APOSTILA - Curso de Direito. Prof. Dr. Nelson Rodrigues Netto 1

APOSTILA - Curso de Direito Prof. Dr. Nelson Rodrigues Netto1 Pós-Doutorado em Direito pela Harvard Law School. Doutor, Mestre e Especialista em Dire...
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APOSTILA - Curso de Direito

Prof. Dr. Nelson Rodrigues Netto1 Pós-Doutorado em Direito pela Harvard Law School. Doutor, Mestre e Especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual, da Associação dos Advogados de São Paulo e da Harvard Law School Association do Brasil. Advogado e Consultor Jurídico.

São Paulo – 2009

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TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução, total ou parcial, por qualquer meio ou processo, especialmente por sistemas gráficos, microfílmicos, fotográficos, reprográficos, fonográficos, videográficos. A violação de direitos autorais é punível como crime (Lei nº 9.610, de 19.02.1998).

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ÍNDICE: I – Jurisdição e Competência 1. Funções do Estado 4 2. A função jurisdicional 6 2.1. Conceito 6 2.2. Características da Jurisdição 7 3. A tutela jurisdicional 10 4. Classificação da Jurisdição 11 5. A Organização Judiciária Brasileira 13 5.1. O Supremo Tribunal Federal 14 5.2. O Conselho Nacional de Justiça 15 5.3. O Superior Tribunal de Justiça

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5.4. A Justiça do Trabalho 20 5.4.1. O Tribunal Superior do Trabalho 20 5.4.2. Os Tribunais Regionais do Trabalho 23 5.4.3. Os Juízes do Trabalho 24 5.5. A Justiça Eleitoral 26 5.5.1. O Tribunal Superior Eleitoral 26 5.5.2. Os Tribunais Regionais Eleitorais 28 5.5.3. Os Juízes e as Juntas Eleitorais 5.6. A Justiça Militar

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5.6.1. O Superior Tribunal Militar 32 5.6.2. Os Juízos Militares de 1º grau de jurisdição 32 5.7. A Justiça Federal (justiça comum da União) 35 5.7.1. Os Tribunais Regionais Federais 5.7.2. Os Juízes Federais

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5.8. As Justiças comuns dos Estados, Distrito Federal e Territórios 40 2

5.8.1. Os Tribunais de Justiça 40 5.8.2. Os Juízes de Direito 42 5.8.2.1. Os Juizados Especiais 44 5.8.3. A Justiça Militar dos Estados 46 5.8.4. A Justiça de Paz 48 6. Competência 49 6.1. Conceito 49 6.2. Critérios para determinação da competência 51 6.2.1. Critério funcional 55 6.3. Operações lógicas para concretização da competência 59 7. Ausência de competência – Incompetência absoluta ou relativa 96 7.1. Incompetência absoluta 97 7.2. Incompetência relativa 98 8. Prevenção – Conexão e Continência 103 8.1. Prevenção 103 8.2. Conexão e Continência 104 9. Perpetuatio Jurisdictionis 109 10. Conflito de competência 110

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Jurisdição e Competência 1. – Funções do Estado Analisando a crise do Poder Judiciário, em nossa tese de doutorado, asseveramos ser “ponto pacífico entre os doutos a extrema dificuldade de se fixar um conceito de Estado, considerando que o elemento de destaque de cada corrente doutrinária pende, ora mais para um sentido político, ora para a faceta da força e soberania, ora para o aspecto jurídico”.2 Pela posição primacialmente jurídica, adotamos o ponto de vista do Professor Dalmo de Abreu Dallari, conceituando que “Estado é a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território”.3 É sabido que o poder do Estado é unitário, derivado de sua soberania. Todavia, este poder é divido em funções consoante os diversos objetivos almejados, afastando-se o uso de um critério orgânico para definição de cada uma delas. Assim, à função Legislativa incumbe regulamentar, por intermédio de normas gerais e abstratas, as atividades do corpo social e do próprio Estado.

2

Interposição Conjunta de Recurso Extraordinário e de Recurso Especial, São Paulo: Dialética, 2005, p. 17. 3

Elementos de Teoria Geral do Estado, p. 104.

4

Por seu turno, o Estado na atuação da função Executiva, age de conformidade com a Lei, executando os comandos abstratos e genéricos contidos nas normas jurídicas. É

peculiar

aos

atos

administrativos,

conquanto

praticados sob o regime da estrita legalidade, não possuírem a característica de definitividade, podendo, observado o devido procedimento, serem revistos pelo próprio Estado, no exercício da função Jurisdicional. A última função que compõe o Poder do Estado, consiste da atividade de solucionar os conflitos intersubjetivos de interesses, por meio da atuação da vontade concreta da lei, revelando a função Jurisdicional. Cabe ainda mencionar que, se a função típica da jurisdição é a pacificação dos litígios, o Poder Judiciário exerce em seu seio, de maneira atípica, atividades com cunho legiferante e administrativa. A Constituição Federal confere ao Supremo Tribunal Federal a iniciativa de lei complementar para dispor sobre o Estatuto da Magistratura, conforme o art. 93, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004, publicada em 31 de dezembro de 2004. Em acréscimo, aos Tribunais de Justiça, o art. 125, §1º, da C.F., outorgou a iniciativa para a lei de organização judiciária da Justiça dos Estados. Sob a ótica administrativa, o art. 96, da C.F., atribui aos Tribunais ampla gama de poderes, representativos de sua auto-gestão e auto-regulamentação. 5

2. A função jurisdicional 2.1. Conceito Etimologicamente a palavra jurisdição é oriunda do latim jurisdictìo,ónis “ação de administrar justiça, judicatura; duração de uma judicatura; direito de administrar justiça; julgamento de causa; tribunal”.4 Consoante o jurista argentino Mario Oderigo, jurisdição - juris dicere, corresponde à função desempenhada pelo Estado de dizer o direito e de aplicá-lo.5 Adotando um espectro mais amplo, a Jurisdição comporta assumir três conceitos diversos: poder – do Estado de decidir imperativamente e impor coercitivamente suas decisões; função consubstanciada na promoção da pacificação dos conflitos intersubjetivos, realizando o ideal de justiça, por meio do processo; e, atividade consistente no complexo de atos do juiz no processo, exercendo o poder e cumprindo a função prescrita na lei.6 Em arremate, é imprescindível destacar o clássico, porém, atualíssimo, conceito de Jurisdição formulado por Chiovenda:

4

Verbete do Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa.

5

Lecciones de Derecho Procesal, Tomo l, p. 195.

6

Cf. Cintra-Grinover-Dinamarco, Teoria Geral do Processo, p. 131.

6

“jurisdição é a função do Estado que tem por escopo a atuação da vontade concreta da lei por meio da substituição, pela atividade de órgãos públicos, da atividade de particulares ou de outros órgãos públicos, já no afirmar a existência da vontade da lei, já no torná-la, praticamente efetiva”.7

2.2. Características da Jurisdição À jurisdição compete a “atuação da vontade concreta da lei”, o que significa dizer a aplicação da norma pré-existente ao caso concreto. Com efeito, os órgãos judiciais ao exercerem a jurisdição não estão criando o direito, atividade essa de alçada exclusiva da função Legislativa. Nada obstante, não há qualquer resquício sincretista na função jurisdicional. As decisões judiciais estão impregnadas dos valores axiológicos da sociedade, canalizados pelo seu condutor, o juiz. Nas sociedades modernas, não há mais espaço para a máxima do liberalismo francês: “le juge c’est la bouche de la loi”. É elemento primordial da jurisdição, a segurança jurídica por ela conferida às situações conflituosas de direito material, promovendo a pacificação entre as partes e emprestando certeza ao direito que preexistia à sentença, mas que se encontrava em estado de incerteza, em virtude da controvérsia.

7

Cf. Instituições de Direito Processual Civil, vol. II, p. 11; Principios de Derecho Procesal Civil, Tomo I, p. 369.

7

Na esteira da lição de Chiovenda, podemos destacar as seguintes características da jurisdição: (i) atuação da vontade da lei – ocorre por meio dos pronunciamentos jurisdicionais que declaram o direito a ser aplicado num caso concreto, bem como que o tornam praticamente efetivo, alterando a realidade do mundo empírico; (ii) substitutividade - representa a impossibilidade, salvo raras exceções legais, dos próprios envolvidos resolverem seus conflitos, cujas condutas são substituídas pela atividade do Estado (v.g., arts. 188, 1.210, §1º, 1.467 usque 1.471, especialmente, o art. 1.469, todos do Código Civil). A própria imparcialidade exigida dos magistrados deriva da característica da substitutividade da jurisdição;8 (iii) inércia – tem raízes históricas profundas, como se verifica do brocardo “nemo judex sine actore”; em virtude da inércia, a atuação do Poder Judiciário somente ocorre quando provocada por um interessado, consoante preceito do art. 2º, do CPC; (iv) litigiosidade - a Jurisdição é exercida quando existe um conflito intersubjetivo de interesses. Excepcionalmente, em virtude dos bens ou interesses jurídicos envolvidos, ao Estado-juiz incumbe-se a intervenção em relações jurídicas não litigiosas, surgindo a denominada jurisdição

8

Neste sentido, José Frederico Marques, Instituições de Direito Processual Civil, vol. I, p. 261; Arruda Alvim, Manual de Direito Processual, v. 1, pp. 162/3; Cândido Rangel Dinamarco, A instrumentalidade do processo, pp. 117/8, especialmente, nota 10.

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voluntária, conceituada como forma de “administração pública de interesses privados”.9 (v) definitividade – as decisões proferidas pelos órgãos jurisdicionais emprestam definitividade às soluções dos litígios, o que é representando no processo, pelo instituto da coisa julgada material; há a vedação da revisão daquilo que foi decidido, quando exaurida a jurisdição, ressalvada a hipótese de vícios processuais que autorizem a propositura de ação rescisória, dentro do biênio decadencial (art. 495, do CPC), ou, de ação declaratória de inexistência de ato processual, independentemente de prazo. (vi) contraditório regular – decorrente da existência de regras bem definidas e de conhecimento prévio das partes, o que empresta legitimidade ao procedimento.

9

Dada a característica da litigiosidade da jurisdição, costuma-se apontar como um contra-senso, a própria afirmação da existência de uma jurisdição que seja voluntária.

9

3. – A tutela jurisdicional A Jurisdição é uma das funções que o Estado realiza na persecução do bem comum a seu povo. O resultado da atividade jurisdicional, de seu lado, consiste na tutela jurisdicional. Entendemos que, a partir de “um matiz constitucional e sob o manto do corolário do direito processual contido na cláusula ‘due process of law’, e dos princípios do contraditório e da isonomia que dela decorrem”, ser a tutela jurisdicional “o próprio exercício da atividade jurisdicional e o resultado que dela advém, atingindo ambos os titulares da relação processual, em seus pólos ativo e passivo”.10

10

Cf. Tutela Jurisdicional Específica: Mandamental e Executiva ‘Lato Sensu’, p. 19.

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4. – Classificação da Jurisdição Em princípio, não é de todo correto falar-se em uma classificação da Jurisdição, já que ela é uma função que reflete a soberania do Estado. A sua estratificação em classes tem uma finalidade essencialmente didática, para um melhor rendimento de seu estudo. Como primeiro critério, é possível distinguir a jurisdição em civil e penal, considerando seu objeto. A distinção encontra-se na existência, ou não, de sanção penal no preceito secundário das normas dentro das quais, cada qual está enquadrada. Considerando que a Constituição Federal (art. 92) estrutura os órgãos do Poder Judiciário de forma hierarquizada, é possível, por esse critério – hierarquia, identificar uma jurisdição superior e outra inferior. O princípio do duplo grau de jurisdição alberga essa diferenciação, sendo o exercício da função jurisdicional realizado, em regra, ao menos em dois graus de jurisdição, um inferior e outro superior. Vimos que a litigiosidade apresenta-se como uma das características da jurisdição. Contudo, situações excepcionais escolhidas pelo legislador por envolver bens ou interesses jurídicos de superior relevo social, acabam provocando a intervenção do Judiciário em relações jurídicas não litigiosas. Neste contexto, é lícito adotar como critério a existência de lide, para distinguir entre a jurisdição contenciosa e a jurisdição voluntária.

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O art. 1º, do CPC, faz essa distinção, ao dispor que: “A jurisdição civil, contenciosa ou voluntária, é exercida pelos juízes, em todo o território nacional, conforme as disposições que este Código estabelece”. Deste modo, apesar da inexistência de um conflito intersubjetivo, certas relações jurídicas devem ser conduzidas pelos juizes, conferindo-lhes juridicidade perante o ordenamento. É corriqueiro afirmar-se que a invocação da Jurisdição voluntária não corresponde ao exercício do direito de ação; que é movimentada por meio de procedimento que não chega a se constituir em processo; que não há partes, mas, interessados; e, que, tampouco, os pronunciamentos judiciais ficam acobertados pela eficácia da coisa julgada material. Pelo prisma dos órgãos que exercem a jurisdição, é possível distingui-la em especial ou comum, considerando as Justiças especializadas do Trabalho, Eleitoral e Militar, todas da União, estabelecidas na Constituição Federal (art. 93, IV, V e VI), e, as Justiças comuns da União (designada de Justiça Federal, conforme art. 106, da C.F.) e dos Estados, Distrito Federal e Territórios (art. 93, VII, da C.F.).

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5. – A Organização Judiciária Brasileira A Constituição Federal estabelece, de modo exauriente, em seu Capítulo III – Do Poder Judiciário, quais são órgãos judiciais brasileiros. No plano infraconstitucional, qualquer norma que trate de organização judiciária não pode descurar do modelo estruturado na Constituição Federal.11 O art. 92, reza: “Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário: I – o Supremo Tribunal Federal; I- A – o Conselho Nacional de Justiça; II – o Superior Tribunal de Justiça; III – os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais; IV – os Tribunais e Juízes do Trabalho; V – os Tribunais e Juízes Eleitorais; VI – os Tribunais e Juízes Militares; VII – os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios. omissis”

11

Cândido Rangel Dinamarco alude a um numero fechado de órgãos judiciários, Instituições de Direito Processual Civil, vol. I, p. 366.

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5.1. – O Supremo Tribunal Federal O Supremo Tribunal Federal é o órgão de cúpula do Poder Judiciário nacional, tendo sede na Capital Federal e competência para todo o território nacional (art. 92, §§ 1º e 2º, da C.F.) O STF é composto por 11 ministros, nomeados pelo Presidente da República, dentre cidadãos de idade entre 35 e 65 anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada (art. 101, da C.F.), após aprovação pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal (art. 101, p. u., da C.F.) O Supremo Tribunal Federal é o guardião da Constituição Federal (art. 102, da C.F.), possuindo competência jurisdicional divida em três ordens diversas, a saber: competência originária (art. 102, I, da C.F.); competência recursal ordinária (art. 102, II, da C.F.); e, competência recursal extraordinária (art. 102, III, da C.F.).12 São órgão jurisdicionais fracionários do Supremo Tribunal Federal: o Plenário, as Turmas (em número de duas), e, o Presidente, conforme previsão do art. 3º, de seu Regimento Interno.13

12

A EC nº 45/04 alterou a competência recursal extraordinária do STF, criando uma nova hipótese de cabimento do recurso extraordinário, ao acrescentar nova alínea ao inciso III, do art. 102, com a seguinte redação: “Art. 102 – III – d) julgar válida lei local contestada em face desta Constituição”. Sobre o tema, ver o nosso, As alterações das hipóteses de cabimento dos Recursos Extraordinário e Especial promovidas pela Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004, in, Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis (coord. Nelson Nery Jr. e Teresa Arruda Alvim Wambier), São Paulo: RT, 2006, vol. 10, p. 329-336. 13

Publicado no Diário Oficial da União, de 27.10.1980.

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5.2. – O Conselho Nacional de Justiça Criado

pela

Emenda

Constitucional



45,

de

08.12.2004, o Conselho Nacional de Justiça tem sede na Capital Federal (art. 92, § 1º, da C.F.) O CNJ é composto de 15 membros, com mais de 35 anos e menos de 66 anos, sendo um Ministro do Supremo Tribunal Federal, outro do Superior Tribunal de Justiça e outro do Tribunal Superior do Trabalho, cada qual indicado pelo respectivo Tribunal; um juiz estadual e um desembargador de Tribunal de Justiça, indicados pelo STF; um juiz federal e um juiz de Tribunal Regional Federal, indicados pelo STJ; um juiz do trabalho e um juiz do Tribunal Regional do Trabalho, indicados pelo TST; um membro do Ministério Público da União, indicado pelo Procurador Geral da República; um membro do Ministério Público estadual, indicado pelo Procurador Geral da República dentre os nomes indicados pelo órgão competente de cada instituição estadual; dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; dois cidadãos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, um indicado pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal (art. 103B, da C.F.). Todos os membros do CNJ são nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pela maioria absolta do Senado Federal (art. 103-B, §2º, da C.F.) O CNJ é presidido pelo Ministro do STF, que contará com voto de Minerva para desempate, estando excluído da distribuição de processos (art. 103-B, §1º, da C.F.)

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O CNJ tem competência administrativa e hierárquicacorreicional, cabendo-lhe “o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes” previstas nos incisos I a VII, do §4º, do art. 103-B, da C.F., além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura. Oficiarão perante o CNJ, o Procurador Geral da República e o Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (art. 103-B, §6º, da C.F.). Digna de destaque é a criação de “ouvidorias de justiça” pela União, inclusive no Distrito Federal e Territórios, para “receber reclamações e denúncias de qualquer interessado contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, ou contra seus serviços auxiliares” apresentadas diretamente ao CNJ (art. 103-B, §7º, da C.F.). O preceito revela a intenção do legislador de aproximar a Justiça dos jurisdicionados, criando um mecanismo de comunicação direta entre os últimos e o órgão máximo de controle funcional dos juízes e dos serviços auxiliares da Justiça.

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5.3. – O Superior Tribunal de Justiça O Superior Tribunal de Justiça é o órgão máximo e de superposição dentro da hierarquia das Justiças comuns da União, Estados, Distrito Federal e Territórios, tendo sede na Capital Federal e competência para todo o território nacional (art. 92, §§ 1º e 2º, da C.F.) O STJ é composto por, no mínimo, 33 ministros (o qual é o número de sua atual composição), nomeados pelo Presidente da Republica, dentre cidadãos de idade entre 35 e 65 anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, após aprovação pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal (art. 104, parágrafo único, da C.F.) Os Ministros do STJ compõe-se de 1/3 de juízes dos Tribunais Regionais Federais, 1/3 de desembargadores dos Tribunais de Justiça, indicados em lista tríplice elaborada pelo próprio Tribunal (art. 104, parágrafo único, I, da C.F.), e, 1/3, em partes iguais, dentre advogados e membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e Territórios, alternadamente, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes, reduzida à lista tríplice pelo Tribunal, para escolha e nomeação pelo Presidente da República (art. 104, parágrafo único, II, c.c. art. 94 e parágrafo único, da C.F.) De modo simétrico ao STF, o Superior Tribunal de Justiça possui competência jurisdicional divida em três ordens diversas, a saber: competência originária (art. 105, I, da C.F.); competência recursal

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ordinária (art. 105, II, da C.F.); e, competência recursal especial (art. 105, III, da C.F.).14 São órgão jurisdicionais fracionários do STJ: o Plenário, a Corte Especial, as Seções Especializadas, e, as Turmas Especializadas (art. 2º, I a III, do Regimento Interno do STJ).15 O Plenário do STJ é composto pela totalidade dos Ministros e a Corte Especial é composta por 22 Ministros (art. 2º, §§ 1º e 2º, do R.I. STJ). Há 3 Seções Especializadas, compostas por 2 Turmas Especializadas, que por sua vez são compostas de 5 Ministros. A 1ª Seção é integrada pelas 1ª e 2ª Turmas; a 2ª Seção é integrada pelas 3ª e 4ª Turmas; e a 3ª Seção é integrada pelas 5ª e 6ª Turmas (art. 2º, §§ 3º e 4º, do R.I. STJ). A competência das Seções é fixada pela matéria (art. 8º, do R.I. STJ). A 1ª Seção tem competência, primordial, sobre direito público, discriminada no art. 9º, §1º, do R.I. STJ. A 2ª Seção tem competência, preferencial, sobre direito privado, discriminada no art. 9º, §2º, do R.I. STJ. A 3ª Seção tem competência, prioritária, sobre direito penal, discriminada no art. 9º, §3º, do R.I. STJ.

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A EC nº 45/04 alterou a competência recursal especial do STJ, alterando uma das hipóteses de cabimento do recurso especial, ao dar nova redação à alínea ‘b’, do inciso III, do art. 105, que passou a ter a seguinte redação: “Art. 105 – III – b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal”. 15

Publicado no Diário da Justiça, de 7.07.1989.

18

Prevê-se ainda junto ao STJ, a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados, e o Conselho da Justiça Federal ao qual compete “exercer, na forma da lei, a supervisão administrativa e orçamentária da Justiça Federal de primeiro e segundo graus, como órgão central do sistema e com poderes correicionais, cujas decisões terão caráter vinculante” (art. 105, parágrafo único, da C.F., com a redação dada pela E.C. nº 45/04).

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5.4. – A Justiça do Trabalho São órgãos da Justiça do Trabalho: o Tribunal Superior do Trabalho, os Tribunais Regionais do Trabalho e os juízes do Trabalho (art. 111, da C.F.). A representação paritária de classe das categorias profissionais (trabalhadores) e categorias econômicas (empregadores) que, desde sua formação, compunham os juízos trabalhistas, deixaram de existir a partir da vigência da Emenda Constitucional nº 24, de 9.12.1999, alterando a redação dos arts. 111, 112, 113, 115 e 116, da Constituição Federal. A competência da Justiça do Trabalho é baseada no critério ratione materiae e vem estabelecida no art. 114, da C.F., a qual foi alargada pela E.C. nº 45/04, que criou onze incisos e deu nova redação aos §§ 2º e 3º do mencionado dispositivo. É oportuno apontar que somente a Justiça do Trabalho não tem competência penal.

5.4.1. – O Tribunal Superior do Trabalho O Tribunal Superior do Trabalho é o órgão máximo e de superposição da Justiça do Trabalho, tendo sede na Capital Federal e competência para todo o território nacional (art. 92, §§ 1º e 2º, da C.F.). O TST compõe-se de 27 ministros nomeados pelo Presidente da Republica, dentre cidadãos de idade entre 35 e 65 anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, após aprovação pela maioria

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absoluta dos membros do Senado Federal (art. 111-A, da C.F., conforme redação dada pela E.C. nº 45/04). Em sua composição, o TST observa a regra do “quinto constitucional” (art. 94, da C.F.), sendo que 1/5 de seus membros são escolhidos dentre advogados e membros do Ministério Público do Trabalho, com mais de 10 anos de efetiva atividade profissional na respectiva carreira, alternadamente, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes, reduzida à lista tríplice pelo Tribunal, para escolha e nomeação pelo Presidente da República (art. 111-A, I, c.c. art. 94 e parágrafo único, da C.F.). Os demais membros do TST são juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho, oriundos da magistratura de carreira, indicados pelo próprio TST (art. 111-A, II, da C.F.) O TST funciona por meio de órgãos jurisdicionais fracionários, compostos de cinco Turmas, de 5 ministros, cada uma (art. 699, da CLT); duas Seções Especializadas: uma, em dissídios coletivos (art. 2º, da Lei nº 7.701/88); outra, em dissídios individuais (art. 3º, da Lei nº 7.701/88); e, o Tribunal Pleno (art. 4º, da Lei nº 7.701/88). A competência do TST é estabelecida em lei (art. 111A, §1º, da C.F.). A Lei nº 7.701, de 21.12.88, que, revogando tacitamente o art. 702, da CLT, passou a disciplinar a matéria, estabelece que o TST, por seus órgãos fracionários, exercerá competência originária e recursal.16 16

Cf. Wilson de Souza Campos Batalha, Tratado de Direito Judiciário do Trabalho, V. I, p. 306; Eduardo Gabriel Saad, CLT Comentada, p. 472.

21

A competência do Tribunal Pleno do TST vem disciplinada no art. 4º, da Lei nº 7.701/88. À Seção de Dissídios Coletivos ou Seção Normativa compete processar e julgar, originariamente, as causas previstas no art. 2º, I, da Lei nº 7.701/88, e, os recursos e incidentes processuais estipulados no inciso II, do referido preceito legal. Por seu turno, compete à Seção de Dissídios Individuais processar e julgar, originariamente, as causas previstas no art. 3º, I, da Lei nº 7.701/88, e, os recursos e incidentes processuais estipulados nos incisos II e III, do referido preceito legal. Por último, a competência de cada Turma do TST está elencada no art. 5º, da Lei nº 7.701/88. Como órgão de cúspide da Justiça do Trabalho, o TST possui a última palavra sobre o direito infraconstitucional do trabalho. Entretanto, dentro das hipóteses constitucionais de cabimento e presentes os demais requisitos de admissibilidade, suas decisões poderão ser objeto de recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal. Prevê-se ainda junto ao TST, a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (art. 111-A, §2º, I, da C.F.), e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, ao qual competirá “exercer, na forma da lei, a supervisão administrativa, orçamentária, financeira e patrimonial da Justiça do Trabalho de primeiro e

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segundo graus, como órgão central do sistema cujas decisões terão efeito vinculante” (art. 111-A, §2º, II, da C.F.).

5.4.2. – Os Tribunais Regionais do Trabalho Os Tribunais Regionais do Trabalho compõem-se de, no mínimo, 7 juízes, recrutados preferencialmente na respectiva região, nomeados pelo Presidente da Republica, dentre cidadãos de idade entre 35 e 65 anos (art. 115, da C.F.). De modo simétrico à composição do TST, terão 1/5 de seus membros dentre advogados e membros do Ministério Público do Trabalho, com mais de 10 anos de efetiva atividade profissional na respectiva carreira, alternadamente, escolhidos na forma do art. 94, da C.F., e, os demais membros serão juízes do Trabalho, mediante promoção por antigüidade e merecimento, alternadamente (art. 115, I e II, da C.F.) A divisão judiciária do território brasileiro (por se tratar de uma Justiça da União) para Justiça do Trabalho é feita por regiões, sendo que em sua redação original, o art. 112, da C.F., previa a instalação de pelo menos um TRT em cada Estado. Por força de alteração de sua redação pela E.C. nº 45/04, já não consta mais do referido preceptivo tal exigência.17

17

Em virtude da alteração explicitada no texto, tornou-se possível, ao menos em tese, extinguir-se TRT’s que, em rigor, dado seu volume processual não justificava sua criação e instalação, conforme preleciona Manoel Antonio Teixeira Filho, A Justiça do Trabalho e a Emenda Constitucional nº 45/2004, pp. 21/2, in, Revista LTr, Ano 69, nº 01, jan/2005. Igualmente, Ives Gandra da Silva Martins Filho, A Reforma do Poder Judiciário e seus Desdobramentos na Justiça do Trabalho, p. 31, in, Revista LTr, Ano 69, nº 01, jan/2005.

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Os TRT’s poderão “funcionar descentralizadamente, constituindo Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à Justiça”, aproximando os Tribunais dos jurisdicionados e minimizando

custos

administrativos

e

operacionais

para

seus

funcionamentos (art. 115, §2º, da C.F., na redação da E.C. nº 45/04). O art. 678, da CLT, estabelece que os TRT’s que estiverem divididos em Turmas, terão como órgãos fracionários o Tribunal Pleno, com competência originária e recursal, jurisdicional e administrativa (inciso I), enquanto que às Turmas compete: a) julgar os recursos ordinários previstos no art. 895, alínea ‘a’; b) julgar os agravos de petição e de instrumento, estes de decisões denegatórias de recursos de sua alçada; e, c) impor multas e demais penalidades relativas a atos de sua competência jurisdicional, e julgar os recursos interpostos das decisões das Varas e dos Juízos de Direito que as impuserem (inciso II).

5.4.3. – Os Juízes do Trabalho Os juízos de 1º grau de jurisdição, na Justiça do Trabalho, compõem-se de órgãos monocráticos, desde a extinção da representação classista e, via de conseqüência, da supressão dos juízos colegiados das Juntas de Conciliação e Julgamento, promovida pela E.C. nº 24/99, como vimos acima. Deste modo, as Varas do Trabalho exercem sua competência por intermédio de um juiz do Trabalho (art. 116, da C.F.). A competência territorial das Varas do Trabalho segue a competência territorial estabelecida para as Justiças estaduais, que dividem 24

os territórios dos Estados em unidades básicas denominadas comarcas (art. 96, da Lei complementar federal nº 35, de 14.03.79 – “Lei Orgânica da Magistratura Nacional”). Assim, o art. 650, da CLT, dispõe que: “A jurisdição de cada Vara do Trabalho abrange o território da Comarca em que tem sede, só podendo se estendida ou restringida por lei federal”. E o principal elemento de determinação do órgão territorialmente competente é “a localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro”, como dispõe o art. 651, da CLT, ressalvada a hipótese do seu §3º, que admite foros correntes entre o do local da celebração do contrato de trabalho e o do local da prestação dos serviços, em favor do empregado. Entretanto, é comum encontrar diversas Varas do Trabalho reunidas dentro de uma mesma base territorial, assim como, é possível que uma Vara do Trabalho abranja extensão territorial de mais de uma comarca, como prevê o art. 650. Em comarcas não abrangidas por Vara do Trabalho, os juízes de direito exercerão a competência trabalhista, cabendo de sua decisões recursos para o TRT’s das respectivas regiões (art. 112, da C.F. – a redação que lhe foi atribuída pela E.C. nº 45/04 explicitou a competência recursal dos TRT’s, que, apesar da inexistência de regra explícita, sempre foi inferida pacificamente pela doutrina e jurisprudência especializadas).

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5.5. A Justiça Eleitoral São órgãos da Justiça Eleitoral: o Tribunal Superior Eleitoral, os Tribunais Regionais Eleitorais, os juízes Eleitorais e as Juntas Eleitorais (art. 118, da C.F.). O art. 121, da C.F. dispõe que lei complementar disciplinará a organização e a competência dos Tribunais, dos juízes de Direito e das Juntas Eleitorais. A principal fonte normativa infraconstitucional do direito eleitoral é o Código Eleitoral (Lei nº 4.737, 15.07.1965) e suas modificações posteriores, seguindo um critério ratione materiae para determinação de competência da Justiça Eleitoral. Cabe destacar que os juízes da Justiça Eleitoral, salvo motivo justificado, servirão obrigatoriamente por dois anos, e nunca por mais de dois biênios consecutivos (art. 121, da C.F., e, art. 14, do Código Eleitoral).

5.5.1. O Tribunal Superior Eleitoral O Tribunal Superior Eleitoral é o órgão máximo e de superposição da Justiça Eleitoral, tendo sede na Capital Federal e competência para todo o território nacional (art. 92, §§ 1º e 2º, da C.F.). O TSE compõe-se de, no mínimo, 7 ministros, sendo 5 escolhidos, mediante eleição, por voto secreto: 3 dentre Ministros do Supremo Tribunal Federal e 2 dentre Ministros do Superior Tribunal de 26

Justiça; e, os outros 2 são nomeados pelo Presidente da República, escolhidos dentre 6 advogados, de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Supremo Tribunal Federal (art. 119, da C.F.). O TSE possui competência originária e recursal (notadamente contra decisões dos TRE’s) estabelecidas, respectivamente, nos incisos I e II, do art. 22, do Código Eleitoral. As deliberações do TSE são decididas, ao menos por maioria absoluta, em sessões públicas, presente, ao menos, a maioria de seus membros (art. 19, do Código Eleitoral). As decisões do TSE são irrecorríveis, salvo as que contrariarem a Constituição Federal e as denegatórias de habeas corpus ou mandado de segurança (art. 121, §3º, da C.F.) O TSE é a última instância judiciária sobre matéria eleitoral infraconstitucional, razão pela qual incabível recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça. Contudo, presentes os requisitos constitucionais e legais de admissibilidade, das suas decisões será cabível recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal. O Procurador Geral da República exerce a função de Procurador Geral da Justiça Eleitoral perante o TSE (art. 18, do Código Eleitoral).

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5.5.2. Os Tribunais Regionais Eleitorais A Constituição Federal, em seu art. 120, determina a instalação e funcionamento de um Tribunal Regional Eleitoral na Capital de cada Estado e um no Distrito Federal. Os TRE’s são compostos de 7 juízes, sendo 4 escolhidos, mediante eleição, por voto secreto: 2 dentre desembargadores do Tribunal de Justiça e 2 dentre juízes de Direito, escolhidos pelo Tribunal de Justiça; 1 dentre juízes do Tribunal Regional Federal com sede na Capital do Estado ou no Distrito Federal, ou, não havendo, um juiz federal, em qualquer caso, escolhido pelo TRF respectivo; e, outros 2 são nomeados pelo Presidente da República, escolhidos dentre 6 advogados, de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Tribunal de Justiça (art. 120, da C.F.). Os TRE’s possuem competência originária e recursal (notadamente contra as decisões proferidas pelos juizes e juntas eleitorais) estabelecidas, respectivamente, nos incisos I e II, do art. 29, do Código Eleitoral. As decisões dos TRE’s são irrecorríveis (art. 121, §4º, da C.F.), salvo quando: I – forem proferidas contra disposição expressa da Constituição ou de lei; II – ocorrer divergência de interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais; III – versarem sobre inelegibilidade ou expedição de diplomas nas eleições federais ou estaduais;

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IV – anularem diplomas ou decretarem a perda de mandatos eletivos federais ou estaduais; V – denegarem habeas corpus, mandado de segurança, habeas data ou mandado de injunção.

5.5.3. Os Juízes e as Juntas Eleitorais Constituem-se de órgãos jurisdicionais de 1º grau de jurisdição na Justiça Eleitoral, os juízes de Direito exercentes da função de juízes eleitorais e as juntas eleitorais (art. 121, §1º, da C.F.; art. 32, do Código Eleitoral). Para a administração da Justiça Eleitoral, o território do Estado é divido em unidades básicas denominadas zonas eleitorais (art. 32, do Código Eleitoral). Os juízes eleitorais têm competência penal e civil e sobre matéria administrativa (art. 35, do Código Eleitoral). As juntas eleitorais são compostas de um juiz de direito, que é seu presidente, e de 2 a 4 quatro cidadãos de notória idoneidade (art. 36, do Código Eleitoral). A composição das juntas eleitorais revela dois aspectos incomuns nas demais Justiças e seus órgãos: trata-se de um colegiado em 1º grau de jurisdição, formando por juízes de direito e juízes leigos. As juntas eleitorais têm duração episódica e temporária, sendo que seus membros são nomeados 60 dias antes da eleição, depois de aprovação pelo presidente do Tribunal Regional Eleitoral (art. 36, §1º). 29

A competência das juntas eleitorais é voltada a temas administrativos das eleições, sendo-lhes vedada competência penal (art. 40, do Código Eleitoral).

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5.6. A Justiça Militar São órgãos da Justiça Militar: o Superior Tribunal Militar, os Tribunais e juízes Militares instituídos por lei (art. 122, da C.F.). A Lei de Organização Judiciária Militar da União (Lei nº 8.457, de 04.9.1992), estabelece como órgãos da Justiça Militar, a par do STM, as Auditorias de Correição, os Conselhos de Justiça, os JuízesAuditores e os Juízes-Auditores Substitutos (art. 1º). Compete à Justiça Militar processar e julgar os crimes militares definidos em lei (art. 124, da C.F.), o que revela um critério ratione materiae para determinação de sua competência. A competência da Justiça Militar é exclusivamente penal. Os crimes militares estão definidos no Código Penal Militar (Decreto-Lei nº 1001, de 21.10.1969), distinguindo os quais são passíveis de serem cometidos em tempo de paz (art. 9º), daqueles que são cometidos em tempo de guerra (art. 10). Na vigência do estado de guerra, o 2º grau de jurisdição da Justiça Militar é exercido pelos Conselhos Superiores da Justiça Militar, os quais são formados por dois oficiais-generais e um juiz-auditor, todos nomeados pelo Presidente da República (arts. 89 e 91, da LOJM)

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5.6.1. O Superior Tribunal Militar O Superior Tribunal Militar é o órgão de cúpula da Justiça Militar, tendo sede na Capital Federal e competência para todo o território nacional (art. 92, §§ 1º e 2º, da C.F.). O STM compõe-se de 15 ministros vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado Federal, sendo 3 oficiais-generais da Marinha, 3 oficiais-generais da Aeronáutica, 4 oficiais-generais do Exército, e 5 cinco civis (art. 123, da C.F.). Os Ministros civis serão escolhidos pelo Presidente da República, dentre brasileiros (natos ou naturalizados, conforme art. 12, §§ 2º e 3º, da C.F.), maiores de 35 anos, sendo 3 advogados, de notável saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, e, 2, por escolha paritária, dentre juízes auditores e membros do Ministério Público da Justiça Militar (art. 123, parágrafo único, da C.F.). O STM possui competência originária e recursal (notadamente contra decisões dos juízos de 1º grau) estabelecidas, respectivamente, nos incisos I e II, do art. 6º, da LOJM.

5.6.2. Os Juízos Militares de 1º grau de jurisdição Para efeito de administração da Justiça Militar em tempo de paz, o território nacional divide-se em doze Circunscrições Judiciárias Militares (art. 2º, da LOJM).

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Em regra, a cada Circunscrição Judiciária Militar corresponde uma Auditoria, possuindo competência para conhecer dos feitos relativos à Marinha, Exército e Aeronáutica (art. 11, da LOJM). Por sua vez, em cada Auditoria há um juiz-auditor (art. 15, da LOJM). O juiz-auditor e quatro juizes militares formam os Conselhos de Justiça (art. 16, da LOJM). Os Conselhos de Justiça são de duas espécies: a) Conselho Especial de Justiça, constituído pelo Juiz-Auditor e quatro Juízes militares, sob a presidência, dentre estes, de um oficial-general ou oficial superior, de posto mais elevado que o dos demais juízes, ou de maior antigüidade, no caso de igualdade; b) Conselho Permanente de Justiça, constituído pelo Juiz-Auditor, por um oficial superior, que será o presidente, e três oficiais de posto até capitão-tenente ou capitão (art. 16, da LOJM). Os Conselhos de Justiça funcionam na sede das Auditorias, salvo casos especiais por motivo relevante de ordem pública ou de interesse da Justiça e pelo tempo indispensável, mediante deliberação do Superior Tribunal Militar (art. 17, da LOJM). Compete aos juízes de direito do juízo militar processar e julgar, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de Justiça, sob a presidência de juiz de direito, processar e julgar os demais crimes militares (art. 125, §5º, da C.F., na redação de E.C. nº 45/02)

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A competência do juiz-auditor está disciplinada no art. 30, da LOJM, sendo que a função dos juízes militares nos Conselhos de Justiça é efêmera, cuja escolha é feita por sorteio (arts. 23, §1º, e 24, da LOJM). A norma legal deve obedecer a nova regra constitucional sobre a competência da justiça militar O ingresso na carreira da Magistratura da Justiça Militar dar-se-á no cargo de Juiz-Auditor Substituto, mediante concurso público de provas e títulos organizado e realizado pelo Superior Tribunal Militar, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil, em todas as suas fases (art. 33, da LOJM). Os juízes-auditores adquirem vitaliciedade após dois anos de exercício (art. 48, da LOJM; art. 22, II, ‘b’, da LOMAN). A Auditoria de Correição é “órgão de fiscalização e orientação judiciário-administrativa”, portanto, sem função jurisdicional, exercida pelo juiz-auditor corregedor, com competência sobre todo território nacional (arts. 12 a 14, LOJM).

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5.7. A Justiça Federal (justiça comum da União) São órgãos da Justiça Federal: os Tribunais Regionais Federais e os juízes federais (art. 106, da C.F.). O uso da expressão Justiça Federal, o qual é empregado pelo próprio legislador constituinte, não é muito exato, pois, são organizadas e mantidas pela União, outras três Justiças: do Trabalho, Eleitoral, e Militar. Considerando que as demais Justiças da União são especializadas, em virtude da matéria (ou seja, a relação de direito material controvertida) sobre a qual exercem sua competência, a denominada Justiça Federal é tratada como a justiça comum da União. Durante o Governo provisório, logo após a Proclamação da República em 1890, por força do Decreto 848, de 11 de outubro de 1890, a Justiça Federal foi organizada. A Constituição Republicana de 1891 previa a criação da Justiça Federal, ao dispor em seu art. 55: “Art. 55. O poder judiciário da União terá por órgãos um Supremo Tribunal Federal com sede na Capital da República e tantos juízes e tribunais federais distribuídos pelo país, quantos o Congresso criar”.18

18

Cf. Herculano de Freitas, Direito Constitucional, p. 399; Pontes de Miranda, Comentários à Constituição de 1967, Tomo IV, p. 200.

35

A Justiça Federal de primeiro grau foi extinta através do golpe de estado liderado por Getúlio Vargas e a Carta outorgada em 1937. A competência dos órgãos da Justiça Federal, em 1º e 2º graus está disciplinada na própria Constituição Federal (arts. 108 e 109).

5.7.1. Os Tribunais Regionais Federais Os Tribunais Regionais Federais compõem-se de, no mínimo, 7 juízes, recrutados preferencialmente na respectiva região, nomeados pelo Presidente da Republica, dentre cidadãos de idade entre 35 e 65 anos, sendo que um 1/5 de seus membros são escolhidos dentre advogados e membros do Ministério Público Federal, com mais de 10 anos de efetiva atividade profissional na respectiva carreira, alternadamente, escolhidos na forma do art. 94, da C.F., e, os demais membros serão juízes federais, com mais de 5 anos de exercício, mediante promoção por antigüidade e merecimento, alternadamente (art. 107, I e II, da C.F.) A divisão judiciária do território brasileiro (por se tratar de uma Justiça da União) para Justiça Federal é feita por regiões, sendo fixadas por lei sua sede e competência (art. 107, §1º, da C.F.). Por força do art. 27, §6º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, foram criados cinco TRF’s, cujas sedes e competências territoriais foram fixadas pela Resolução nº 01, de 06.10.1988, do extinto Tribunal Federal de Recursos, a saber: (i) TRF da 1ª região, com sede em Brasília e competência sobre o Distrito Federal e os Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Piauí, Rondônia, Roraima e Tocantins; 36

(ii) TRF da 2ª região, com sede no Rio de Janeiro e competência sobre os Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo; (iii) TRF da 3ª região, com sede em São Paulo e competência sobre os Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul; (iv) TRF da 4ª região, com sede em Porto Alegre e competência sobre os Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina; e, (v) TRF da 5ª região, com sede em Recife e competência sobre os Estados de Pernambuco, Alagoas, Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte e Sergipe. O TRF’s “instalarão a justiça itinerante, com realização de audiências e demais funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários” (art. 107, §2º, da C.F., na redação da E.C. nº 45/04). Os TRF’s poderão “funcionar descentralizadamente, constituindo Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à Justiça”, aproximando os Tribunais dos jurisdicionados e minimizando

custos

administrativos

e

operacionais

para

seus

funcionamentos (art. 107, §3º, da C.F., na redação da E.C. nº 45/04). Os TRF’s têm competência originária e recursal (especialmente, para julgar os recursos interpostos contra as decisões dos juízes federais e juízes estaduais no exercício da competência da Justiça Federal), respectivamente, conforme os incisos I e II, do art. 108, da C.F.

5.7.2. Os Juízes Federais Em 1º grau de jurisdição, a competência territorial dos órgãos jurisdicionais federais é constituída por seções judiciárias, uma no 37

Distrito Federal e uma em cada Estado federado, sendo sua sede a respectiva capital (art. 110, da C.F.; art. 5º, §1º, da LOMAN). Cada seção judiciária é composta por diversas varas federais, estando cada TRF, no âmbito de sua região e por ato próprio, autorizado a estabelecer a competência das Varas a serem criadas, bem como transferir-lhes a sede de um Município a outro, de acordo com a conveniência do Tribunal e a necessidade de agilização da prestação jurisdicional (art. 3º, da Lei nº 9.788, de 19.02.1999).19 É possível, portanto, dentro de uma seção judiciária, localizarem-se reunidas Varas Federais, especializadas ou não, em uma subseção judiciária, com sede e competência territorial determinada por ato do respectivo TRF. No âmbito do TRF da 3ª Região, o seu Conselho da Justiça Federal, por meio do Provimento nº 90, de 18.03.1994, dividiu a seção judiciária de São Paulo, inicialmente, em 12 subseções judiciárias.20 A competência dos juízes federais encontra-se em onze incisos, no art. 109, da C.F. O principal critério de sua estipulação é ratione personae, tendo em vista a participação na causa da União, entidade autárquica ou empresa pública federal, como se verifica do teor do inciso I, do art. 109:

19

A norma tem origem remota na Lei Orgânica da Justiça Federal – LOJF (Lei nº 5.010, de 30.05.1966), art. 12, que estipula: “Art. 12. Nas Seções Judiciárias em que houver mais de uma Vara, poderá o Conselho da Justiça Federal fixar-lhes sede em cidade diversa da Capital, especializar Varas e atribuir competência por natureza de feitos a determinados juízes”. 20

DJU de 25/03/94, p. 12.136, Caderno 1, Parte 1.

38

“Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I – as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho”. De acordo com informação colhida no site do TRF da 3ª Região, “a Justiça Federal de Primeira Instância - Seção Judiciária do Estado de São Paulo foi instalada em 4 de maio de 1967, inicialmente com sete Varas Federais”. Atualmente, há “134 Varas Federais em funcionamento (e outras 18 não instaladas, 9 Varas-Gabinete para os Juizados Especiais Federais), distribuídas em 32 Fóruns Federais, nas 28 Subseções Judiciárias, sendo a 1ª na Capital e as demais no interior do Estado. Em 14 de janeiro de 2002 foi implantado o Juizado Especial Federal Previdenciário”. É importante destacar, ainda, como órgãos da Justiça Federal de 1º grau, os juizados especiais que “são considerados órgãos da Justiça Ordinária, com competência para conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas de sua competência” (art. 98, §1º, da C.F.; c.c. art. 1º, da Lei nº 9.099, de 26.09.1995, c.c., art. 1º, da Lei nº 10.259/01). Pelo critério valor, as causas deverão ser de até 60 salários-mínimos (art. 3º, da Lei nº 10.259/01).

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5.8. As Justiças comuns dos Estados, Distrito Federal e Territórios São órgãos das Justiças comuns Estaduais, os Tribunais de Justiça e os juízes de direito (art. 92, VII, da C.F.). Os Tribunais de Alçada, nos Estados onde estes existiam (no Estado de São Paulo havia 3 Tribunais de Alçada: 2 civis e um criminal), foram extintos por força do art. 4º, da E.C. nº 45/04. Considerando que a Justiça Federal é, primacialmente, voltada a processar e julgar causas de interesse da União, ela guarda uma relação de especialidade com as Justiças estaduais. É valido afirmar-se que a competência da Justiça estadual é efetivamente residual dentro da organização judiciária brasileira, tanto ao se considerar a competência das Justiças especializadas, quanto a da Justiça comum da União.

5.8.1. Os Tribunais de Justiça Os Tribunais de Justiça têm sede na Capital do Estado e competência dentro dos limites territoriais do respectivo Estado (art. 16, da LOMAN). O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios tem sede na Capital Federal e competência fixada em lei (art. 19, da LOMAN). Os TJ’s são compostos de juízes de direito da carreira da Magistratura estadual, promovidos, alternadamente, por antigüidade e

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merecimento (art. 93, III, da C.F.; art. 87, da LOMAN), observada a regra do “quinto constitucional”, pela qual 1/5 de seus membros são escolhidos dentre advogados e membros do Ministério Público, com mais de 10 anos de efetiva atividade profissional na respectiva carreira, alternadamente, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes, reduzida à lista tríplice pelo Tribunal, para escolha e nomeação pelo Governador do Estado (art. 94 e parágrafo único, da C.F.). Os TJ’s possuem competência originária definida pela Constituição estadual (art. 125, §1º, 1ª parte, da C.F.) e recursal sobre as decisões proferidas pelos juízos de 1º grau. A Constituição do Estado de São Paulo estabelece em seu art. 74, a competência originária do Tribunal de Justiça. São órgãos fracionários dos Tribunais de Justiça, o Tribunal Pleno, as câmaras, que reunidas formam um grupo de câmaras, que por sua vez, podem ser reunidas em Seções Especializadas. É facultada a criação de um órgão especial, nos Tribunais com mais de 25 membros, o qual será formado com um mínimo de 11 e máximo 25 membros, para o exercício de atribuições administrativas e jurisdicionais delegadas do tribunal pleno, sendo metade das vagas por antigüidade e metade por eleição do tribunal pleno (art. 93, XI, da C.F., na redação da E.C. nº 45/04). No TJ de São Paulo, cada três câmaras formam um grupo de câmaras (art. 8º, da Lei complementar estadual nº 225, de 13.11.1979); reunidas por critério de competência material, em três Seções Especializadas: 1ª Seção de Direito Privado; 2ª Seção de Direito Público, e, 3ª Seção de Direito Criminal (art. 9º, da Lei comp. est. nº 225/79). 41

5.8.2. Os Juízes de Direito Para fins da administração da Justiça os territórios dos Estados são divididos em unidades judiciárias básicas designadas de comarcas. A comarca pode ser dividida em distritos, ou somar-se a uma ou mais, formando a circunscrição (art. 96, da LOMAN). O Código Judiciário do Estado de São Paulo estipula que a comarca compreenderá um ou mais municípios formando área contígua e denominação da respectiva sede (art. 9º, do Decreto-lei complementar nº 03, de 27.08.1979). A circunscrição judiciária é constituída de comarcas contíguas da mesma região, uma das quais é sua sede, cuja finalidade é a administração das designações dos juízes substitutos, não possuindo qualquer relevância para fins de competência territorial (arts. 8º e 20, do Dec.-lei comp. nº 03/79). O distrito é a menor unidade judiciária e terá denominação e limites correspondentes aos da divisão administrativa (art. 10, do Dec.-lei comp. nº 03/79). A criação, extinção e classificação das comarcas é feita segundo critérios que consideram a extensão territorial, o número de habitantes, o número de eleitores, a receita tributária e, o movimento forense (art. 97, da LOMAN). Seguindo os critérios estipulados na LOMAN, o Código Judiciário de São Paulo (CJESP – Decreto-lei Complementar nº 03, de 42

27.08.1969), classificava as comarcas do estado por entrâncias. Existiam quatro entrâncias, em grau crescente: 1ª, 2ª, 3ª, e, especial correspondente à comarca da Capital (art. 11 c.c. art. 13, do CJESP). A Lei Complementar Estadual nº 980, de 21.12.2005, veio alterar a classificação das comarcas do estado, que passaram a ser de três entrâncias: inicial, intermediária e final (art. 1º, da LC nº 980/05). Atualmente, há no estado de São Paulo, 27 comarcas de entrância final, incluindo a da Capital, 68 comarcas de entrância intermediária, e 253 comarcas de entrância inicial. Nestes números já estão computados os foros distritais. É importante destacar que a classificação das comarcas em entrâncias não implica em qualquer relação hierárquica entre elas. Uma comarca pode conter apenas um único órgão jurisdicional (um juízo) o qual exercerá competência cumulativa, ou seja, concernente a toda a competência da Justiça comum estadual, podendo incluir ainda, a eleitoral, se dentro de zona eleitoral; a trabalhista, nas hipóteses autorizadas pelo art. 112, da C.F.; e, a federal comum, como determinado pela norma do art. 109, §3º e do art. 15, I, da Lei nº 5.010, de 30.05.1966 – “Lei Orgânica da Justiça Federal – LOJF”. Entretanto, é mais comum que exista mais de um juízo dentro de cada comarca, de modo que haja uma distribuição entre eles das demandas.

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Amiúde, essa repartição dos litígios é realmente realizada por leis de organização judiciária, mediante a especialização das competências dos juízos e delimitação geográfica para seu exercício (por exemplo: varas cíveis e varas criminais, e, juízos centrais ou juízos regionais, dentro de uma mesma comarca). A E.C. nº 45/04 deu nova redação ao art. 126, da C.F., dispondo que os Tribunais de Justiça proporão a criação de varas especializadas, com competência exclusiva para questões agrárias derivadas de conflitos fundiários.

5.8.2.1. Os Juizados Especiais Nas Justiças dos Estados e, sob criação da União no Distrito Federal, são órgãos de 1º grau, os juizados especiais “providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes, para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo” (art. 98, I, da C.F.; art. 1º, da Lei nº 9.099, de 26.09.1995). Os juizados especiais têm natureza jurídica híbrida, posto que se constituem de órgãos especiais do Poder Judiciário, e ao mesmo tempo, de procedimento especial sumaríssimo.21 Dentro da competência legiferante concorrente da União, Estados e Distrito Federal, encontra-se a de legislar sobre criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas (art. 24, X, da 21

Cf. Nelson e Rosa Nery, ob. cit., p. 1.519.

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C.F.). Conforme os §§ 1º e 3º, do art. 24, da C.F., no exercício da competência concorrente, a União disporá sobre normas gerais, enquanto que Estados e Distrito Federal sobre normas especiais. São princípios fundamentais dos processos perante os juizados especiais: a oralidade, a simplicidade, a informalidade, a economia processual, a celeridade, e a busca da transação (art. 2º, Lei nº 9.099/95), admitindo-se ademais, o julgamento por equidade (art. 6º, Lei nº 9.099/95). Inicialmente, somente poderia ser autor perante os juizados especiais, pessoa natural, estando dispensada de advogado, em 1º grau, nas causas de até 20 salários-mínimos (arts. 8º, §1º e 9º, da Lei nº 9.099/95). Na Justiça Federal admite-se como autor: pessoas físicas, microempresários e empresas de pequeno porte (art. 6º, I, da Lei nº 10.259/01). Esta regra do Juizado Especial Federal foi implantada nos Juizados Estaduais, por força do art. 74, da Lei Complementar nº 123, de 14.12.2006 (Estatudo da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte). Os recursos são interpostos sempre por intermédio de advogado para uma Turma Recursal composta de 3 juízes de 1º grau de jurisdição (art. 41, §§1º e 2º, da Lei nº 9.099/95).

45

5.8.3. A Justiça Militar dos Estados A Constituição Federal ao estabelecer que os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios que nela se estabelecem, autoriza a criação por meio de lei estadual, proposta pelo Tribunal de Justiça, da Justiça Militar estadual (art. 125, caput e §1º, da C.F.). Em 1º grau de jurisdição, a Justiça Militar é constituída por juízes de direito e por Conselhos de Justiça e, em 2º grau, pelo próprio Tribunal de Justiça ou pelo Tribunal de Justiça Militar, autorizada sua criação quando o efetivo militar seja superior a vinte mil integrantes (art. 125, §3º, C.F.). A Constituição do Estado de São Paulo prevê entre os demais órgãos do Poder Judiciário, o Tribunal de Justiça Militar e as Auditorias Militares (art. 54, II e VI). O TJM com sede na capital do Estado e competência sobre todo o território estadual, compõe-se de 7 juízes, divididos em 2 câmaras, sendo quatro juízes militares, nomeados dentre coronéis da ativa, da Polícia Militar do Estado, e três juízes civis, sendo dois promovidos dentre os juizes auditores, e o terceiro nomeado na forma do Quinto Constitucional, alternadamente, dentre representantes do Ministério Público Estadual e dos Advogados, de notório saber jurídico e reputação ilibada, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes (art. 80, da C.E.S.P e art. 2º do Regimento Interno do TJM).

46

Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças (art. 125, §4º, da C.F., na redação de E.C. nº 45/02) Compete aos juízes de direito do juízo militar processar e julgar, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de Justiça, sob a presidência de juiz de direito, processar e julgar os demais crimes militares (art. 125, §5º, da C.F., na redação de E.C. nº 45/02) Verifica-se que a competência material da Justiça Militar dos Estados, é a mesma da Justiça Militar da União, todavia, ela é acrescida de outro critério para sua fixação, a condição das pessoas em litígio, uma vez que os militares dos Estados são os membros da Policias Militar e do Corpo de Bombeiros Militar (art. 42, da C.F.) A magistratura da Justiça Militar estadual é organizada em carreira, sendo que o ingresso do magistrado civil far-se-á no cargo de juiz auditor substituto (a E.C. nº 45/04 utiliza da locução ‘juiz de direito do juízo militar’), mediante concurso público de provas e de títulos, na forma e nas condições estabelecidas em lei, no Regimento Interno e no respectivo Regulamento (art. 178, do R.I.TJM).

47

5.8.4. A Justiça de Paz Ainda não se tem notícia de instalação em qualquer das unidades federadas, mas o art. 98, II, da C.F., prevê a “justiça de paz, remunerada, composta de cidadãos eleitos pelo voto direto, universal e secreto, com mandato de quatro anos e competência para, na forma da lei, celebrar casamentos, verificar de ofício ou em face de impugnação apresentada, o processo de habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional, além de outras previstas na legislação”. Os juízes de paz exercerão a função de juízes de casamento, não possuindo jurisdição, de sorte que, quaisquer litígios concernentes aos processos de habilitação de casamentos deverão ser remetidos à Justiça comum.

48

6. Competência 6.1. Conceito A jurisdição é una e abstrata, consistindo em uma das funções do Estado e que deriva de sua própria soberania. O volume de demandas e a extensão territorial do país exigem uma estruturação hierarquizada dos diversos órgãos judiciais, para que se possa prestar adequadamente o serviço jurisdicional. Se é correto que todo órgão jurisdicional exerce a única e mesma jurisdição, a medida em que cada um a exerce é diferente. Por isso, Liebman afirmou que a competência é a “medida da jurisdição” (misura della giurisdizione).22 As causas a que a cada órgão ou grupo de órgãos judiciais toca conhecer e julgar, consiste em sua competência. É nesse sentido que o art. 86, do CPC, preceitua que as causas cíveis serão processadas e julgadas pelos órgãos jurisdicionais, nos limites de sua competência. Competência é, portanto, a extensão da atividade de um dado órgão jurisdicional, estabelecida pela Lei.

22

Cf. Manuale di Diritto Processuale Civile, I, p. 107.

49

Arruda Alvim define competência como “a atribuição a um dado órgão do Poder Judiciário daquilo que lhe está afeto, em decorrência de sua atividade jurisdicional específica, dentro do Poder Judiciário, normalmente excluída a legitimidade, simultânea de qualquer outro órgão do mesmo poder (ou, a fortiori, de outro poder)”.23 Analisamos no capítulo anterior a organização judiciária brasileira, cabendo agora estudar quais os critérios determinativos de competência e as operações lógicas para a distribuição das ações entre os órgãos judiciais.

23

Manual de direito processual civil, vol. 1, p. 262.

50

6.2. Critérios para determinação da competência Um dos sistemas de determinação de competência considerado de maior aceitação é o atribuído à Adolf Wach24, difundido por Giuseppe Chiovenda25, contando com grande adesão no Brasil, tanto entre autores consagrados, quanto entre os mais recentes.26 O clássico sistema da tríplice divisão estabelece três critérios para determinação da competência: (i)

objetivo – pelo qual a competência é distribuída a diversos órgãos judiciais tendo em vista a natureza da causa, o seu valor e a condição das pessoas em litígio;

(ii)

territorial – consistente de diversos elementos que atribuem competência a um juízo ou grupo de juízos dentro de um certo território (relações das partes, do objeto litigioso ou de certos fatos com o território), considerando-se que, de ordinário, os atos processuais são realizados na sede do juízo (art. 176, do CPC), e cumpridos em atenção as ordens judiciais, dentro ou fora dos limites territoriais em que o juízo exerce sua competência, neste caso, por meio de ordem ou requisição de carta (arts. 86 e 200, do CPC); e,

24

Cf. James Goldschmidt, Derecho procesal civil, p. 163; Adolf Schönke, Derecho procesal civil, p. 132

25

Instituições de Direito Processual Civil, vol. II, pp. 213/6.

26

Cf. Moacyr Amaral Santos, Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, 1º v., p. 201; Arruda Alvim, Manual de direito processual civil, vol. 1, p. 262; Nelson e Rosa Nery, Código de Processo Civil Comentado, p. 471; Humberto Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, v. 1, p. 152; Luiz Fux, Curso de Direito Processual Civil; 85/99.

51

(iii)

funcional – “pelo qual se separam as atribuições dos diversos juízes num mesmo processo”.27 O sistema de Wach remonta à tríplice divisão dos

praxistas: em razão da matéria (ratione materiae), em razão das pessoas (ratione personae), e, em razão do lugar (ratione loci).28 Uma das mais contundentes críticas ao sistema da tríplice divisão da competência foi lançada por Carnelutti que asseverou que os critérios material e territorial estão reunidos dentro de um mesmo gênero, isolado do critério funcional. No Brasil, José Frederico Marques adotou o critério proposto por Carnelutti, pelo qual “a verdadeira diferença entre as formas de competência descansa na distribuição de trabalho do poder jurisdicional, segundo a função desenvolvida e segundo a matéria sobre a qual a função deve atuar”.29 Nessa linha, Carnelutti distinguia uma competência exterior, responsável por cuidar da divisão de atribuições jurisdicionais entre diversos órgãos, e uma competência interior, concernente a atribuições dentro de um órgão, relacionada com “problemas de substituição ou distribuição dos serviços entre os elementos e pessoas que o integram”.30 27

Cf. Moacyr Amaral Santos, Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, 1º v., p. 202/4. Esta é a lição da doutrina alemã, v. por todos, Jauernig, Direito processual civil, p. 79. 28

Idem, p. 201.

29

Instituições de Direito Processual Civil, vol. I, p. 328.

30

Cf. Frederico Marques, ob. cit., p. 330.

52

Ademais, dentro de sua complexidade, a teoria de Carnelutti adotava um sentido vertical da competência, considerando os diversos graus de jurisdição e diferentes órgãos neles existentes, designando essa competência hierárquica (funcional) e, uma perspectiva horizontal, apontando a possibilidade da existência de diversos órgãos de mesmo grau e mesma espécie, devendo distinguí-los “precisamente en razon del territorio, en el sentido de que a cada uno se le asigna uma porción territorial dentro de la que se halla su sede”, revelando uma competência territorial.31 Criticam a tríplice divisão, Cintra-Dinamarco-Grinover, afirmando que tal doutrina mistura critérios de determinação de competência com os próprios problemas a serem solucionados (v.g., território), além de tratar-se de um modelo criado para estruturas judiciárias diferentes da brasileira.32 Em verdade, são os elementos da demanda (partes, pedido e causa de pedir), muitas vezes utilizados de modo combinado, que propiciam a criação dos critérios determinativos da competência. Os referidos autores estabelecem quais os dados que podem ser obtidos de cada elemento da ação para determinação de um critério de competência:

31

Cf. Instituciones del nuevo proceso civil italiano, pp. 130 e 138. O esquema de distribuição de Carnelutti foi caracterizado como “de extrema complexidade e utilidade prática muito discutível”, por Cândido Rangel Dinamarco (Instituições..., v. 1, p. 415), que, todavia, utiliza-se de vários de seus elementos em sua bem elaborada doutrina. 32

Teoria geral do processo, pp. 235/6. Dinamarco acentua que o art. 102, do CPC, reúne valor e território, sendo esse um dos problemas a ser solucionado pelos critérios de determinação da competência; aponta que o art. 111, do CPC, reúne matéria e hierarquia, sendo que a 1ª é usada inclusive para determinar a competência hierárquica; alerta para o fato de que o sistema legal brasileiro não explicita a necessidade de conjugação de fatores para solução dos problemas (Instituições..., v. 1, pp. 439/441).

53

(i) partes: a sua qualidade ou a sua sede; (ii) pedido: a natureza do bem, o seu valor, e a sua situação; (iii) fatos e fundamentos jurídicos do pedido (causae petendi): a natureza da relação jurídica de direito material, o lugar em que se deu o fato do qual resulta a pretensão, e o lugar em que deveria ter sido cumprida espontaneamente a obrigação reclamada pelo demandante.33 A despeito das críticas existentes, o CPC distribui em três seções do Capítulo III (Livro-I, Título-IV) concernentes à Competência Interna, os critérios de determinação de competência: em razão do valor e da matéria (seção I), funcional (seção II), e, territorial (seção III), aproximando-se do esquema da tríplice repartição dos critérios de determinação de competência. Na sistematização, a lei não indica expressamente o uso do critério objetivo ratione personae, o qual, contudo, é usado, como elemento de determinação quando o CPC trata da competência territorial [v.g., foro do domicílio do réu (art. 94, do CPC), ou seja, a sede do sujeito passivo da lide]. Além disso, o critério ratione personae é adotado no plano constitucional (ex.: art. 109, I, da C.F.), e nas leis de organização judiciária (ex.: juízo privativo da Fazenda Pública, na comarca de São Paulo, arts. 35 e 36, do Código Judiciário, alterados pelo art. 17, da Lei nº 6.166, de 29.06.1988).

33

Teoria geral do processo, pp. 233/4.

54

6.2.1. Critério funcional O critério funcional tem ensejado muita divergência, especialmente, pelos diversos significados que a doutrina a ele tem atribuído.34 O art. 93, do CPC, afirma que as normas da Constituição Federal e de organização judiciária regem a competência funcional dos Tribunais, enquanto que a dos juízos de 1º grau está disciplinada no próprio CPC. Entretanto, nenhuma definição é apontada na lei. A doutrina costuma acolher o significado cunhado por Carnelutti, consistente de uma quádrupla divisão: (i) competência funcional por fases do processo; (ii) competência funcional por graus de jurisdição; (iii) competência funcional por objeto do juízo; e, (iv) competência funcional pela natureza do ato. Essa última espécie seria considerada subsidiária, mas, em verdade resumir-se-ia às outras três.35 Segundo Vicente Greco Filho: “Fala-se em competência funcional por fases do processo, ou também pela relação com outro processo, quando a competência de um juiz se determina porque existe, ou existiu, um outro processo, ou porque, numa etapa do procedimento, atuou

34

A doutrina alemã faz uso do critério funcional, mas, salienta a inexistência de sua previsão na ZPO, cf. Othmar Jauernig, Direito processual civil, p. 80. 35

Cf. Frederico Marques, Instituições de Direito Processual Civil, vol. I, pp. 343/4.

55

certo órgão jurisdicional que se torna competente para praticar outro ato previamente estabelecido”.36 Rigorosamente, há etapas do procedimento do processo que são realizadas pelo mesmo juiz, em virtude do art. 132, do CPC, que tem a finalidade de atender os princípios da oralidade, concentração e imediação do juízo, e não de determinação de competência. No processo civil, é difícil a identificação de qualquer exemplo da existência de pluralidade de juízes a funcionar num mesmo processo, em 1º grau de jurisdição (v.g., a existência de um juiz preparador e outro juiz julgador, exemplo que costuma ser apontado no julgamento pelo Tribunal do Júri).37 Costuma-se apontar a regra do art. 200, do CPC, que limita territorialmente a competência do juízo, para reconhecer a competência funcional do juízo deprecado, que age em cumprimento a requisições formuladas por meio de carta precatória.38 Com o processo híbrido criado para o cumprimento de sentença que reconhece obrigação de pagar quantia, pode-se falar em fases cognitiva e executiva, mantendo-se, de regra, a competência com o mesmo juízo (art. 475-P, II, do CPC, com a ressalva estabelecida em seu parágrafo único). 36

Direito processual civil brasileiro, 1º v., p. 173. No mesmo sentido, Humberto Theodoro Júnior, ob. cit., v. 1, pp. 158/9; e, Marcelo Abelha Rodrigues, Elementos de direito processual civil, v. 1, p. 197. 37

Dinamarco chama a atenção para o fato que mesmo demandas que se exercem em procedimentos especiais que se desdobram em mais de uma fase (ex.: monitório, prestação de contas), há apenas um juiz funcionando no processo (Instituições..., v. 1, p. 436). 38

Cf. Moacyr Amaral Santos, ob. cit., p. 244.

56

O mais comum, é a competência funcional derivada de relação anterior com outro processo, como ocorre com as ações acessórias ou ações de garantia (v.g., arts. 108 e 109, do CPC), provocando a prorrogação

legal

da

competência,

abstratamente

estipulada,

em

decorrência da prevenção do juízo, concretamente competente, por força de critério funcional. A sua ratio essendi é a existência de um único litígio ou a derivação de um único litígio que conduza ao conhecimento e execução em um único juízo. A competência funcional por grau de jurisdição é derivada do princípio do duplo grau de jurisdição e a possibilidade de revisão por órgãos superiores das decisões proferidas por órgãos inferiores. Há uma relação de verticalidade.39 É a conhecida competência recursal, que a lei designa de hierárquica (art. 111, do CPC). A competência originária dos Tribunais é, usualmente, considerada como funcional.40 Nesse ponto, a doutrina pátria acata a lição de Chiovenda que admite a competência funcional originária, inclusive para os órgãos de 1º grau de jurisdição. Chiovenda afirma que: “O critério funcional extrai-se da natureza especial e das exigências especiais das funções que se chama o magistrado a exercer num processo”, de sorte que deve se conferir 39

Cf. Moacyr Amaral Santos, ob. cit., p. 244/5.

40

Vicente Greco Filho, ob. cit., p. 173; Marcelo Abelha Rodrigues, ob. cit., p. 198.

57

competência funcional a um juiz de um dado território, em virtude dessas exigências, concorrendo o elemento funcional com o territorial.41 Dinamarco critica a afirmação de que toda competência originária dos Tribunais é funcional, exatamente porque define a competência funcional como “decorrente do prévio exercício da jurisdição por determinado órgão” (destacamos).42 A competência funcional por objeto do juízo ocorre “quando órgãos do mesmo grau de jurisdição devam decidir sobre partes ou aspectos da mesma “res in judicio deducta”, dando origem a uma decisão subjetivamente complexa”.43 São exemplos, os julgamentos dos incidentes, nos Tribunais, de uniformização de jurisprudência (art. 476 usque art. 479, do CPC) e de declaração de inconstitucionalidade de lei (art. 480 usque art. 482, do CPC).

41

Cf. Instituições de Direito Processual Civil, vol. II, p. 214. No mesmo sentido, Luiz Fux afirma tratarse de critério funcional de determinação de competência “a função a ser exercida no processo”, Curso de Direito Processual Civil, p. 97. 42

Ob. cit., p. 433 e 435.

43

Cf. Frederico Marques, ob. cit., p. 412.

58

6.3. Operações lógicas para concretização da competência Um grupo de órgãos jurisdicionais pode, em abstrato, ser competente para uma dada causa. A concretização do exercício da jurisdição, em um único juízo, ocorre a partir da propositura da demanda (art. 263, do CPC), gerando a perpetuatio iurisdictionis (art. 87, do CPC) e se fixando in statu assertionis44, ou seja, a partir do cotejo de seus elementos concretos e as regras legais, tornando o juízo prevento (arts. 219 e 106, do CPC). A perpetuatio iurisdictionis estabelece que, com a propositura da ação, um dado órgão judicial tornou-se competente, em concreto, para aquela demanda, sendo irrelevantes modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente à fixação naquele Nas operações para a concretização da competência do órgão jurisdicional, os diversos critérios podem ser utilizados concomitante ou sucessivamente. Não há um critério isolado que possa resolver todos os problemas nas várias fases necessárias para a fixação da competência de um dado juízo. Na concretização da competência de um órgão jurisdicional faz-se necessário solucionar algumas questões que partem da situação mais abstrata (competência do Judiciário nacional) até determinação do juízo competente. Passemos a analisar as diversas etapas.

44

Cf. Cândido Rangel Dinamarco, Instituições..., vol. I, pp. 421/2. Segue a mesma lição, Marcus Vinicius Rio Gonçalves, Novo curso de direito processual civil, vol. 1, p. 58.

59

1º) Competência em nível internacional - os órgãos do Poder Judiciário nacional são competentes para a causa? Os juízes brasileiros exercerão a jurisdição civil, contenciosa e voluntária, em todo o território nacional, nos limites de suas competências, conforme dispõem os arts. 1º e 86, do CPC. Essa proposição é imanente à soberania do Estado e à função (jurisdicional) por ele exercida. Denota-se que é norma de direito internacional, visando o respeito à soberania das nações, que os juízes de cada Estado exerçam a jurisdição dentro dos limites geográficos de seu território. O legislador brasileiro elencou, taxativamente, nos arts. 88 e 89, do CPC, inseridos no Capítulo II – Da Competência Internacional, do Título IV, do Livro I, as causas paras as quais a autoridade brasileira é competente. Em algumas hipóteses, a competência da autoridade brasileira é exclusiva, noutras, admite-se o exercício da jurisdição por autoridade judiciária estrangeira. Neste último caso, trata-se de possibilidade de cumulação ou concorrência de jurisdições, já que propriamente, não se trata de competência (limite da jurisdição), mas do exercício da função jurisdicional por mais de um Estado soberano. Assim, o art. 89, do CPC, determina competir, com exclusividade, aos juízes nacionais: a) conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil; b) proceder a inventário e partilha de bens,

60

situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja estrangeiro e tenha residido fora do território nacional. No tocante a concorrência de jurisdições, o art. 88, revogou o art. 12, e §1º, da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-lei nº4.657, de 04.09.1942- LICC), prevendo que é competente a autoridade brasileira (ao lado da estrangeira), quando: a) o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil45; b) no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação; e, c) a ação se originar de fato ocorrido ou de ato praticado no Brasil. A pessoa jurídica estrangeira que tiver agência, filial ou sucursal no Brasil é reputada aqui domiciliada para os fins da letra ‘a’ retro. O art. 90, do CPC, ao disciplinar a litispendência internacional, estipula que a ação intentada perante tribunal estrangeiro não induz litispendência, nem obsta a que a autoridade brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas. A decisão estrangeira para que possa produzir efeitos no Brasil deve ser reconhecida pelo Estado brasileiro, segundo nosso ordenamento jurídico. Deste modo ela deve ser homologada. Era da tradição brasileira a competência originária do Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, ‘h’, da C.F.) para homologação de sentença estrangeira. O art. 483, do CPC, disciplina no plano infraconstitucional que a sentença estrangeira somente teria eficácia no Brasil, após a homologação pelo STF, cujo procedimento remetia ao que 45

O art. 70, do CC, preceitua: “Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo”.

61

dispusesse o regimento interno daquele Tribunal (art. 483, p. único, do CPC). A E.C. nº 45/04, revogou o preceito constitucional aludido e acrescentou a alínea ‘i’, ao inciso I, do art. 105, da C.F., passando a competência para o procedimento de homologação de sentença estrangeira e a concessão de exequatur às cartas rogatórias ao Superior Tribunal de Justiça. O STJ deverá oportunamente disciplinar o respectivo processo, cabendo apontar que a alteração constitucional propiciará, em tese, um 2º grau de jurisdição, mediante a interposição de recurso extraordinário da decisão proferida pelo STJ. O art. 15, da LICC, exige os seguintes requisitos para a homologação da sentença estrangeira: a) haver sido proferida por juízo competente; b) terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificado a revelia; c) ter passado em julgado e estar revestida das formalidades necessárias para a execução no lugar em que foi proferida; d) estar traduzida por intérprete autorizado; e a última alínea ‘e’, que determinava a homologação pelo STF, deve ser lida, pelo STJ. Ademais, corrobora a norma o disposto no art. 17, da LICC, que estipula que não terão eficácia no Brasil, dentre outros atos, sentenças de outro país quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes. Homologada que seja a sentença estrangeira, deverá o juiz nacional, perante o qual tramita ação idêntica, reconhecer de ofício, ou mediante provocação, a objeção de coisa julgada e extinguir o processo sem julgamento de mérito, na forma do art. 267, V, do CPC. A 62

competência para execução de sentença estrangeira e do juízo federal de 1º grau de jurisdição, ou seja, de uma Vara Federal da Justiça Federal (art. 109, X, 3ª parte, da CF). Há que ser recordado que a competência da autoridade brasileira, exclusiva ou concorrente com a estrangeira, tema de direito processual, difere da regência de direito material para solução do conflito de interesses. O art. 337, do CPC, prevê hipótese de prova de direito (e não dos fatos, que comumente é o objeto das provas), quando a parte alegar direito estrangeiro, reconhecendo a possibilidade da aplicação de normas materiais estrangeiras pelo juiz brasileiro. A aplicabilidade de normas substanciais estrangeiras está regida pela LICC. 2º) Competência originária do Supremo Tribunal Federal – a causa ou questão é de competência originária do STF? A resposta exige o confronto da situação concreta com as alíneas ‘a’ a ‘r’, do inciso I, do art. 102, da C.F. Em sendo de competência originária do STF, o passo seguinte é verificar se o Regimento Interno do STF atribui ao Plenário, a órgão fracionário ou ao Presidente a competência para processamento e julgamento, restando exaurida a operação de verificação do órgão competente.46 3º) Competência de ‘Justiças’ – a causa ou questão é de competência de Justiça especializada ou de Justiça comum?

46

Ver item 5.1 sobre os órgãos fracionários em que se divide o STF.

63

Descartada a competência originária do Supremo Tribunal Federal, deve se levar em consideração o critério ratione materiae para determinação de uma das três denominadas ‘justiças’ ou ‘jurisdições’ especializadas contempladas na Constituição Federal. Assim se a relação de direito material subjacente ao litígio subsumir-se em qualquer um dos onze incisos do art. 114, da C.F., a demanda deverá ser proposta perante a Justiça do Trabalho. Por outro lado, ainda sob a égide do critério material, define-se a competência da Justiça Militar quando se tratar de processar e julgar os crimes militares definidos em lei (art. 124, da C.F.). Por último, em se tratando de causa ou questão envolvendo Direito eleitoral, na forma definida em lei complementar, conforme determina o comando do art. 121, da C.F., a competência será da Justiça Eleitoral. Não se subsumindo a ação, na competência de qualquer das três Justiças ‘especializadas’, de modo residual, a competência será da chamada Justiça comum. A Justiça comum da União, designada de Justiça Federal, guarda uma relação de especialidade em relação às Justiças comuns dos Estados e Distrito Federal. É a Constituição Federal, em seu art. 109, incisos I a XI, adotando primordialmente um critério ratione personae, que perfila, taxativamente, as causas que são de sua competência.

64

Se a demanda não for de qualquer das Justiças especializadas da União, tampouco da Justiça Federal, residualmente, competirá à Justiça dos Estados ou do Distrito Federal. A

competência

da

Justiça

comum federal

tem

prevalência sobre a Justiça comum dos Estados e Distrito Federal, impondo, inclusive, a deslocação de competência dessas para aquela, quando no curso do processo, há a intervenção da União, suas autarquias ou empresas públicas. A Constituição Federal de 1967 trazia em seu bojo regra específica nesse sentido, sendo a atual Constituição Federal omissa. Todavia, por se tratar de competência absoluta47, haverá o deslocamento. A dimensão do deslocamento da causa da Justiça dos Estados ou Distrito Federal para a Justiça Federal poderá, inclusive, provocar alteração de foro. 4º) Competência originária - a causa ou questão é de competência originária de Tribunais Superiores, Tribunais de 2º grau de jurisdição ou de Juízos de 1º grau de jurisdição? Tanto as Justiças ‘especializadas’, quanto as Justiças ‘comuns’ estão organizadas mediante uma estrutura hierárquica, possuindo na base os juízos de 1º grau de jurisdição, sobrepostos pelos Tribunais de 2º grau de jurisdição, e colimando com órgãos de superposição: os Tribunais Superiores. 47

Conferir item 7.1 sobre competência absoluta.

65

Nessa linha, dentro de cada uma das três Justiças ‘especializadas’, há que se perquirir se a causa ou questão é de competência originária dos Tribunais Superiores do Trabalho, Eleitoral ou Militar. A Constituição Federal (arts. 111-A, §1º; 121; e, 124, parágrafo único) remete ao direito infraconstitucional a atribuição de fixação de competência destes Tribunais.48 Negativa a resposta, passa-se a se indagar da competência originária dos Tribunais Regionais do Trabalho ou Eleitorais.49 A Justiça Militar esta organizada em dois graus de jurisdição, sendo que o 1º grau de jurisdição é exercido pelos juízos militares.50 Não se tratando de competência originária dos TRT’s ou TRE’s, remanesce a competência originária, em 1º grau de jurisdição, dos juízes do trabalho e dos juízes e juntas eleitorais. Na Justiça comum, temos como órgão de cúpula o Superior Tribunal de Justiça, cuja competência originária está prevista no art. 105, I, da C.F.

48

Conferir itens 5.4.1; 5.5.1; e, 5.6.1, respectivamente, para a competência do TST, TSE e STM.

49

Conferir itens 5.4.2 e 5.5.2, respectivamente, para a competência dos TRT’s e TSE’s.

50

Sobre a composição e competência dos juízos militares de 1º grau de jurisdição, conferir item 5.6.2.

66

Na Justiça Federal, a competência originária dos Tribunais Regionais Federais tem fonte constitucional, art. 108, I, da C.F. Não se tratando de competência originária do STJ ou dos TRF’s, a competência originária é dos juízes federais. Na Justiça dos Estados, a competência originária dos Tribunais de Justiça deve ser estabelecida pelas respectivas Constituições Estaduais (art. 125, §1º, 1ª parte, da C.F.). Em 1º grau de jurisdição, os juízes de direito têm competência originária. Analogicamente, aplica-se a norma constitucional aludida aos Estados que possuírem organizada Justiça Militar Estadual, contando com Tribunal de Justiça Militar, como autorizado pelo art. 125 §3º, da C.F.51 5º) Competência de foro – em qual a unidade judiciária básica que, segundo a divisão geográfica da respectiva Justiça (especializada ou comum), encontra-se o órgão que possui competência para processar e julgar a causa? Designa-se de foro a unidade judiciária básica em que se divide geograficamente o território para fins de administração da justiça.

51

Conferir item 5.8.3.

67

O art. 96, da LOMAN, dispõe: “Art. 96 Para a administração da justiça, a lei dividirá o território do Estado em comarcas, podendo agrupá-las em circunscrição e dividí-las em distritos”. Desse modo, a unidade judiciária básica para a Justiça dos Estados é designada de comarca. Logo, na Justiça dos Estados, o foro chama-se comarca. É por esse motivo que se diz que a competência de foro corresponde à competência territorial. Entretanto, como assevera Cândido Rangel Dinamarco, são diversos fatores de ligação que determinam que uma causa seja de competência de um foro.52 Ao se falar em competência territorial estamos determinando que uma demanda deve ser proposta dentro de uma unidade básica judiciária (foro). Todavia, para se obter o foro competente, variados elementos da ação são utilizados pelos arts. 94 usque 100, do CPC, reunidos na Seção III - Da Competência Territorial, dentro do Capítulo III – Da Competência Interna, do Título IV, do Livro I. O CPC usa a palavra comarca como sinônimo de foro, contudo, a comarca, como unidade judiciária básica, não é utilizada pelas demais ‘Justiças’.

52

Instituições..., vol. 1, pp. 485/7.

68

Na Justiça Federal, a delimitação territorial de competência (foro) dos órgãos jurisdicionais federais é constituída por seções judiciárias, uma no Distrito Federal e uma em cada Estado federado, sendo sua sede a respectiva capital (art. 110, da C.F.; art. 5º, §1º, da LOMAN). Para a administração da Justiça Eleitoral, o território do Estado é divido em unidades judiciárias básicas denominadas zonas eleitorais (art. 32, do Código Eleitoral). A Justiça Militar, em tempo de paz, divide o território nacional

divide-se

em

doze

circunscrições

judiciárias

militares,

correspondente ao foro militar (art. 2º, da LOJM). Somente a Justiça do Trabalho segue a unidade judiciária básica adotada pela Justiça dos Estados. Com efeito, o art. 650, da CLT, dispõe que: “A jurisdição de cada Vara do Trabalho abrange o território da Comarca em que tem sede, só podendo se estendida ou restringida por lei federal”. Por ser o termo foro usado como sinônimo de extensão territorial sobre a qual um órgão judiciário exerce sua competência, afirmase que o foro do STF, STJ e demais Tribunais Superiores é todo o território nacional. Nesse sentido, quando a C.F. divide o território nacional em regiões para fins de instituir TRF’s e TRT’s, o respectivo foro de cada um, será a região sobre a qual exercem jurisdição, ou seja, na qual tem competência. Na Justiça Eleitoral, o foro dos TRE’s corresponde ao 69

território do respectivo Estado da federação onde estiverem sediados (art. 120, da C.F.). O mesmo se dá com relação aos Tribunais de Justiça dos Estados, cujos foros são o território de sua unidade da Federação. Em face disso, a etapa de identificação da ‘Justiça’ competente, no processo de concretização da função jurisdicional, não corresponde a afirmar-se que é foro competente o dessa ou daquela Justiça. Foro, igualmente, não é sinônimo de fórum, prédio onde se localizam os órgãos judiciários, tampouco, juízo que tem sentido do próprio órgão jurisdicional, correntemente identificado com Vara, em 1º grau de jurisdição.53 A competência territorial é determinada sob uma perspectiva horizontal dos órgãos judiciários, apontando a sede da lide, consoante a lição de Carnelutti.54 Competência territorial no CPC Os elementos para determinação da competência de foro (territorial) estão disciplinados nas leis processuais, principalmente, no CPC, razão pela qual passaremos, abaixo, a analisar os dispositivos codificados. A lei estabelece um foro geral ou comum ao lado de outros foros privilegiados ou especiais. A determinação do foro comum se 53

Cf. Dinamarco, ob. cit., vol. 1, p. 451.

54

Instituciones del nuevo proceso civil italiano, p. 139.

70

dá por exclusão: se o caso concreto não estiver sujeito a qualquer dos foros especiais, incidirá a regra do foro geral. Ao lado dessa divisão entre foro geral ou foro privilegiado, ambas as espécies comportam uma divisão entre foro principal e foro subsidiário. Para a determinação do foro geral ou do foro especial, o legislador estipula uma regra principal e outra(s) subsidiária(s) para a hipótese de, numa dada situação concreta, não ser possível fixar a competência com base nos elementos do foro principal, seja, relativa ao foro comum ou aos foros especiais. Em certas situações, o legislador estabelece regras que propiciam o surgimento de foros concorrentes, onde a fixação da competência pode se dar perante mais de um foro abstratamente competente. A escolha de um dos foros igualmente competentes é do autor, contra ela não pode se insurgir o réu, e deriva de uma dupla incidência da norma (réus domiciliados em foros diferentes) ou da incidência de duas ou mais normas (acidente automobilístico), como leciona Dinamarco.55 (i) foro geral ou comum - domicílio réu (94) – ação fundada direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis é proposta no domicílio do réu.

55

Ob. cit., vol. 1, p. 490.

71

É importante relembrar que os elementos de ligação da causa ao foro para determinação da competência, são extraídos dos elementos da demanda concretamente proposta (in statu assertionis). E, muitas vezes, são vários elementos de ligação somados que propiciam a fixação da competência. Assim, o art. 94, do CPC, por exemplo, adota o elemento parte passiva da relação jurídica processual (domicílio do demandado) somado com a natureza da relação jurídica de direito material controvertida (direito pessoal ou direito real sobre bem móvel). É no direito material que se obterá o conceito de domicílio a ser aplicado no processo. A matéria está disciplinada nos arts. 70 a 78, do Título III – Do Domicílio, do Livro I, da Parte Geral, do Código Civil. O art. 70, do CC, conceitua: “Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo”. Esta é a regra geral, dispondo os arts. 71 e 73, sobre regras subsidiárias. O art. 72 criou o domicílio profissional da pessoa natural, quanto às relações concernentes à profissão, no(s) local(is) onde esta é exercida. O art. 75, trata do domicílio das pessoas jurídicas. O art. 76, do domicílio do incapaz, do servidor público, do militar, do marítimo e do preso. O art. 77, trata da citação no estrangeiro de agente diplomático do Brasil. E, o art. 78, dispõe sobre eleição de domicílio, em contratos escritos, para exercício e cumprimento de direitos e obrigações.

72

Havendo foro de eleição (art. 111, do CPC, e art. 78, do CC) esse concorrerá com o foro do domicílio do réu.56 (i.1) foros comuns subsidiários (94, §§ 1º a 4º) O §1º, do art. 94, do CPC, traz regra que rigorosamente não é de fixação de foro subsidiário, mas, de foros concorrentes, pois que tendo o réu mais de um domicílio, poderá ser, ao alvedrio do autor, demandado em qualquer um deles (de conteúdo semelhante é a norma do art. 71, do CC). O mesmo ocorre com relação ao §4º, do art. 94, do CPC, uma vez que havendo litisconsórcio passivo, onde os réus possuem domicílios em diferentes foros, o autor poderá optar por demandar no foro do domicílio de qualquer deles. O §2º, do art. 94, efetivamente traz norma subsidiária à do caput do dispositivo: sendo incerto ou desconhecido o domicílio do réu, ele será demandado onde for encontrado ou no foro do domicílio do autor. O §8º, do art. 7º, da LICC, dispõe que quando a pessoa não tiver domicílio, considera-se domiciliada no lugar de sua residência ou naquele que se encontre. E, o art. 73, do CC, considera domicílio, para a pessoa que não tem residência habitual, o lugar em que for encontrada. Há concorrência, a escolha do autor, em propor a ação em seu domicílio, ou no da residência ou localização do demandado.57 56

Cf.Arruda Alvim, Manual de direito processual civil, v. 1, 6ª ed., pp. 283/4.

73

O §3º, do art. 94, impõe uma sucessão de foros subsidiários. O autor poderá propor ação no foro de seu domicílio, desde que o réu não tenha domicílio, nem residência no Brasil. Em seguida, não tendo, igualmente, o autor domicílio ou residência no Brasil, a ação poderá ser proposta em qualquer foro. É o critério mais amplo previsto no CPC. Na hipótese das partes não terem domicílio ou residência no Brasil, é de verificar, preliminarmente, a competência internacional dos órgãos judiciários brasileiros, consoante as normas dos arts. 88 e 89, do CPC. Não se deve olvidar que, a despeito do CPC estipular como regra geral o domicílio do réu, a norma não está circunscrita exclusivamente ao processo de conhecimento. As normas concernentes à competência, incluindo-se aí, a territorial, aplica-se, igualmente, aos processos de execução e cautelar, observadas as normas especiais que a eles se destinem. (ii) foros especiais ou privilegiados (ii.1) foro da situação do imóvel (forum rei sitae) (95) – em regra, ação fundada em direito real sobre bem imóvel deve ser proposta no foro da situação da coisa. Os elementos de ligação da causa ao território são de duas ordens: ação fundada em direito real (natureza da relação jurídica de 57

Nesse sentido, Arruda Alvim, ob. cit., p. 260/1, Marcelo Abelha Rodrigues, ob. cit., v. 1, p. 192; contra, Dinamarco, aplica a regra da sucessividade de foros subsidiários do §3º ao §2º, do art. 94, ob. cit., p. 504.

74

direito material, extraída da causa de pedir) relativa a um bem imóvel (situação do objeto mediato do pedido). A ratio essendi da norma consiste em um melhor rendimento da atividade jurisdicional, dado que a proximidade do juízo ao objeto da demanda traz vantagens na realização de diligências e na colheita de provas. Considerando os elementos de ligação da causa ao foro, cabe perquirir, no plano do direito material o que se conceitua como bem imóvel e direitos reais.58 O art. 79, do CC, afirma que são bens imóveis o solo e tudo o quanto se lhe incorporar, natural ou artificialmente, e o art. 80, preceitua que se considera, para efeitos legais, imóveis: a) os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram; e, b) o direito à sucessão aberta. Considerando que os direitos reais estão sujeitos a regime jurídico fechado, vale dizer, estão fixados na lei em numerus clausus, somente lei federal poderá criá-los (art. 22, I, C.F.). O art. 1.225, do CC, estipula serem direitos reais: a) a propriedade; b) a superfície; c) as servidões; d) o usufruto; e) o uso; f) a habitação; g) o direito do promitente comprador de imóvel; h) o penhor; i) a hipoteca; e, j) a anticrese. Ocorre que o legislador no art. 95, do CPC, ao lado da regra do forum rei sitae, estabeleceu outra: a fixação do foro da situação do imóvel, mesmo em se tratando de ação real, poderá ser prorrogada mediante a escolha do autor entre foros concorrentes, do domicílio do réu 58

No mesmo sentido, Marcus Vinicius Rios Gonçalves, ob. cit., p. 65.

75

ou de eleição, quando a demanda não se referir a direito de propriedade, vizinhança, servidão, posse, divisão e demarcação de terras e nunciação de obra nova. Nesse

passo,

o

legislador

mistura

direito

real

(propriedade e servidão) com as demandas que a eles são pertinentes. No tocante à posse, é antiga e profunda a divergência sobre sua natureza, de fato ou direito, e em sendo direito, se real. Contudo, o legislador não elencou a posse como direito real, mas as ações possessórias, assim são consideradas, para fins de determinação da competência. Em suma, a ação deverá ser proposta no foro da situação do imóvel, quando se tratar de alguma das ações contidas no rol taxativo do art. 95, 2ª parte. Demais ações reais imobiliárias poderão ser propostas no foro do domicílio do réu ou no foro de eleição. Parcela da doutrina afirma que o critério utilizado é funcional59; outros são adeptos de um critério territorial-absoluto60. O problema que se nos afigura toca a possibilidade de dentro de um foro haver uma variedade de juízos, com competência territorial distinta. Assim, a aplicação do art. 95, do CPC, na Justiça dos Estados, indica a comarca competente que, contudo, pode abranger mais de

59

Arruda Alvim, ob. cit., p. 266; Nelson e Rosa Nery, ob. cit., p. 566.

60

Cândido Dinamarco, ob. cit., p. 518; Marcelo Abelha Rodrigues, ob. cit., pp. 200/1.

76

um município, contendo um deles, por exemplo, vara distrital em cujo território esteja localizado o imóvel. De modo semelhante, na Justiça Federal, pela mencionada regra, obtém-se a seção judiciária competente. Todavia, é possível que esta esteja dividida em vários grupos de juízos, as subseções (art. 12, Lei nº 5.010/66; art. 4º, Lei nº 9.788/99), sendo que o imóvel esteja situado dentro do território de uma delas. Nessas hipóteses, a determinação da competência não se resume, pela aplicação do art. 95, do CPC, em identificar o foro competente, mas exige a determinação do juízo competente, utilizando-se do mesmo preceito legal. Ora, ultrapassada a análise da competência territorial ou de foro, o problema passa a ser de determinação do juízo competente, mediante o critério funcional de competência originária de Chiovenda, para o qual a causa deve ser atribuída a um juízo de um dado território, em virtude de ser este o que melhor pode desempenhar suas funções no processo. Arruda Alvim assevera que a competência de juízo é uma competência de atribuição61, sendo certo que a doutrina majoritária aponta que a competência de juízo é absoluta.62 61

Ob. cit., p. 296 e 300.

62

Cf. Vicente Greco Filho, ob. cit., p. 206; Arruda Alvim, ob. cit., pp. 297/303; Marcus Vinicius Rios Gonçalves, ob. cit., p. 73; Nelson e Rosa Nery, ob. cit., p. 588. Dinamarco afirma tratar-se de competência de foro e, portanto, relativa, quando a competência de juízo for estabelecida por critério territorial e não por critério de matéria, valor ou qualidade das partes (ob. cit., p. 644). Parece-nos que há dois pesos e duas medidas, já que valor é critério que pode gerar incompetência relativa e não absoluta (art. 111), contudo, é considerado como de competência absoluta pelo ilustre Professor.

77

Com efeito, a eleição de foro estatuída no art. 111, do CPC, autoriza as partes a derrogarem, por manifestação de vontade, o foro abstratamente competente, norma que não alcança o juízo competente, estando as partes proibidas de eleger juízo perante o qual a demanda pode ser ajuizada. Estando o imóvel situado no território de mais de um foro, de mesmo Estado ou de Estados diversos, a competência é fixada por regra de prevenção, aplicando-se o preceito do art. 219, do CPC. (ii.2) foro do domicílio do autor da herança (forum hereditatis) – (96) – competente para inventário, partilha, arrecadação, cumprimento de disposições de última vontade e ações em que o espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro. A prova do domicílio do de cujus se faz por meio da certidão de óbito. Os incisos I e II, do parágrafo único, do art. 96, do CPC, indicam foros subsidiários e sucessivos do foro principal estipulado na cabeça do artigo. Assim, havendo bens em apenas um foro e sendo que o autor da herança não possuía domicílio certo, o foro competente é o da situação daqueles. Entretanto, havendo pluralidade de bens em foros diferentes e sendo que o de cujus não possuía domicilio certo, o foro competente será o do local do óbito.

78

Havendo bens no Brasil, a competência internacional do juiz brasileiro para inventariar e partilhar tais bens é exclusiva, pouco importando que o de cujus fosse estrangeiro e nunca tivesse residido no Brasil (art. 89, II, do CPC). Nessa hipótese, haverá foros concorrentes quando, houverem bens em foros distintos, sendo qualquer deles abstratamente competente (arts. 96, I e 89, II, do CPC). Havendo dois inventários pendentes, a solução se dará por regra de prevenção do art. 219, ou se perante juízos com mesma competência territorial, pela regra do art. 106. As ações em que o espólio for demandante não estão sujeitas ao forum hereditatis, devendo seguir as regras de competência territorial aplicáveis à espécie. (ii.3) foro do último domicílio do ausente – (97) – competente para ações em que for réu e, para arrecadação, inventário, partilha, cumprimento de disposições testamentárias. Em verdade trata-se de regra legal para definir o domicílio do ausente. (ii.4) foro do representante legal do incapaz – (98) – efetivamente, não se trata de foro especial em face de foro geral, mas, apenas regra indicando seu domicílio e, portanto, o foro onde deverá ser demando. Tem mesmo conteúdo a norma do art. 76, do CC.

79

(ii.5) foro necessário do servidor público, do militar, do marítimo e do preso – (art. 76, do CC) Igualmente, não se trata de foro especial em face de foro geral, mas, apenas regra indicando seu domicílio e, portanto, o foro onde deverá ser demando. Destarte, é considerado domicílio do servidor público, o lugar em que exercer permanentemente suas funções; o do militar, onde servir, e, sendo da Marinha ou da Aeronáutica, a sede do comando a que se encontrar imediatamente subordinado; o do marítimo, onde o navio estiver matriculado; e o do preso, o lugar em que cumprir a sentença. (ii.5) foro nas causas em que for parte a União - (art. 99, do CPC, revogado pelo art. 109, §§1º e 2º, C.F.) A União, como autora, demandará no foro da seção judiciária onde o réu tiver domicílio (art. 109, §1º, da C.F.). A Constituição Federal seguiu a regra comum ou geral do domicílio do réu, constante do art. 94, do CPC. Trata-se de regra de competência relativa.63 Quando ré, a União deverá ser acionada na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela em que houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou ainda, no Distrito Federal (art. 109, §2º).

63

Cf. Luiz Fux, ob. cit., p. 93.

80

Parece-nos que o legislador constitucional quis criar regras análogas à existentes no CPC para determinação da competência territorial quando a União for ré. Nessa linha, é lícito afirmar ser válida a norma do forum rei sitae, em se tratando de ação real imobiliária prevista no art. 95, do CPC, devendo a demanda ser proposta na seção judiciária perante o juízo federal competente da situação do imóvel.64 Em nossa opinião, as regras de competência dos §§1º e 2º, do art. 109, da C.F., devem ser estendidas às autarquias, empresas públicas e fundações federais. Não se aplicam às sociedades de economia mista, que têm regime jurídico de direito privado e capitais públicos e privados, não possuindo prerrogativa para demandas na Justiça Federal (Súmula nº 508, do STF). Tratando-se de demandas entre segurados e o INSS, a competência é fixada pelo foro do domicílio do segurado, perante a Justiça Federal, ou em não havendo juízo federal na comarca, perante o juiz de direito da Justiça Estadual (art. 109, §3º, da C.F.). A norma aplica-se ainda às execuções fiscais propostas pela União (art. 109, §3º, parte final, da C.F. e art. 15, I, LOJF). (ii.6) foro nas ações de separação judicial, divórcio direto ou por conversão e nulidade ou anulação de casamento - (100, I) 64

Nesse sentido, Luiz Fux, ob. cit., pp. 93/4; Cândido Rangel Dinamarco, ob. cit., pp. 509/510; Marcus Vinicius Rios Gonçalves, ob. cit., p. 71. Parece ter entendimento distinto Arruda Alvim, ao afirmar que “não prevalece para ela [União] a regra do art. 95, se a aplicação desta importar em infração à Constituição” (ob. cit., pp. 295/6).

81

A lei leva em consideração a natureza da relação jurídica de direito material e a sede da mulher, para determinar que a ação seja proposta na residência da mulher. Propositadamente, a norma estipula a ‘residência’ e não ‘domicílio’, porque este é o mesmo para marido e mulher, fixado de comum acordo (art. 1.569, do CC). Por se tratar de incompetência relativa fixada em favor da mulher, essa poderá renunciá-lo, mediante prorrogação voluntária, mas o marido, em sendo autor, deverá obedecer o preceito. Mesmo após a Constituição Federal de 1988, a jurisprudência, bem como, a doutrina não tem reputado o dispositivo inconstitucional.65 Há corrente restritiva negando a aplicação da norma ao divórcio direto, o que se nos afigura equivocada. Igualmente, há divergência jurisprudencial em relação à união estável. A ausência, por parte do marido, de qualquer informação sobre a residência da mulher autoriza a aplicação do art. 94, §3º, para propositura em seu domicílio da ação. (ii.7) foro do alimentando – domicílio ou residência nas ações de alimentos - (100, II) 65

Cf. Nelson e Rosa Nery, ob. cit., p. 499.

82

Para ações revisionais de alimentos, o critério determinativo de competência é funcional, razão pela qual deverá ser proposto perante o mesmo foro e juízo que conheceu e decidiu anteriormente ação em que se pleiteou alimentos. Em se cumulando pedido de alimentos com investigação de paternidade, incide a norma do art. 100, II, do CPC, consoante entendimento cristalizado na Súmula nº 1, do STJ. (ii.8) foro do domicílio do devedor – ação para anulação e substituição de títulos extraviados ou destruídos - (100, III) O CPC estabelece procedimento especial para ações cuja pretensão seja a anulação e substituição de títulos ao portador (arts. 907, II e 908). Em se tratando de ação reivindicatória do título da pessoa que o detiver, o procedimento é comum (art. 907, I). Ação é proposta no foro do domicílio do devedor e não do portador que é réu e será citado. (ii.9) foro das pessoas jurídicas e das sociedades sem personalidade jurídica - (100, IV, ‘a’ a ‘c’) O art. 75, IV e §1º, do CC, estipula que o domicílio das pessoas jurídicas é o lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e administrações, ou onde elegerem domicílio especial no seu estatuto ou atos constitutivos, ou, tendo diversos estabelecimentos em

83

lugares diferentes, cada um deles será considerado domicílio para os atos nele praticados. Por seu turno, o art. 45, do CC, norma geral aplicável a todas pessoas jurídicas de direito privado, estipula que sua existência começa com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro. E, o art. 46, I, do CC, determina que do referido registro constará a sede da pessoa jurídica. Por força da alínea ‘a’, do art. 100, IV, do CPC, a pessoa jurídica deve ser demandada no lugar onde está sua sede que, como vimos, pode não corresponder ao seu domicílio. A alínea ‘b’, do art. 100, IV, do CPC, admite que a ação movida em face de pessoa jurídica que possua diversos domicílios, resultando da pluralidade de estabelecimentos, na forma do art. 75, §1º, do CC, que o CPC trata como existência de agência ou sucursal, seja proposta no foro de tal estabelecimento no tocante às obrigações que com ele foram contraídas. O art. 12, do CPC, confere capacidade judiciária para diversos

entes

despersonalizados,

inclusive,

às

sociedades

sem

personalidade jurídica, as quais deveram ser demandadas no foro do lugar onde exercem sua atividade principal (art. 100, IV, ‘c’, do CPC) (ii.10) foro do lugar de cumprimento da obrigação (forum destinatae solutionis) - (100, IV, ‘d’)

84

Foro privilegiado que visa o cumprimento da obrigação, por exemplo, execução de títulos cambiários, com praça de pagamento diversa do domicílio do devedor; cumprimento específico de prestações etc. Se o que se pretende, contudo, não é a satisfação do direito inadimplido, mas o direito dele derivado (v.g.,rescisão contratual), segue a regra do foro geral.66 As obrigações quesíveis cumprem-se no domicílio do devedor, enquanto, as portáveis no domicílio do credor. Necessário analisar a lei ou o título jurídico em que se embasam. (ii.11) foro do lugar do ato ou fato danoso (forum delicti commissi) - (100, V) As ações de reparação de danos devem ser propostas no foro do lugar onde foi praticado o ato ou o fato causador do dano (art. 100, V, ‘a’, do CPC). Ato é derivado de conduta humana, enquanto, fato corresponde a qualquer acontecimento capaz de produzir efeitos jurídicos. Dinamarco dá exemplo de ato negligente de manutenção de entorno de montanha que, desabando por chuva (fato jurídico), causa prejuízos aos moradores circunvizinhos. O preceito abrange tutela especifica de fazer, derivada de ato ou fato ilícito.

66

Cf. Dinamarco, ob. cit., p. 525; Nelson e Rosa Nery, ob. cit., p. 500.

85

Trata-se de ilícito civil, não se referindo a ilícitos penais. Em se tratando de ilícito penal incide a regra do p. único do art. 100, V, do CPC.67 Há divergência sobre incidir a norma somente se o ilícito é extracontratual ou contratual.68 Em se tratando de ação de reparação de delito ou acidente automobilístico, o autor tem a sua disposição foros concorrentes: de seu domicílio ou do local do fato (art. 100, V, parágrafo único). Na ação de indenização fundada em relação de consumo, o foro competente é o do consumidor (art. 101, I, da Lei nº 8.078, 11.09.1990, “Código de Defesa do Consumidor” – CDC). O STJ já decidiu que a seguradora, sub-rogada nos direitos do segurado, não pode se valer do foro privilegiado do inciso V, do art. 100, do CPC, devendo propor ação no foro geral do domicílio do réu (Resp. nº 35.500 e Resp. nº 19.767). Em acréscimo, devem ser propostas no foro do lugar do ato ou fato, a ação em que for réu o administrador ou gestor de negócios, concernente

à

atividade

por

ele

desempenhada

(forum

gestae

administrationis - art. 100, V, ‘b’, do CPC).

67

Cf. Ernane Fidélis dos Santos, Manual de direito processual civil, v. 1, pp. 153/4; Dinamarco, ob. cit., p. 529; Marcus Vinicius Rios Gonçalves, ob. cit., p. 69. Entretanto, o STJ já decidiu que o ilícito pode ser tanto penal, quanto civil, REsp nº 49.251-RJ, 3ª T., v.u., rel. p. ac. Min. Costa Leite. Arruda Alvim entende tratar-se de ilícito civil, que pode constituir ilícito penal, ob. cit., p. 310. 68

Nelson e Rosa Nery afirmam somente caber de ilícito extracontratual, para o contratual, incide o art. 100, IV, d (ob. cit., p. 500). Luiz Fux (ob. cit., p. 96) e Dinamarco, aceitam ambos (ob. cit., p. 527).

86

(ii.12) foro dos Estados federados e Municípios Não há regra especial, em lei federal, criando foro privilegiado ou especial para os Estados federados e Municípios. Deste modo, aplicam-se-lhes as regras de competência territorial previstas no CPC, notadamente, a do art. 94, do CPC, determinando que ações em que forem rés sejam proposta no foro de seus domicílios. A norma substancial explicita qual o domicílio de Estados e Municípios: “Art. 75. Quanto às pessoas jurídicas, o domicílio é: I - da União, o Distrito Federal; II - dos Estados e Territórios, as respectivas capitais; III - do Município, o lugar onde funcione a administração municipal; IV – omissis”. Comumente, as leis estaduais de organização judiciária estabelecem juízos privativos para as Fazendas Públicas Estaduais e Municipais. No Estado de São Paulo, o Código Judiciário havia criado, na comarca de São Paulo, varas especializadas da Fazenda do Estado e da Fazenda Municipal (arts. 27, II, ‘b ‘e ‘c’, respectivamente), tendo sido reunidas sob a denominação de Varas da Fazenda Pública, pelo art. 17, da Lei Estadual nº 6.166, de 29.06.1988. 87

Isto, contudo, não provoca qualquer deslocamento de foro, quando em dada comarca inexistir vara especializada. Somente quando as regras de competência territorial determinarem que a demanda deva ser proposta no foro da Capital, é que as Fazendas Públicas gozarão da prerrogativa de verem tais ações processadas e julgadas em juízos privativos. (ii.13) foro de eleição - (111) Em se tratando de negócio jurídico, celebrado por escrito, podem as partes inserir cláusula expressa elegendo foro onde serão propostas ações relativas aos direitos e obrigações daquele derivadas. Trata-se da eleição de foro (art. 111, 2ª parte, do CPC). Foro de eleição não significa foro contratual, o qual não é acolhido pelo legislador brasileiro. O §2º, do art. 111, contém uma impropriedade terminológica, pois, refere-se ao foro de eleição, o qual obriga os sucessores inter vivos ou causa mortis dos contratantes. Rigorosamente foro do contrato é o local de sua celebração. A eleição de foro somente é admitida quando o critério de determinação de competência for relativo. Quando a concretização da competência do órgão judicial for estabelecida por critério absoluto, resulta inaplicável a regra.

88

A lei autoriza a eleição de foro, contudo, é vedada a eleição de juízo. (ii.14) foro competente perante os Juizados Especiais Cíveis Estaduais A determinação da competência do Juizado Especial Cível Estadual tem como principal elemento tratar-se de causa de menor complexidade (art. 98, I, da C.F., e art. 3º, da Lei Federal nº 9.099, de 26.09.1995 – Lei dos Juizados Especiais Estaduais). Entretanto, a lei adota vários elementos de ligação da causa ao juízo, adotando critérios objetivos (art. 3º, I a IV, e, §2º, da Lei nº 9.099/95): a) valor - limite de 40 salários-mínimos; na Justiça Federal é elevado para para 60 salários-mínimos; b) matéria - todas as previstas no art. 275, II, do CPC, estas sem limite de valor, acrescidas de ação de despejo para uso próprio e ações possessórias sobre bens imóveis dentro do limite de valor legal; e, c) rol taxativo de matérias excluídas - causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, acidentes de trabalho, resíduos, e relativas ao estados e capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial.69 E critério territorial, consoante o art. 4º, da Lei nº 9.099/95, pelo que é competente o juizado do foro: a) do domicílio do réu ou do lugar em que o réu exerça atividades profissionais ou econômicas, ou, mantenha estabelecimento, filial, agência, 69

Conferir sobre os critérios de determinação de competência item 6.2.

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ou sucursal ou escritório (de modo concorrente e com preferência sobre os demais, por escolha do autor); b) do lugar onde a obrigação deva ser satisfeita; c) do domicílio do autor ou do local do ato ou fato, nas ações de reparação de danos de qualquer natureza. Para fixação do juízo competente é necessário a utilização de todos os critérios acima descritos. 6º) Competência de juízo – perante qual órgão jurisdicional deve ser processada e julgada a causa? Determinado o foro competente é necessário verificar-se qual o juízo competente. Normalmente, dentro de um foro há diversos juízos, sendo que usualmente, são tratados por varas. A palavra juízo corresponde a órgão jurisdicional, de modo que, um Tribunal é considerado como juízo. Entretanto, a competência originária de órgão jurisdicional de 2º grau ou de Tribunais superiores já foi tratada acima. No presente item, interessa os juízos de 1º grau de jurisdição. O art. 96, II, ‘d’, da C.F., outorga ao STF, Tribunais superiores e Tribunais de Justiça a iniciativa de propor ao Poder Legislativo correspondente lei para “alteração da organização e da divisão judiciárias”. Desse modo, são, principalmente, as leis de organização judiciária que disciplinam a atribuição de competência dos órgãos jurisdicionais no âmbito interno dos Tribunais e dos foros. O art. 93, do 90

CPC, assevera que no CPC está disciplinada a competência funcional dos juízes de primeiro grau de jurisdição. Arruda Alvim leciona que: “A determinação da competência dos juízos decorre, do ponto de vista material, da definição dos poderes do juízo pelas leis de organização judiciária: é competência de atribuições (funcional e material) e, portanto, de caráter absoluto”.70 Assim é possível, todavia, remoto, que numa comarca haja apenas um juízo, o qual exercerá toda a competência originária pertinente à Justiça dos Estados (civil, penal e eleitoral, inclusive as competências constitucionais da Justiça do Trabalho e Justiça Federal). Diz-se que o juízo ou vara tem competência plena. Comumente, há distribuição da atividade jurisdicional perante juízos especializados, assim, varas cíveis, varas criminais, varas de família e sucessões etc. Disso se denota que são variados os elementos da demanda que se utiliza para determinação do juízo competente, podendo ser aplicáveis todos os critérios: objetivo, funcional e territorial. Na comarca de São Paulo, além de especialização de varas, o seu território é dividido contendo grupo de juízos centrais, grupo de juízos regionais e grupo de juízos distritais. Originalmente, foram criadas as varas distritais (art. 24, do Código Judiciário). Posteriormente, as varas distritais foram denominadas de foros distritais, distinguindo-se, explicitamente, do foro 70

Ob. cit., p. 318.

91

central (art. 53, da Resolução do TJSP nº 2, de 15.12.1976, autorizada pela Lei federal nº 5.621, de 4.11.1970). Em seguida, a denominação foi alterada para foros regionais, que remanesce até hoje (art. 1º, da Lei estadual nº 3.947, de 8.12.1983). É de todo criticável a legislação paulista, uma vez que confunde juízo com foro. O próprio Código Judiciário do Estado estipula que a comarca (foro) não poderá abranger menos de um município (art. 9º). A previsão da LOMAN que autoriza a criação dos distritos, é melhor empregada quando se trata de varas distritais ou regionais e não foros distritais ou regionais. A palavra foro deve ser empregada, para órgãos de 1º grau de jurisdição, exclusivamente, no sentido de definir a unidade judiciária básica de divisão do território: comarca, seção judiciária, junta eleitoral, auditoria militar etc. Essa divisão é apenas para atribuição de atividade aos juízos, pois, todos exercem jurisdição em toda a comarca, conforme a regra do art. 200, do CPC, reproduzida no art. 53, I, da Res. nº 2/76. Dentro da comarca de São Paulo, o juízo está dentro do limite territorial de exercício de sua competência, dispensando-se as requisições por carta para prática de atos judiciais (arts. 200 e 86, do CPC). Nada obstante, o território da comarca de São Paulo é dividido, de sorte que dentro do foro, quando a competência for determinada pelo “domicílio, residência, situação do imóvel, local de fato ou da prática de ato, e semelhantes, os foros regionais se consideram distintos entre si e do foro central, não se admitindo competência 92

cumulativa entre o central e os regionais, nem entre esses” (art. 53, II, Res. 2/76). No fundo, a lei de organização judiciária do Estado de São Paulo, para a comarca de São Paulo, dividiu-a territorialmente, mediante atribuição de competência não cumulativa, ou seja, competência absoluta de juízo. Falamos em grupos de juízos pois, cada foro, central ou regional, é composto de juízos especializados (varas cíveis, criminais, famílias e sucessões, infância e adolescente, juizado especial etc.). Atualmente, há 12 foros regionais instalados e funcionando, sendo que o da Nossa Senhora do Ó, instalado em 26.06.2007, é totalmente informatizado, havendo uso exclusivo de processo digital sem o emprego de papel, já adaptado à Lei nº 11.419, de 19.12.2006. Em funcionamento há o foro distrital de Parelheiros, com competência plena, excetuado o serviço das Execuções Criminais, na forma do preceituado no art. 2º, da Lei Complementar Estadual nº 877, de 29.08.2000. Atendidos os elementos de ligação da causa com o foro regional (art. 53, II, Res. 2/76), há uma limitação de sua competência fixada pelo critério valor, cujo teto é de 500 salários-mínimos (art. 54, I, da Res. 02/76, na redação da Res. 148, 24.09.2001).

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Independentemente de valor, há um rol taxativo de causas, cíveis e criminais, de competência dos foros regionais (art. 4º, I e III, e, II, respectivamente, da Lei estadual nº 3.947/83, revogando o art. 54, II e III, da Res. 02/76). Em conclusão, para se determinar qual o juízo competente na comarca de São Paulo, a primeira questão a ser resolvida é saber se a demanda é de competência do foro distrital de Parelheiros (competência dentro dos limites territoriais do distrito de Parelheiros). Em caso positivo, resulta solucionado o problema relativo à determinação do órgão jurisdicional competente. Em caso negativo, é necessário determinar se a competência é do foro central ou de um dos foros regionais. Se os elementos de ligação da causa ao juízo resultarem que é competente um dos foros regionais, segue-se outra indagação, cuja resposta exige que se confira se: (i)

trata-se de causa pertencente aos juízos especializados da Fazenda Pública, de Acidentes de Trabalho, de Execuções Fiscais, de Falências e Recuperações Judiciais, de Varas de Registros Públicos (excepcionadas as disposições do art. 54, I, ‘j’, da Res. TJSP 02/76 e art. 4º, I, ‘a’, da Lei nº 3.947/83); e, ainda do Ofício das Cartas Precatórias Cíveis, sempre de competência do foro central;

(ii)

a demanda tem como valor da causa importância superior a 500 salários-mínimos (art. 54, I, da Res. TJSP nº 02/76, na redação da Res. TJSP nº 148, de 24.09.2001), e não consta do rol taxativo das ações que não estão sujeitas a valor de alçada para 94

competência dos foros regionais (art. 54, II a V, da Res. TJSP nº 02/76 c.c. art. 4º, I e III, da Lei nº 3.947/83). A competência será de um dos foros regionais se as soluções dos itens (i) e (ii) forem negativas; em caso contrário, a despeito do critério territorial apontar como competente um foro regional, a competência para causa será dos juízos do foro central da comarca de São Paulo. Há autores que ainda apresentam uma outra questão a ser respondida para a efetiva concretização da competência jurisdicional; aludem a competência interna do órgão jurisdicional. No sistema do CPC, vimos que a competência interna é contraposto das regras de competência internacional dos juízes brasileiros, disciplinadas, respectivamente, nos Capítulos III e II, do Título IV, do Livro I. Segundo esta suposta ‘competência interna’ fixar-se-ia o juiz competente dentro do juízo. Entendemos que a norma do art. 132, do CPC, determinando que o juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência deva julgar a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado, promovido, aposentado, ou tiver falecido, não está diretamente conectada com as normas de determinação de competência de órgão jurisdicional. Elas derivam do princípio da oralidade e seus sub-princípios da identidade física do juiz, da imediatidade e da concentração dos atos processuais, pelos quais

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reputa-se que o juiz que colhe a prova oral deve proferir a decisão sobre o litígio.

96

7. Ausência de Competência – Incompetência Absoluta ou Relativa Ao

disciplinar

as regras para determinação da

competência dos órgãos jurisdicionais, o legislador ora se baseia em critério de interesse público, norteado pelo melhor exercício da função jurisdicional, ora em critérios voltados a interesses privados, atendendo à liberdade das partes e à sua comodidade no acesso à Justiça. As regras que impõem critérios baseados em interesse público são cogentes, imperativas e o seu descumprimento importa em ausência absoluta de competência do órgão judicial. São referidas como regras de incompetência absoluta. De outro modo, as normas calcadas em critérios que visam, primacialmente, atender os interesses das partes, são dispositivas, acarretando incompetência relativa do órgão jurisdicional, quando inobservadas. Nesse sentido, o art. 111, do CPC, dispõe que a competência em razão da matéria e da hierarquia (entenda-se competência funcional, da qual a competência hierárquica é espécie) é inderrogável por convenção das partes, mas estas podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro. O CPC não disciplina o critério objetivo – condição das pessoas em lide, para determinação da competência jurisdicional. O critério é empregado pela Constituição Federal e nas leis de organização judiciária, de sorte que sempre importam em competência absoluta. 97

Moacyr Amaral Santos apontando a lacuna do diploma codificado, afirma que a competência em razão das pessoas deve ser abrangida pela competência em razão da matéria, definida legalmente como absoluta, haja vista que ambas são na técnica do CPC, determinadas segundo o critério objetivo.71

7.1. Incompetência Absoluta A incompetência absoluta deve ser declarada de ofício e pode ser alegada, em qualquer tempo e grau de jurisdição, preceitua o art. 113, do CPC. A competência do juízo (absoluta) é pressuposto processual de validade da relação processual, de sorte que a sua violação resulta em nulidade absoluta.72 Este vício do processo somente se convalidará após o decurso do biênio decadencial para propositura de ação rescisória, contado a partir do trânsito em julgado da decisão (art. 495, do CPC). Efetivamente, um dos fundamentos da ação rescisória é ter sido a sentença proferida por juízo absolutamente incompetente (art. 485, II, do CPC). A incompetência absoluta é reconhecida como uma objeção processual, matéria oponível como defesa processual, mas, que o

71

Ob. cit., p. 251.

72

Sobre o tema conferir, Nelson Rodrigues Netto, Breves Apontamentos sobre os Requisitos de Admissibilidade para o Julgamento de Mérito. Prisma Jurídico, São Paulo: Uninove. Vol. 1, set/2002, p. 147-162.

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juiz pode conhecer de ofício, a qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de alegação pelo réu, (art. 301, II, e § 4º, do CPC). Incidem, portanto, os princípios da economia processual e da conservação dos atos processuais. Neste aspecto, o art. 113, §2º, do CPC, dispõe que reconhecida a incompetência absoluta do juízo, somente os atos decisórios serão nulos, remanescendo íntegros os demais atos processuais, inclusive instrutórios. O requerimento de declaração da incompetência absoluta independe de exceção ritual, bastando uma petição simples, não estando sujeita a preclusão, mas, deixando-a de ser invocada no prazo da resposta ou na primeira oportunidade que falar nos autos, o réu arcará com custas de retardamento (art. 113, §1º).73

7.2. Incompetência Relativa Vimos que a incompetência relativa é atinente ao território e ao valor, mas é com relação ao primeiro critério, dado que, rigorosamente, é problema e não critério de solução de competência, que ela com maior freqüência surge. A competência territorial corresponde a competência de foro, sendo que a regra geral para a determinação do foro competente, considera o sujeito passivo da relação processual e sua sede: domicílio do demandado.

73

Cf. Nelson e Rosa Nery, ob. cit., p. 514; Ernane Fidélis dos Santos, ob. cit., p.157. Arruda Alvim afirma que o dispositivo aplica-se a ambas as partes, ob. cit., p. 318.

99

A incidência do art. 94, do CPC, é residual; inexistindo regra de foro especial ou privilegiado, aquela determinará o foro competente. Pois bem, a violação da regra geral de foro, bem como das normas especiais e vice-versa, resultam em incompetência relativa do órgão judiciário. O único meio idôneo para se insurgir contra a incompetência relativa é o oferecimento da exceção processual ritual declinatória de foro e juízo (exceptio declinatori fori – art. 112, do CPC), de modo que o juiz não pode reconhecê-la de ofício (art. 114, do CPC). Entretanto, a Lei nº 11.280, de 17.02.2006, alterou o p. único do art. 112 e, em virtude de tal alteração adaptou o art. 114, que passaram a ter as seguintes redações:

“Art. 112. .................................................................. Parágrafo único. A nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, pode ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de competência para o juízo de domicílio do réu.” .................................................................. “Art. 114. Prorrogar-se-á a competência se dela o juiz não declinar na forma do parágrafo único do art. 112 desta Lei ou o réu não opuser exceção declinatória nos casos e prazos legais.” Na verdade, a norma visa proteger a isonomia das partes no processo, de modo que deverá ser declarada de ofício a nulidade de cláusula de eleição de foro estabelecida em contrato de adesão que possa prejudicar o direito de defesa do réu. 100

Esta prática tem sido reiterado no foro, com o apanágio do Superior Tribunal de Justiça, notadamente, em contratos consumeristas, com base nos arts. 6º, VIII e 51, XV, do Código de Defesa do Consumidor. Rigorosamente, não há incompetência ou prorrogação de competência, mas a declaração de nulidade de cláusula contratual que reflete no plano processual. Não há, assim, contradição com a Súmula 33, do STJ: “A incompetência relativa não pode ser declarada de ofício”. Deverá o juiz remeter o processo ao juízo competente, segundo a regra geral do art. 94, do CPC, do domicílio do réu. Nesta mesma toada, a Lei nº 11.280/06, também alterou o p. único do art. 305, permitindo que a exceção de incompetência possa ser interposta no domicílio do réu: “Art. 305. .................................................................. Parágrafo único. Na exceção de incompetência (art. 112 desta Lei), a petição pode ser protocolizada no juízo de domicílio do réu, com requerimento de sua imediata remessa ao juízo que determinou a citação.” A exceção de incompetência somente é cabível, no prazo de resposta a que tiver direito o demandado, sendo este o legitimado a oferecê-la, sob pena de prorrogação da competência do órgão relativamente incompetente. Por outras, se o demandado não oferecer 101

exceção de incompetência relativa, na forma e prazo legais, o juízo que era, abstratamente, incompetente, passará a ser competente para aquela demanda em concreto, ressalvada a regra do parágrafo único do art. 112 (art. 114, do CPC). Dissemos

prazo

de

resposta,

uma

vez

que

a

incompetência relativa é sempre inicial, mas, a interpretação deve ser lógica, tanto que no processo de execução, fundado em título extrajudicial, o demandado, ao opor seus embargos poderá excepcionar (art. 741, VII, do CPC). A exceção de incompetência é considerada meio de defesa processual dilatória e ritual, pois provoca o surgimento de um incidente processual e prolonga o procedimento, não tendo o condão de determinar a extinção do processo sem julgamento de mérito. A exceção deve ser oferecida em petição própria, fundamentada, instruída, e apontando o órgão que se reputa como competente. Não indeferindo liminarmente a exceção (art. 310, do CPC), o juiz ao recebê-la suspenderá o processo até a decisão do incidente (art. 265, III, do CPC). Este é o sentido que se deve dar ao art. 306, do CPC, apesar do mesmo soar diferentemente ao prever que a suspensão durará até que seja “definitivamente julgada”. Por se tratar de decisão interlocutória, deve-se perquirir se ao eventual recurso de agravo interposto, na forma de instrumento, é atribuído efeito suspensivo pelo relator no Tribunal (art. 527, III, do CPC).

102

O excepto será ouvido no prazo de 10 dias, e havendo necessidade de prova testemunhal, o juiz designará audiência de instrução e julgamento, decidindo em 10 dias (arts. 308 e 309, do CPC). Julgada procedente a exceção, os autos são remetidos ao juízo competente, devendo as partes ser intimadas retomando o processo o seu curso. Nada impede que o demandado tenha oferecido exceção de incompetência, sem contestar o pedido (art. 299, do CPC). Por se tratar de prazo de suspensão, somente o que sobejar ser-lhe-á concedido para que possa contestar.

103

8. Prevenção – Conexão e Continência 8.1. Prevenção Conceitua-se a prevenção como sendo o resultado de um ato jurídico realizado no processo, a que a lei empresta a relevância de ligar uma causa a um dado órgão (concretamente, competente), dentre diversos competentes (abstratamente competentes), isto é já tidos como competentes à luz da aplicação dos critérios de determinação de competência. É pressuposto da prevenção a existência de mais de um juízo (órgão do judiciário) com igual competência, no plano abstrato. A prevenção não é critério de determinação de competência, mas de fixação de competência. A lei dispõe de modos diferentes em se tratando de órgãos jurisdicionais com mesma competência territorial, ou seja, localizados dentro do mesmo foro, ou, com competência territorial diversa, por estarem localizados em foros diferentes. Considera-se prevento o juízo, com mesma competência territorial, aquele que em primeiro lugar tiver despachado a petição inicial (art. 106, do CPC). Neste caso, diz-se tratar-se de prevenção de juízo, posto ambos os órgãos judiciários encontram-se dentro do mesmo foro. Por outro lado, quando os juízos tiverem competência territorial diferente, torna-se prevento aquele no qual, em primeiro lugar, realizou-se validamente a citação do demandado (art. 219, do CPC). 104

Afirmar-se ser hipótese de prevenção de foro, uma vez que os juízos encontram-se em foros diferentes. Quando a regra de determinação de competência considerar o local do imóvel (forum rei sitae), e este se achar situado em mais de um Estado ou comarca, a fixação do juízo, foro e Justiça do Estado competentes (imóvel situado no território de mais de um Estado), se dará pela prevenção (art. 107, do CPC). O juízo prevento para uma demanda, exerce força atrativa para outras causas que com aquela sejam conexas ou continentes (art. 105, do CPC).

8.2. Conexão e Continência A conexão e a continência são institutos processuais que determinam a reunião de duas ou mais ações quando elas possuírem entre si elementos idênticos ou semelhantes que justifiquem seu processamento e julgamento conjuntos. A conexão propicia estabelecer se uma causa está ligada à outra (ou outras) com uma dada intensidade que, a decisão da primeira possa influenciar na decisão da segunda (ou das demais). Há um motivo de interesse público que justifica a conexão de ações: evitar a contradição de julgados; e outro de interesse privado: economia processual, possibilitando processamento conjunto das

105

causas conexas, com produção de provas em procedimento único e julgamento conjunto.74 Obviamente, se uma das ações conexas já tiver sido julgada, já não mais se justifica a sua reunião, posto que se torna impossível procurar evitar a eventual contradição dos julgados, tampouco existindo economia processual (Súmula nº 235, do STJ). A conexão e a continência são fatores que provocam a modificação (prorrogação da competência de um dado órgão judicial), quando esta for determinada com base em critério objetivo de valor ou territorial (art. 102, do CPC), hipóteses, portanto, de competência relativa. Não se trata, destarte, de critérios determinativos de competência. Costuma-se afirmar que são elementos de prorrogação legal de competência, ao contrário da eleição de foro e omissão em opor exceção declinatória de foro e juízo, as quais seriam espécies de prorrogação voluntária de competência. Em se tratando de competência absoluta não incide o instituto, como por exemplo, uma ação perante a Justiça do Trabalho e outra perante a Justiça comum. Todavia, nessas hipóteses, é possível a suspensão do processo, na forma do art. 265, IV, ‘a’, do CPC (hipótese conhecida como de suspensão por prejudicialidade externa). Difere o exemplo tratado, onde há diversidade de Justiças e, portanto, competência absoluta decorrente do critério material, 74

Cf. Moacyr Amaral Santos, ob. cit., p. 258.

106

de uma situação, onde há causas conexas, sendo que um dos juízos tem competência absoluta e outro juízo competência relativa para as demandas, respectivamente. Nesse caso, não há óbice à prorrogação da competência do juízo absolutamente competente para conhecer da outra demanda, caso em que a prorrogação da competência relativa deverá ser estabelecida em virtude da prevenção do juízo absolutamente competente. Caso contrário, impossível se torna a reunião das ações perante o juízo que detinha competência relativa para uma das ações, sendo absolutamente incompetente para a outra. O liame entre as demandas que justifica a conexão ou a continência tem de ser apreciado a partir dos elementos da ação, apontados na clássica teoria da tríplice identidade (tria eadem) de Chiovenda: partes, pedido e causa de pedir.75 Há intensa discussão sobre o conceito de conexão entre os autores modernos e clássicos, nacionais e estrangeiros, sendo certo que o CPC atual procurou atenuar o problema ao definir a conexão em seu art. 103, e a continência no art. 104. Considerando os elementos da ação, duas causas são conexas quando apenas um deles for comum: objeto (pedido) ou a causa de pedir (art. 103, do CPC). O legislador considerou que o elemento partes é por demasiado tênue a justificar a reunião das ações.76

75

Cf. Instituições de direito processual civil, v. I, pp. 63/4 e 489/510.

76

Explicitamente, Moacyr Amaral Santos, ob. cit., p. 259; Marcus Vinicius Rios Gonçalves, ob. cit., p. 76; Ernane Fidélis dos Santos, ob. cit., p. 162. Em sentido contrário, entendendo que houve lapso do legislador, Marcelo Abelha Rodrigues, ob. cit., p. 212.

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A conexão, neste passo, é estudada apenas no que diz respeito ao tema da competência, haja vista que ela é de grande relevo em outros capítulos do direito processual, como na cumulação de pedidos, litisconsórcio facultativo, reconvenção, ação declaração incidental etc. Para fins de litispendência e coisa julgada exige-se que a causa de pedir (próxima e remota) sejam idênticas. Todavia, para a conexão, basta que a causa de pedir remota, ou seja, os fatos jurídicos sejam iguais.77 A continência é mais exigente pois, devem ser idênticas as partes, a causa de pedir, e o pedido de uma das ações, por ser mais amplo, abrange as demais (art. 104, do CPC). A hipótese de surgimento posterior da chamada ‘ação menor’ em relação à “ação maior”, ou seja, aquela cujo objeto já está abrangido em outra ação, não se refere à continência. Na verdade há litispendência pois, a 2ª ação (menor) está integralmente decalcada na 1ª ação (maior) que, por isso, contém objeto mais abrangente. A continência, portanto, somente ocorrerá quando uma ação for proposta posteriormente à outra pendente, contendo as mesmas partes, mesma causa de pedir, mas, o pedido da subseqüente, por ser mais, amplo abranger a da antecedente. Exemplo se dá na cobrança de juros, derivado de contrato de mútuo, formulado em 1ª ação, e, na 2ª ação, o autor pleiteia o pagamento do principal da dívida, sobre o qual estariam incluídos os juros (art. 293, do CPC). 77

Cf. Humberto Theodoro Júnior, ob. cit., p. 169; Vicente Greco Filho, ob. cit., p. 209.

108

A continência é muito criticada por se tratar de instituto inócuo, uma vez que antes de serem continentes, duas ou mais causas, serão conexas, de sorte que a reunião delas já estaria solucionada. O art. 105, do CPC, dispõe que, havendo conexão ou continência entre duas ou mais ações, o juiz, de oficio ou a requerimento de qualquer das partes, poderá ordenar a reunião das ações propostas em separado, a fim de que sejam decididas simultaneamente. O órgão competente para as causas conexas ou continentes é fixado pela prevenção. A conexão, sob a ótica da resposta do réu, é uma objeção processual, podendo ser conhecida de oficio pelo juiz (art. 301, VII e §4º,do CPC). Há grande divergência doutrinária sobre se a reunião dos processos, havendo conexão, é dever do juiz ou se se trataria de uma prerrogativa.78 O Superior Tribunal de Justiça, em mais de uma oportunidade, decidiu que cabe ao juiz avaliar da gravidade da contradição e conveniência da reunião dos processos (Ag. nº 58.184-5/SP; Resp. nº 15.540-0/SP; Resp. 5.270-SP).

78

No sentido de que é obrigatória, Nelson e Rosa Nery, ob. cit., p. 505; Marcelo Abelha Rodrigues, ob. cit., p. 208. No sentido de que ao juiz compete verificar da possibilidade de contradições ou de economia processual, Arruda Alvim, ob. cit., p. 370/1; Marcus Vinicius Rios Gonçalves, ob. cit., p. 78; Ernane Fidélis dos Santos, ob. cit., p. 164.

109

9. Perpetuatio Jurisdictionis O art. 87, do CPC, determina que a competência é fixada no momento da propositura da ação, havendo a cristalização dos elementos de fato e de direito da demanda, os quais podem se alterar no curso do procedimento, sem alteração do juízo competente. Há ressalva apenas, quando houver a supressão do órgão jurisdicional ou a alteração da competência em razão da matéria ou hierarquia (rectius: funcional), quando pode haver caso de incompetência superveniente. Desse modo o desmembramento de comarca, que implica em alteração do forum rei sitae provoca a alteração do foro competente (Resp. nº 150.902-PR). No mesmo sentido, a Súmula nº 10 do STJ: “Instalada a Junta de Conciliação e Julgamento, cessa a competência do juiz de direito em matéria trabalhista, inclusive para a execução das sentenças por ele proferidas”.

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10. Conflito de competência Em se tratando de competência absoluta, o juízo deverá examiná-la de ofício. Verificando ser absolutamente incompetente o juízo deverá remeter os autos ao foro e juízo competentes. Havendo discrepância entre dois ou mais juízos, ambos reputando-se competentes para a causa, surge o conflito positivo de competência (art. 115, I, do CPC). Por outro lado, quando dois ou mais juízos se consideram incompetentes para a causa, surge o conflito negativo de competência (art. 115, II, do CPC). Em ambas as hipóteses, há uma divergência com relação a apenas uma ação. Não existe uma terceira hipótese, sendo que a previsão do inciso III, do art. 115, é subsumível nos referidos incisos I e II, ou seja, conflitos positivo ou negativo de competência. A única diferença é que se trata de situação onde há mais de um processo, perante mais de um juízo, havendo divergência entre eles sobre a existência ou não de conexão que justifique a reunião ou a separação dos processos. Por exemplo: haverá conflito negativo quando um juízo ao receber uma ação ‘b’, supostamente conexa com outra ação ‘a’, em trâmite em sua vara, afirma-se incompetente para a ação ‘b’ e remete a outro juízo que, igualmente, se diz incompetente para a ação ‘b’; de outra parte, haverá conflito positivo, quando o juízo perante o qual tramita a ação 111

‘a’, afirma-se competente para a ação ‘b’, a este distribuída por dependência, em razão de conexão, e outro juízo se apresenta como competente para essa ação ‘b’, requerendo que a ele sejam remetidos os respectivos autos. Além

do

controle

oficial,

estão

expressamente

autorizados a suscitar o conflito de competência, as partes e o órgão do Ministério Público, o qual deverá, ademais, ser ouvido em todos os conflitos (art. 116, do CPC). O réu que ofereceu exceção declinatória de foro não pode suscitar o conflito de competência, uma vez que já se insurgiu quanto a incompetência do juízo, o que resulta em preclusão consumativa (art. 117, do CPC). Não o tendo feito, poderá opor a exceção de incompetência, enquanto não julgado o conflito de competência e desde que o mesmo não tenha suspendido o curso do processo (arts. 117, p. único e 120, do CPC).79 O conflito é suscitado perante o Presidente do Tribunal, mediante ofício do juiz ou, mediante petição das partes ou, do órgão do Ministério Público, instruídos com os documentos necessários à sua prova (art. 118, do CPC). Quando o incidente for suscitado pelas partes ou MP, o relator, mandará ouvir os juizes em conflito. A lei diz, ainda, que o relator poderá ouvir apenas o suscitado, quando um dos juízes tiver instaurado o incidente (art. 119, do CPC). O STJ já decidiu que abertura de prazo para

79

Cf. Nelson e Rosa Nery, ob. cit., p. 519.

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oitiva dos juízos pode ser dispensada, se já existirem elementos de convicção deles nos autos (CC nº 403-0/BA). O relator deverá suspender o processo, em caso de conflito positivo, e em ambos os casos nomear um dos juízes para resolver, em caráter provisório, as medidas urgentes (art. 120, do CPC). Não há suspensão do processo no conflito negativo, pois que ambos os juízos afirmam-se incompetentes, não estando praticando qualquer ato processual. O MP deverá ser ouvido em 5 dias, em seguida o conflito será apresentado em sessão de julgamento. Havendo jurisprudência dominante do tribunal sobre a questão suscitada, o relator poderá decidir de plano o conflito de competência, cabendo agravo interno, no prazo de 5 dias ao órgão fracionário competente para o julgamento do conflito de competência (art. 120, parágrafo único, do CPC). O Tribunal deverá decidir o conflito, indicando o juízo competente e remetendo-lhe os autos do processo, além de decidir sobre a validade dos atos praticados pelo juízo incompetente (art. 122, do CPC). O conflito entre órgãos fracionários dos Tribunais deverá observar o procedimento previsto nos respectivos regimentos internos (art. 123, do CPC). O STF tem competência originária para dirimir conflitos de competência entre: (i) o STJ e quaisquer tribunais; (ii) entre Tribunais

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Superiores; e, (iii) entre Tribunais Superiores e quaisquer outros Tribunais (art. 102, I, ‘o’, da C.F.). O STJ tem competência originária, ressalvada a competência do STF, para dirimir conflitos de competência entre: (i) entre quaisquer tribunais; (ii) entre Tribunal e juiz a ele não vinculado; e, (iii) juízes vinculados a Tribunais diversos (art. 105, I, ‘d’, da C.F.).

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