores ao Modernismo (1922) na experimentação de novas formas de expressão. Em Memórias Postumas de Brás Cubas mostra sua desconfiança da articulação perfeita entre o texto e a realidade e procura adequar a forma ao conteúdo. Exemplo: para traduzir a frustração de Brás Cubas quando não consegue se tornar ministro, a solução do autor foi deixar o Capítulo 139 em branco. No capítulo seguinte, explica: “Há coisas que melhor se dizem calando; tal é a matéria do capítulo anterior”.





Machado de Assis utiliza-se da ironia como um recurso para fazer o leitor desconfiar das declarações, pensamentos e conclusões do narrador Brás Cubas. Ao comentar, no primeiro capítulo, sobre o amigo que lhe presenteia com um empolado discurso fúnebre, o narrador agradece as palavras ditas em tom de comoção exagerada com uma frase certeira: “Bom e fiel amigo! Não, não me arrependo das vinte apólices que lhe deixei".





A digressão é outro elemento importante da linguagem machadiana. Consiste na interrupção do fluxo narrativo, que envereda por assuntos desvinculados do tema inicial, mas mantendo com ele alguma analogia criada pela mente de quem conta. Essa analogia, com algum esforço, pode ser percebida pelo leitor, desde que ele se mantenha atento. O leitor de Machado é constantemente solicitado a interagir criticamente com a obra, distanciando-se ainda mais do modelo de leitura proposto pelos romances românticos, que mobilizam a emoção e a imaginação.



É o que acontece, por exemplo, na parte inicial do romance, quando Brás Cubas deixa em suspenso por vários capítulos a explicação para sua morte, que prometera desde o início, para passear descomprometidamente por assuntos tão díspares quanto as pirâmides do Egito e a sua árvore genealógica. Quando volta a falar da causa mortis, é para comentar, com ironia "...acabemos de uma vez com o nosso emplasto”. Como se já tivesse explicado antes do que se tratava!

Referências http://www.releituras.com/machadodeassis_bio.asp http://fredb.sites.uol.com.br/mpbc.html

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