-CAMPANHA NACIONAL DE ESCOLAS DA COMUNIDADE FACULDADE CENECISTA DE CAPIVARI - FACECAP

-CAMPANHA NACIONAL DE ESCOLAS DA COMUNIDADE FACULDADE CENECISTA DE CAPIVARI - FACECAP - PEDAGOGIA – A IMPORTÂCIA DO LÚDICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL JAN...
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-CAMPANHA NACIONAL DE ESCOLAS DA COMUNIDADE FACULDADE CENECISTA DE CAPIVARI - FACECAP

- PEDAGOGIA –

A IMPORTÂCIA DO LÚDICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL

JANAÍNA MARTIMBIANCO PEREIRA

Capivari, SP 2016

CAMPANHA NACIONAL DE ESCOLAS DA COMUNIDADE FACULDADE CENECISTA DE CAPIVARI- FACECAP

- PEDAGOGIA-

A IMPORTÂCIA DO LÚDICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Monografia apresentado ao Curso de Pedagogia FACECAP/Capivari, para obtenção do título de pedagogo, sob orientação do Prof. Me. Ivan Gimenes de Lima.

JANAÍNA MARTIMBIANCO PEREIRA

Capivari, SP 2016

FICHA CATALOGRÁFICA P492i PEREIRA, Janaina Martimbianco A importância do lúdico na Educação Infantil /Janaina Martimbianco Pereira. Capivari - SP: CNEC, 2016. 43 p. Orientador: Prof.ª Me. Ivan Gimenes de Lima Monografia apresentada ao curso de Pedagogia. 1. Brincar. 2. Escola. 3. Educação Infantil. I Título. II Faculdade Cenecista de Capivari. CDD. 371.33

Dedico essa pesquisa à pessoa mais especial em minha vida, obrigada meu namorado por acreditar em mim, por estar ao meu lado em cada angústia e lágrimas derramadas, com você ao meu lado quero compartilhar cada conquista.

AGRADECIMENTO

Agradeço primeiramente a Deus por ele me guiar, me dando força e sabedoria que nunca me deixou desistir, pois sem ele não somos nada. Agradeço aos meus pais, Higor e Elisabete, por me incentivarem a nunca desistir dos meus sonhos, sempre me guiando e apoiando a vencer cada obstáculo. Às minhas irmãs Tielen e Daiane pela paciência, por acreditarem em mim. Agradeço ao meu namorado Leandro, que me incentivou a voltar a estudar e correr atrás dos meus sonhos, sempre me apoiando e incentivando. Aos amigos que conquistei ao longo desta caminhada, Amanda, Tamiris e Claudinéia e aos demais que estiveram comigo correndo atrás dos nossos objetivos para a realização dos nossos sonhos. Agradeço ao meu orientador, professor Ivan, por toda paciência depositada em mim, por todos os puxões de orelhas que me fizeram crescer em cada dificuldade enfrentada ao longo desse processo. À professora Patrícia, minha avaliadora na qualificação, que apontou sugestões para desenvolver melhorias na minha monografia.

E agradeço à professora Lìdia, minha

avaliadora na banca, pelos apontamentos que enriqueceram o meu trabalho. Obrigada a todos.

Brincar com as crianças não é perder tempo, é ganhá-lo. Se é triste ver os meninos sem escola, mais triste ainda é vê-los sentados enfileirados em salas sem ar, com exercícios estéreis, sem valor para a formação do homem. (Carlos Drummond de Andrade).

PEREIRA, Janaína Martimbianco. A importância do lúdico na educação infantil. Trabalho de Curso. Curso de Pedagogia. Faculdade Cenecista de Capivari – CNEC. 44 p. ,2016 RESUMO Este trabalho foi elaborado através de uma reflexão a respeito da importância do lúdico na educação infantil. O lúdico deve estar presente na vida das crianças e nas escolas, pois a mesma deve atentar-se para o uso dele como meio de aprendizagem e saber a importância que o brincar tem no desenvolvimento infantil. O lúdico é um fator positivo na construção do conhecimento das crianças durante a infância, desenvolvendo nelas a imaginação, raciocínio, criatividade e espontaneidade na construção do sistema de representação (leitura e escrita) e muitas escolas a encaram somente como momento de lazer e entretenimento. O brincar é necessário, observando as brincadeiras infantis, oferecendo material adequado e espaço que permita o enriquecimento das competências imaginativas. Enfim, o brincar é elemento de suma importância para o processo de educação de nossas crianças, brincando elas amadurecem algumas competências para a vida coletiva, pela interação e utilização dos jogos e de papéis, exploram ambientes, refletem sobre formas culturais nas quais vivem e sobre a realidade circundante, desenvolvendo-se psicológica e socialmente. Este estudo se apontará em pesquisa bibliográfica e irá abordar uma pesquisa de campo realizada em um parque ecológico, onde o objetivo será observar as crianças em diversas brincadeiras. Palavra-chave: 1.Brincar, 2.Escola, 3. Educação Infantil.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 09 1. A IMPORTANCIA DO BRINCAR .................................................................................. 11 2. AS DESCOBERTAS DE ARIÈS....................................................................................... 17 2.1 História da contribuição dos jogos e das brincadeiras ................................................... 20 3. O BRINCAR NO CONTEXTO ESCOLAR .................................................................... 26 3.1 Metodologia ................................................................................................................... 30 3.2 Registro - DIÁRIO DE CAMPO ................................................................................... 32 3.3 Analise do Diário de Campo .......................................................................................... 39 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 41 REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 43

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo apresentar a importância do lúdico na Educação Infantil, a partir das suas contribuições para a vida da criança na educação, como uma metodologia que possibilita mais prazer e significado no processo de ensino e aprendizagem. Na infância surge a vontade de brincar e através da brincadeira é que o mundo é levado para a realidade infantil, desenvolvendo potencialidades e múltiplas habilidades. Ao brincar a criança poderá imaginar, criar, recriar, associar, se descobrir, se desenvolver física, psíquica e socialmente. Todavia, o brincar deve ser uma atividade livre, repleta de fantasia, momentos de se conhecer, possibilitando conhecer o outro. O brincar contribui para as fases do desenvolvimento infantil, inclusive na escola. Para uma criança a brincadeira é uma necessidade muito importante, tanto as necessidades primárias, quanto comer e vestir, fazendo parte da essência da infância e deve ser, sem dúvida, privilegiada na Educação Infantil. Como problematização da pesquisa, foram levantados os seguintes questionamentos: como a escola vem desempenhando o ensino por meio da ludicidade? As brincadeiras e os jogos, recursos fundamentais na construção do mundo infantil, podem contribuir para o desenvolvimento da criança e para a aprendizagem na Educação Infantil? Está sendo oferecido à criança apoio necessário para que ela brinque e estimule sua criatividade? Todas essas perguntas foram refletidas, para que não limitemos as possibilidades de linguagem e expressão da criança, valorizando seus interesses desde os primeiros anos de vida. E, cada vez mais, a escola vem se tornando a instituição responsável por esse desenvolvimento, pois as exigências sociais às famílias fazem com que as crianças a frequentem cada vez mais cedo. Observamos, então, que a escola tende a assumir funções antes delegadas à família, meio gerador em que a criança dispunha de espaço físico e emocional necessário para executar sua vontade de explorar, experimentar e se interessar pelo mundo externo. (TEIXEIRA, 2010, p. 22).

Portanto, é essencial a utilização das brincadeiras e dos jogos no processo pedagógico, pois os conteúdos podem ser ensinados por intermédio das atividades predominantemente lúdicas, com maior sentido. Brincando a criança aprende a lidar com o mundo, formando sua identidade pessoal e autonomia, experimenta sentimentos como o amor, o medo e a insegurança, também presentes na vida. É brincando que a criança atribui sentido ao mundo, como ela o interpreta e o 9

assimila. O brincar poderá ser o reflexo da vida real de uma criança. “O brincar proporciona a aquisição de novos conhecimentos, desenvolve habilidades de forma natural e agradável. Ele é uma das necessidades básicas da criança, é essencial para um bom desenvolvimento motor, social, emocional e cognitivo.” (MALUF, 2003, p. 9). O brincar na escola deve ser introduzido e valorizado, pois é uma atividade espontânea muito importante para criança, ao brincar ela aprende de forma prazerosa, adquirindo maior facilidade na assimilação do conhecimento. A Educação infantil e o lúdico se completam, pois o brincar está diretamente ligado à criança, a recreação é parte integrante da rotina diária e ficar fora deste momento é impossível para os pequenos, porque “além de muitas importâncias o brincar desenvolve os músculos, a mente, a sociabilidade, a coordenação motora e além de tudo deixa qualquer criança feliz” (MALUF, 2003, p.19).

É preciso dinamizar as atividades lúdicas na escola, transformar o brincar em trabalho pedagógico, saber entrar no mundo imaginário da criança, no seu sonho, no seu jogo e aprender a jogar com elas. Este trabalho surgiu de uma inquietação a respeito de como as atividades lúdicas perderam espaço no cotidiano das crianças. Cabe a nós educadores, refletirmos e resgatarmos a importância do lúdico para criança da Educação Infantil, pois, é fonte de desenvolvimento e aprendizagem. Referenciamo-nos em renomados autores, como: Ariès (1981), Marcellino (2012), Marcellino (1999), Heinkel (2000), Teixeira (2010), Teles (1997), Fontana e Cruz (1997) e outros que abordam a importância do lúdico na educação infantil e na educação. O primeiro capítulo abordará a importância do brincar, o que essa atividade pode contribuir para a formação da criança. Já o capítulo dois trará um breve histórico do sentimento de infância e a história da contribuição dos jogos e das brincadeiras. No terceiro capítulo a pesquisa busca mostrar a importância do brincar no contexto escolar e o registro diário de campo.

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1. A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR

O lúdico, tem sido bastante mencionado nas escolas onde a criança encontra-se em total desenvolvimento cognitivo e social. No entanto é necessário entender algumas definições para que não haja divergências entre as práticas estabelecidas com as crianças. Marcellino (1999) relata que, reconhecer o lúdico é reconhecer a especificidade da infância, permitir que as crianças sejam crianças e vivam como crianças e ouvir as crianças falarem por si mesmas. Na infância, a criança através do lúdico expressa suas vontades e desejos, não deixando de ser criança.

No entanto é necessário que a escola permita que a

imaginação flua dentro dela. “Não existe adulto criativo sem criança que brinque”. (TELES,1997, p.24). Segundo Oliveira (2000), o brincar não significa apenas recrear, é muito mais, caracterizado como uma das formas mais complexas que a criança tem de comunicar-se consigo mesma e com o mundo, ou seja, o desenvolvimento acontece através de trocas recíprocas que se estabelecem durante toda sua vida. Assim, através do brincar a criança pode desenvolver capacidades importantes como a atenção, a memória, a imitação, a imaginação, propiciando à criança o desenvolvimento de áreas da personalidade como afetividade, motricidade, inteligência, sociabilidade e criatividade. Quando a criança brinca, ela costuma interfundir as coisas e as pessoas de uma forma não-envolvente e inconstante. Ela é movida unicamente pela paixão. Ela se entretém e é imune a qualquer medo de consequências sérias. É como se estivesse “de férias” com relação à realidade social. (TELES, 1997, p.18) (Grifos do autor).

De acordo com o autor, a criança quando brinca se supera, ou seja, quando está brincando vive no mundo de faz conta. Ao mesmo tempo que cria uma situação imaginária traz para o brincar sua realidade e seu contexto social. Neste momento ela vive um mundo de fantasia, em que tudo ao seu redor deixa de ser sério e passa a se colocar no lugar dos adultos. Quando a criança brinca, está manipulando sua realidade, modificando-a, interagindo diretamente com os objetos; é uma relação íntima de construção e desconstrução do real para fantasia. O brinquedo é um objeto concreto capaz de fazer fluir o mundo imaginário da criança, é um vínculo entre a fantasia e a realidade, entre o mundo da criança e o mundo do adulto. (PINTO, 2003 apud, TEXEIRA, 2010, p.18).

Teixeira (2010) afirma que, na imaginação da criança, tudo pode tornar brinquedo, o lúdico está presente por aquele que brinca e enquanto durar a brincadeira. “Na brincadeira, a 11

criança não está apenas desenvolvendo comportamentos, mas manipulando as imagens, as significações simbólicas que constituem uma parte da impregnação cultural à qual está submetida”. (TEIXEIRA, 2010, p.19). Sabemos que é de suma importância que a escola dê espaço para o lúdico, pois são ações que levam a criança a divertir-se de forma prazerosa, gerando novas aprendizagens. O aprender e o lúdico são indissociáveis. Quando o educador permitir que a criança expresse suas vontades e age com intenção em relação ao brincar, o mesmo está permitindo que ocorram situações de aprendizagens. Na área da educação, entre outros aspectos, as atividades lúdicas são vistas como objeto e/ou ações que permitem às crianças se divertirem, ao mesmo tempo em que aprendem sobre algo. Assim, quando são intencionalmente criadas pelo adulto, com vistas a estimular certos tipos de aprendizagem, surge a dimensão educativa das situações lúdicas. Desde que mantidas as condições para a expressão do jogo, ou seja, a ação intencional da criança para brincar, o educador está potencializando as situações de aprendizagem. (KISHIMOTO, 2005, apud TEXEIRA, 2010, p.21).

Para a autora, enquanto a criança brinca, ela acaba buscando alternativas de ação, concentra a sua atenção na atividade e não em seus resultados e efeitos, por isso, damos importância da ação lúdica na prática pedagógica, pois através dela pode-se desenvolver diferentes habilidades que contribuem para aprendizagem e ampliam a rede de significados da criança. A criança desenvolve habilidade cognitiva e motora, explora sua realidade e a cultura na qual vive, incorporando a realidade ao mesmo tempo, transformando-a pela imaginação. De acordo com o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (1998): É preciso oferecer às crianças condições para as aprendizagens que ocorrem por meio das brincadeiras: “Educar significa proporcionar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação. (RCNEI, 1998, p.23).

Ao se deparar com o termo lúdico tão mencionado atualmente, sabemos que se trata de um assunto ou prática que, mesmo involuntariamente, surgiu há muitos anos. As atividades lúdicas criam oportunidades para que as crianças internalizem alguns conteúdos curriculares por meio daquilo que faz parte do seu cotidiano. “Brincar, porém, se coloca num patamar importantíssimo para a felicidade e a realização da criança, no presente e no futuro". (TELES, 1997, p.13). 12

Através do brincar a criança expressa sua vontade e desejo, colocando em prática a realidade em que vive, reproduzindo o presente e se preparando emocionalmente para o futuro, pois o brincar permite que a criança se posicione e enfrente suas realidades, proporcionando uma vida futura sadia. Criança que não brinca, que desenvolve, muito cedo, a noção do “peso” da vida, não tem condições de se desenvolver de maneira sadia. De alguma forma, esta lacuna irá manifestar-se em sua personalidade adulta. Se não se tornar completamente neurótica, perceberemos, em seu comportamento, traços neuróticos e até psicóticos e, muitas vezes, esta pessoa “carregará” sempre a vida como se esta fosse uma “provação”, um “sacrifício”, um “dever” a ser cumprido. Dificilmente conseguirá soltar-se, ser feliz com as pequenas coisas e sentir um prazer genuíno. (TELES, 1997, p.14).

De acordo com Teles (1997), brincando a criança coloca para fora todas suas emoções e personaliza os seus conflitos, a criança reproduz na brincadeira a sua própria vida, constrói o real e nesse momento do brincar ela demonstra suas preocupações mais íntimas e secretas. A brincadeira deve estar vinculada aos objetivos educacionais, o ambiente deve ser de liberdade e flexibilidade psicológica, de busca de prazer e de auto realização. […] Para que as brincadeiras infantis tenham lugar garantido no cotidiano das instituições educativas é fundamental a atuação do educador. É importante que as crianças tenham espaço para brincar, assim como opções de mexer no mobiliário; que possam, por exemplo, montar casinhas, cabanas, tendas de circo, etc. O tempo que as crianças têm à disposição para brincar também deve ser considerado: é importante dar tempo suficiente para que as brincadeiras surjam, se desenvolvam e se encerrem. (TELES, 1997, p.16).

A autora ainda ressalta que o adulto deve dar à criança não só a oportunidade de brincar, mas poder escolher seus próprios brinquedos, quando possível. O reconhecimento, o apoio e o incentivo, por parte de pais e professores, é essencial para o bom desenvolvimento da criança criativa, com autoestima, segura e equilibrada. “A criança que não brinca, não se aventura em algo novo, desconhecido. Se, ao contrário, é capaz de brincar, de fantasiar, de sonhar, está revelando ter aceito o desafio do crescimento, a possibilidade de errar, de tentar e arriscar para progredir e evoluir”. (LEBOVICI e DIATKINE,1985, p.7). Para Teles, o indivíduo criativo é importantíssimo, pois será um avanço para sociedade, fará descobertas, pesquisas, invenção e promoverá mudanças, isso só será possível se permitirem que as crianças brinquem e explorem suas criatividades. “As brincadeiras aprofundam para a criança a compressão da realidade, ao mesmo tempo que estimulam a imaginação, condições básicas para se poder ser criativo”. (TELES,1997, p. 21). 13

Ao brincar a criança, tem o seu momento de criatividade, ela se descobre, inventa, constrói e etc. Neste espaço de tempo a mesma está estimulando sua imaginação. Sabemos que é de suma importância para que transformemos as nossas crianças em seres humanos mais criativos e que sejam capazes de gerar grande revolução para sociedade, isso só será possível se tivermos a consciência da importância do brincar. O brincar também possibilita às crianças desenvolverem suas próprias habilidades de pensamento. Elas superam a sua própria condição infantil, agindo como se fossem maiores, desafiando seus limites, “uma necessidade de agir como um adulto surge na criança, isto é, de agir da maneira como ela vê os outros agirem, da maneira que lhe disseram e assim por diante”. (LEONTIEV, 2001, p.125 apud TEIXEIRA, 2010, p. 48).

De acordo com a autora, a criança através da brincadeira se comporta além do seu comportamento diário e do que está habituada, a mesma tem a liberdade de se expressar. Ela se transforma como se fosse adulto, ela supera seus limites, traz para a brincadeira a realidade de vida. Podemos dizer que, mesmo quando brinca espontaneamente, a criança não está só passando o tempo, sua escolha é motivada por razões e realizações internas, a criança expressa seus desejos e ansiedades, conforme ela vai imaginando, suas atividades vão sendo desenvolvidas. Ao brincar a criança interage com meio e mesmo quando não entendemos o que a criança está brincando, devemos respeitar e não impedir a brincadeira, pois nesta hora ela funciona como linguagem secreta. “Através do brincar, a criança expressa suas fantasias, seus sentimentos, suas ansiedades e suas experiências”. (MARCELLINO, 1999, p. 30). Ao brincar a criança está desenvolvendo, aprende a fazer, aprende a conhecer, a conviver e a ser, vai aprendendo a seguir regras, socializa, vai descobrindo o mundo ao seu redor. Para que uma criança possa tomar contato com sua capacidade de aprender e criar é preciso que lhe seja autorizado construir e des-construir através da experiência que lhe é mais significativa: o brincar. Desmanchar a torre de blocos e reconstruí-la de forma diferente é uma brincadeira relacionada ao ato de conhecer, pois este implica em poder derrubar ideias, inquietar-se diante das situações da vida, aprender e produzir novas ideias. (HEINKEL, 2000, p. 9-10).

De acordo com a autora, fica claro que o brincar é valioso neste momento, na construção do ser infantil, é importante para que a criança tenha liberdade de manusear os brinquedos, construir e desconstruir, isso possibilita à criança criar novas ideias, se posicionar diante de certas situações e resolver problemas. 14

É muito importante que a criança da escola infantil brinque, porque essa atividade é a mais importante

na

estruturação da dimensão cognitiva-objetivante

e desejante-

subjetivamente da criança. A brincadeira com blocos, barrinhas está relacionada com a estruturação cognitiva desse ser infantil, quando procura compreender como é o mundo em que vive. Em outras brincadeiras, como “brincar de casinha”, “pintar e desenhar”, “de carrinho” e “de médico”, está em jogo a busca de respostas para a questão da compreensão subjetiva do mundo. Nessas ações em que brinca, a criança recria e inventa novas realidades, reconstrói regras, é capaz de sonhar. (HEINKEL, 2000, p.16 -17).

De acordo com Heinkel (2000), é importante a brincadeira com vários brinquedos que contribuirá para a estruturação cognitiva da criança, pois precisa ser considerado o momento em que a criança expressa e organiza sua personalidade e a compreensão que tem do mundo. Já para Fontana e Cruz (1997), brincar é uma atividade fundamental da criança, ela brinca na rua, em casa, na escola. Pela brincadeira, ela fala, pensa, elabora sentidos para o mundo, para as coisas, para as relações. Pela brincadeira, objetos e movimentos são transformados. O meio social em que a criança vive são elaborados, revividos, compreendidos. Brincando de casinha, de bolinhas, de médico, de escolinha, de amarelinha e etc., através das brincadeiras a criança se relaciona com outros companheiros, e assim, vai dando sentido às coisas da vida. “A brincadeira não é assim por nada, sem sentido nenhum. Porque toda brincadeira tem uma aprendizagem, no brincar ela aprende.” (HEINKEL, 2000, p. 21). Na brincadeira a criança aprende e constrói seus conhecimentos, cria um mundo imaginário, só seu, ou seja, neste momento o real é agregado ao mundo imaginário da mesma, mas de uma forma mais espontânea. Onde a criança vive para si, podendo se transformar no que quiser, levando-a criar e resolver várias situações. “Brincar é fonte de lazer, mas é, simultaneamente, fonte de conhecimento; é esta dupla natureza que nos leva a considerar o brincar como parte integrante da atividade educativa”. (TEIXEIRA, 2010, p. 44). Segundo Teixeira (2010), o brincar é uma situação em que a criança realiza, constrói e se apropria de conhecimentos das mais diversas formas. Ela possibilita, igualmente, a construção de categorias e ampliação dos conceitos das várias áreas do conhecimento, brincar assume um papel didático e pode ser explorado pela pedagogia. Assim, o brincar não significa simplesmente divertir-se, isso porque é a maneira mais completa com que a criança comunica-se consigo mesma e com o mundo, produzindo conhecimento. 15

Enfim, de acordo com Teles (1997, p.15), “brincar, acima de tudo brincar com liberdade, é uma das condições para estimular, principalmente, a criatividade”. Teixeira (2010) aborda diferentes tipos de brincadeiras como: amarelinhas, rouba bandeira, estátua e entre outras que favorecem diversas áreas cognitivas, social, perceptivomotora, afetivo-emocional, linguagem e moral. Essas áreas favorecidas são estimuladas pela liberdade das atividades, importantes para que a ação do brincar aconteça de forma lúdica.

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2. AS DESCOBERTAS DE ARIÈS

Philippe Ariès, em seu livro: História Social da Criança e da família (1981), relata a vida da criança na Idade Média e fica claro que não existia nenhum sentimento ou apreço pela infância. Quando a criança mostrasse alguma independência, imediatamente seria inserida no mundo do adulto, que era determinado na época quando “a criança deixava o cueiro, ou seja, a faixa de tecido que era enrolado em torno de seu corpo, ela era vestida como homens e mulheres de sua condição”. (ARIÈS, 1981, p.69). A arte medieval foi essencial para compreendermos como a infância não era reconhecida e nem representada. As crianças, através das pinturas, eram vistas apenas numa escala mais reduzida que os adultos, não existiam crianças caracterizadas por uma expressão e traço particular. Os pintores não deixavam de expor as musculaturas abdominais e peitorais do adulto nas crianças em suas telas. Não existia nenhuma repugnância em demostrar seus trabalhos, não existia lugar para a criança naquela época. Até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la. É difícil crer que essa ausência se devesse à incompetência ou à falta de habilidade. É mais provável que não houvesse lugar para a infância nesse mundo. Uma miniatura otoniana do século XI nos dá uma idéia impressionante da deformação que o artista impunha então aos corpos das crianças, num sentido que nos parece muito distante de nosso sentimento e de nossa visão. (ARIÈS, 1981, p.50-51).

Na Idade Média, logo que a criança nascia e começava a falar era ensinado a ela o seu nome, o nome dos pais e sua idade. Era fundamental que a criança não errasse o seu nome, pois era importante para a sociedade daquela época. A criança assumia responsabilidades que caberiam ao adulto, mas como não existia uma preocupação e nenhum sentimento de infância, era possível ver as crianças participando o tempo todo da vida do adulto. “Isso sem dúvida significa que os homens dos séculos X-XI não se detinham diante da imagem da infância, que esta não tinha para eles interesse, nem mesmo realidade”. (ARIÈS, 1981, p.52). Segundo Ariès (1981), o traje da Idade Média comprovava como a infância era desvalorizada e tão pouco particularizada na vida real. A criança ao nascer já se vestia como mulheres e homens da época. Esse vestido em forma de sotaina não era a primeira roupa da criança depois que ela deixava o cueiros. Voltemos ao retrato das crianças Habert, de Philippe de Champaigne. François, que tem um ano e 11 meses, e o caçula, de oito meses,

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vestem ambos exatamente como sua irmã, ou seja, como duas mulherzinhas: saia, vestido e avental. Este era o traje dos meninos menores. Tornara-se hábito no século XVI vesti-los como meninas, e estas, por sua vez, continuavam a se vestir como as mulheres adultas. (ARIÈS, 1981, p.71).

Na época, não existia uma diferenciação em relação aos trajes conforme fases da vida (bebê, criança, adolescentes e adultos), meninas e meninos menores usavam o mesma roupa. E as meninas eram vestidas como as mulheres adultas. Podemos imaginar as crianças com todas essas roupas, que com certeza era difícil até mesmo para elas se locomoverem, mas era importante para a época, até para manter a hierarquia. Após o século XIII e XVII começa a surgir uma preocupação com esses seres frágeis que antes não eram importantes e nem reconhecidos. Segundo Ariès (1981), as famílias começam a vacinar suas crianças evitando a varíola e passam a surgir, também as preocupações com a prática de higiene. Esses cuidados provocam uma redução da mortalidade infantil e começa a existir um controle da natalidade cada vez mais difundido. No século XVII ocorre uma evolução em relação ao tema da primeira infância, os retratos de crianças sozinhas se tornam numerosos e comuns. Assim começa a existir a interação, afetividade, brincadeira e carinho, um contato familiar, “Mas os sinais de seu desenvolvimento tornaram-se particularmente numerosos e significativos a partir do fim do século XVI e durante o século XVII. (ARIÈS, 1981, p. 65). Ariès, salienta que surge então um novo sentimento da infância que podemos chamar de “paparicação” em que a criança por ser um ser ingênuo, graciosa e gentil, se tornava fonte de distração e de diversão para o adulto. Esse sentimento surge no meio familiar, através das mães e amas que eram responsáveis em cuidar das crianças, a mesma passa a ser muito mimada. Começam a mudar os trajes das crianças, adotando traje mais apropriado para sua idade, respeitando a fragilidade e inocência infantil. Ariès (1981, p.158), aponta: A ama se alegra quando a criança fica alegre, e sente pena da criança quando esta fica doente; levanta-o quando cai, enfaixa-a quando se agita e a limpa quando se suja”. Ela educa a criança “e a ensina a falar, pronunciando as palavras como se fosse tatibitate, para ensiná-la melhor e mais depressa... ela carrega a criança nos braços, nos ombros ou no colo, para acalmá-la quando chora; mastiga a carne para a criança quando esta ainda não tem dentes, para fazê-la engolir sem perigo e com proveito; nina a criança para fazê-la dormir, e enfaixa seus membros para que não fique com nenhuma rigidez no corpo, e a banha e a unta para nutrir sua pele [...]

Segundo o autor, as mães e as amas sempre tiveram um encantamento pelas crianças, mas não podiam ser expressos. Com o novo sentimento não deixaram de demonstrar o prazer 18

provocado pelas maneiras das crianças pequenas e, a partir desse sentimento, a criança passa a ser paparicada e todo cuidado é voltado para a mesma. Esse sentimento passou a incomodar os moralistas e educadores do século XVII, para eles as crianças tornaram-se mal educadas e viam a necessidade de fazê-las pessoas honradas e disciplinadas. “Esses moralistas haviam-se tornado sensíveis ao fenômeno outrora negligenciado da infância, mas recusavam-se a considerar as crianças como brinquedos encantadores, pois viam nelas frágeis criaturas de Deus que era preciso ao mesmo tempo preservar e disciplinar.” (ARIÈS, 1981, p.164). Com a mudança em relação ao sentimento de infância, começa a surgir uma preocupação com a característica infantil e, o que antes era considerado natural, é rompido, começando então todo cuidado com a criança. A mesma tem uma atenção diferente, cada vez mais paparicada pelos adultos ao seu redor por considerá-la ingênua, inocente e graciosa. Sentimento este que surgiu do meio familiar principalmente das mães e amas. Salienta Ariès (1981, p.163) que: O primeiro sentimento da infância – caracterizado pela “paparicarão” – surgiu no meio familiar, na companhia das criancinhas pequenas. O segundo, ao contrário, proveio de uma fonte exterior à família: dos eclesiásticos ou dos homens da lei, raros até o século XVI, e de um maior número de moralistas no século XVII, preocupados com a disciplina e a racionalidade dos costumes. (Grifo do autor).

A preocupação com a moralização separa a criança do adulto por ser um ser incompleto e imperfeito que precisa ser disciplinada e não se corromper com o mundo dos adultos. Esse sentimento surge de fora do meio familiar: de um grupo de pessoas que se preocupam em preservar os costumes daquela época. Através dessa preocupação dos moralistas, surge outro sentimento que podemos chamá-lo de “moralização”, era tão novo quanto a “paparicação”, esse sentimento via a importância de separar as crianças dos adultos, porque essa mistura permitiu que elas se tornassem mimadas e mal-educadas e que era preciso discipliná-las e torná-las adultos bem-educados e honrados. Passa a existir um interesse psicológico e moral da criança e esse sentimento acaba se espalhando tanto na cidade, quanto no campo, na burguesia e por todo povo. E entre os moralistas e os educadores do século XVII que vemos formar-se esse outro sentimento de infância que estudamos no capítulo anterior e que inspirou toda educação até o século XX, tanto na cidade como no campo, na burguesia como no povo. O apego à infância e à sua particularidade não se exprimia mais através da distração e brincadeira, mas através do interesse psicológico e da preocupação moral. (ARIÈS,1981, p.162).

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Surge também a preocupação com a higiene e a saúde física, mas não havia interesse pelo corpo dos que gozavam de boa saúde, o objetivo era moral, um corpo que não se inclinava à moleza, à preguiça e a todos os vícios. Enfim, a partir desses sentimentos, tudo que se referia à criança e à família torna-se um assunto sério e digno de atenção, desde a “paparicarão” até a educação. “Não apenas o futuro da criança, mas também sua simples presença e existência eram dignas de preocupação - a criança havia assumido um lugar central dentro da família”. (ARIÈS, 1981, p.164). Assim, podemos refletir através de Ariès (1981) que, com essas mudanças na Idade Média, a criança deixou de ser inserida com os adultos e de aprender a vida através dessa relação com o mesmo. A família passa a ter uma cumplicidade nesse processo, se responsabilizando com a proteção e formação da criança.

2.1. História da contribuição dos jogos e das brincadeiras Ariès (1981), no capítulo sobre a “Pequena contribuição à história dos jogos e brincadeiras”, relata como era a vida das crianças no século XVII, como eram suas brincadeiras, e que etapas de seu desenvolvimento físico e mental cada uma delas correspondiam. Não existia separação entre as crianças reais, legítimas ou bastardas, todas tinham o mesmo tratamento que todas crianças nobres. Graças ao diário do médico Heroard, podemos imaginar como era a vida de uma criança no início do século XVII, como eram suas brincadeiras, e a que etapas de seu desenvolvimento físico e mental cada uma deles correspondia. Embora essa criança fosse um Delfim de França, o futuro Luís XIII, seu caso permanece típico, pois na corte de Henrique IV as crianças reais, legitimas ou bastardas, recebiam o mesmo tratamento que todas as outras crianças nobres, não existindo ainda uma diferença absoluta entre os palácios reais e os castelos fidalgos. (ARIÈS, 1981, p.82).

No século XVII, a criança com um ano e cinco meses, aprendia a tocar violino e a cantar ao mesmo tempo. É possível imaginar que o canto, a música e a dança eram ensinadas muito cedo e estavam sempre presente no cotidiano das famílias, pois eram muito importantes para a sociedade nessa época. Luís XIII nasceu a 27 de setembro de 1601. Seu médico Heroard deixou-nos um registro minucioso de todos os seus feitos e gestos. Com um ano e cinco meses, Heroard registra que o menino “toca violino e canta ao mesmo tempo”. Antes, ele contentava com os brinquedos habituais dos pequeninos, como cavalo de pau, cata

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vento ou pião. Com um ano e meio, porém já lhe colocam um violino nas mãos: o violino ainda não era um instrumento nobre, era a rebeca que acompanhava as danças nas bodas e nas festas das aldeias. De toda forma percebe-se a importância do canto e da música nessa época. (ARIÈS, 1981, 83).

O autor ressalta que, as gravuras e as pinturas dos séculos XVI e XVII representam as crianças muito cedo misturando-se com os adultos, ainda tão pequenas, elas apareciam jogando vários tipos de jogos com os mesmos. “Ainda com a mesma idade, o menino joga malha: “Num jogo de malha, o Delfim errou o lance e feriu M. de Longueville”. Isso equivaleria a vermos hoje um inglesinho começando a jogar críquete ou golfe com um ano e meio de idade”. (ARIÈS, 1981, p.83). De acordo com o autor, as crianças sempre estiveram com os adultos: participavam das mesmas brincadeiras das mesmas diversão, não havia tempo e espaço distintos para ambos. Ainda pequeninas, era ensinada elas a falar, ensinando sílabas separadamente, antes de dizer as palavras. Diferente do nossos dias atuais, onde a criança começa a ser alfabetizada ao entrar na Educação Infantil. Muito cedo as crianças eram afastadas dos brinquedos da primeira infância e se misturavam cada vez mais com os adultos. “O culto monárquico separava mais cedo – na realidade, desde a primeira infância - o pequeno príncipe dos outros mortais, mesmo os de berço nobre”. (ARIÈS,1981, p.83). É possível ver as crianças participando também das festas e das comemorações tradicionais da época como as festas natalinas, elas dançavam e cantavam como os adultos. Era comum ver também nas festas, adultos e crianças brincando com o mesmos brinquedos, pois era destinados para ambos. A música e a dança continuavam a ocupar um lugar importante nas festas e na sociedade. Ao mesmo tempo que brincava com bonecas, esse menino de quatro e cinco anos praticava o arco, jogava cartas, xadrez (aos seis anos) e participava de jogos de adultos, como jogo de raquetes e inúmeros jogos de salão. Aos três anos, o menino já participava de um jogo de rimas, que era comum às crianças e aos jovens. (ARIÈS, 1981, p.86).

O autor ressalta que, no início do século XVII, jogos e brincadeiras eram o mesmo, tanto para o adulto quanto para criança sem separação por idade, condições sociais e etc, como já relatamos. Hoje sabemos que existem brincadeiras e jogos apropriados para cada idade, principalmente aqueles que podem causar alguns danos para o homem. Porém, naquela

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época não existia essa preocupação, então é possível ver ambos envolvidos na mesma diversão. O romancista e historiador Sorel escreveria um tratado sobre os jogos de salão destinados aos adultos. Mas aos três anos, Luís XIII participava de um jogo de rimas a aos seis, jogava o jogo dos ofícios e brincava de mímicas, brincadeiras estas que ocupavam um lugar importante na Maison des jeux de Sorel. Aos cinco anos ele joga cartas. Aos oitos, ganha um prêmio numa rifa, jogo de azar em que as fortunas costumavam trocar de mãos (ARIÈS, 1981, p.88).

De acordo com Ariès (1981), os jogos de azar que hoje são considerados proibidos para as crianças, antes eram praticados e permitidos pelos adultos, sem preocupação com a infância e com a moral da mesma. “Não se sentia nenhuma repugnância em deixar as crianças jogar, assim que se tornavam capazes, jogos de cartas e de azar, e a dinheiro”. (ARIÈS, 1981, p.92). Teixeira (2010), também ressalta, que na Idade Média, jogos e brincadeiras eram comuns a toda sociedade sem distinção de idade ou classe social, era um meio de promover a coletividade e estreitar laços de união, que acontecia nas grandes festas sazonais e tradicionais. Como aponta Ariès, (1981, p.92): Os pintores caravegescos do século XVII muitas vezes retrataram grupos de soldados jogando excitadamente em tavernas mal afamadas: ao lado dos velhos soldados, veem-se meninos muito jovens, de 12 anos talvez, e que não aparecem ser os menos animados. Uma tela de S. Bourdon representa um grupo de mendigos em torno de duas crianças, observando-as jogar dados.

O tema das crianças jogando a dinheiro jogos de azar ainda não chocava a opinião pública e, através da iconografia, ressalta Ariès que era possível encontrar cenas de velhos, soldados e mendigos, observando as crianças jogar. Ariès (1981, p.104), ressalta: Essa atitude nos aparece sob dois aspectos contraditórios. De um lado, os jogos eram todos admitidos sem reservas nem discriminação pela grande maioria. Por outro lado, ao mesmo tempo, uma minoria poderosa e culta de moralistas rigorosos os condenava quase todos de forma igualmente absoluta, e denunciava sua imoralidade, sem admitir praticamente nenhuma exceção. A indiferença moral da maioria e a intolerância de uma elite educadora coexistiram durante muito tempo. Ao longos séculos XVII e XVIII, porém, estabeleceu-se um compromisso que anunciava a atitude moderna com relação aos jogos, fundamentalmente diferente da atitude antiga.

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Ao longo dos séculos XVII e XVIII surge então uma atitude moderna com relação aos jogos, totalmente diferente da atitude daquela época. Um novo sentimento de infância nasce: uma preocupação que antes jamais existiu, preservar sua moralidade e também educá-la. Proibindo os jogos classificados como maus, os jogos tido como de azar e passam ser recomendados os jogos reconhecidos como bons. [...] hoje consideramos os jogos de azar como suspeitos e perigosos, e o dinheiro ganho no jogo como a menos moral e a menos confessável das rendas, Continuamos a jogar esses jogos de azar, mas com consciência pesada. Ainda não era assim no século XVII: a consciência pesada moderna resultou do processo de moralização em profundidade que fez da sociedade do século XIX uma sociedade de “conservadores”. (ARIÈS, 1981, p.105) (Grifo do autor).

Na sociedade atual, sabemos que os jogos de azar, são ilegais mas, ainda são praticados por muitos, mesmo sabendo que são suspeitos e perigosos. De uma forma geral, os jogos de azar trazem grande prejuízo para a sociedade, pois levam a muitas consequências como: as pessoas deixam de ser solidárias e começam a pensar em si próprias e não se comovem com o próximo, porque o que está em jogo é o dinheiro. Dependendo da perda do mesmo, leva à aflição e tristeza do outro. Sabemos que alguns jogadores tornam-se corruptos e o desejo de ficar cada vez mais rico é notável, passando dos limites e não se importando se vai trazer ruinas para as outras pessoas. Sem contar que dependendo do jogo, leva a gerar ódio entre as pessoas e alguns levando até à morte. “Mas cuidado para não arruinar os próprios amigos: por mais que ponderemos, sempre resta algo em nosso coração contra aqueles que nos arruinaram”. (ARIÈS, 1981, p. 107). No século XVII, não existia essa preocupação, os jogos de azar não provocavam nenhuma reprovação moral e achavam que não eram prejudiciais às pessoas, o que levou a uma sociedade conservadora. De acordo com Ariès (1981, p.108), Do século XVII até nossos dias, a atitude moral com relação aos jogos de azar evolui de maneira bastante complexa: à medida que se difundia o sentimento que o jogo de azar era uma paixão perigosa, um vício grave, a prática tendeu a modificar alguns desses jogos, reduzindo o papel do azar-que no entanto ainda subsiste-em benefício do cálculo e do esforço intelectual do jogador: dessa forma, certos jogos de carta e de xadrez tornaram cada vez menos sujeitos à condenação que atingia o princípio do jogo de azar.

A práticas dos jogos passam a ser eliminadas dos colégios, que durou vários séculos de existência e que foram sendo admitidos como imorais e viciosos. Os jogos que beneficiam 23

o cálculo e o esforço intelectual como: xadrez e de cartas, ganham espaço e são cada vez mais praticados. Já os considerado jogos de azar, perigoso e viciante, foram reduzindo. Os jogos eram paixão considerada por todos, criança, adulto, idosos, pobres e ricos. A igreja opôs uma reprovação absoluta, juntamente com leigos que eram apaixonados pelo rigor e pela ordem, lutaram para domar ainda uma massa que não aceitavam a ideia e para civilizar costumes primitivos. A igreja medieval também condenava o jogo sob todas as suas formas, sem exceção de reservas, e particularmente nas comunidades de clérigos bolsistas que deram origem aos colégios e às universidades do Ancien Régime. Os estatutos dessas comunidades nos dão uma idéia {sic} dessa intransigência. Ao lê-los, o historiador inglês das universidades medievais, J. Rashdall, ficou impressionado com a proscrição geral de todas as atividades de lazer, com a recusa em admitir que pudessem existir divertimentos inocentes, em escolas cujos alunos, entretanto, tinham basicamente entre 10 e 15 anos. Reprovava-se a imoralidade dos jogos de azar, a indecência dos jogos de salão, da comédia ou da dança, e a brutalidade dos jogos esportivos, que, de fato, muitas vezes degeneravam em rixas. (ARIÈS, 1981, p.109).

As proibições dos jogos provocaram muitas brigas, os jesuítas influenciaram com uma visão menos radical, mudando a situação, vão impondo pouco a pouco às pessoas de bem e aos amantes da ordem, especialmente após os humanistas do Renascimento terem percebido as possibilidades educativas do jogo, com a condição de que eles pudessem escolhê-los, regulamentá-los e controlá-los. “Assim disciplinados os divertimentos conhecidos como bons foram admitidos, recomendados e considerados a partir de então como meios de educação tão estimáveis quanto os estudos”. Ariès, (1981, p.112). A dança que era imoral, passa a ser introduzida e ensinada nos colégios, pois acreditava-se que ao harmonizar os movimentos do corpo, evitava a falta de graça e dava ao rapaz elegância e postura. Nos séculos XVI e XVII, essas proibições provocaram muitas brigas. Com o tempo, esse quadro mudou, principalmente sob a influência dos jesuítas. Foram eles que impuseram pouco a pouco uma opinião menos radical sobre o jogo aos amantes da ordem, especialmente após os humanistas do Renascimento terem percebido as possibilidades educativas do jogo, com a condição de que eles pudessem escolhêlos, regulamentá-los e controlá-los. “Assim disciplinados os divertimentos conhecidos como bons foram admi-tidos, recomendados e considerados a partir de então como meios de educação tão estimáveis quanto os estudos na educação.” Desta forma, a dança, os jogos de péla e os jogos de bola foram reconhecidos e ensinados nas escolas. Mas, o jogo de péla, que foi por muito tempo o jogo mais popular e comum a todas as condições sociais, acabou-se entre a nobreza no fim do século XVII. Essa atitude de reprovação absoluta modificou-se contudo ao longo do século XVII, e principalmente sob a influência dos jesuítas. Os humanistas do Renascimento, em sua reação antiescolástica, já haviam percebido as possibilidades educativas dos jogos. Mas foram os colégios jesuítas que impuseram pouco a pouco às pessoas de bem e amantes da ordem uma opinião menos radical com relação aos jogos. (ARIÈS, 1981, p. 112).

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Ariès (1981) descreve o surgimento de um novo sentimento: os colégios adotaram os jogos considerados um mal menor. Os jesuítas editaram tratados de ginástica que forneciam as regras dos jogos recomendados, assim ganharam espaço os jogos de exercícios físicos em que o corpo está em total movimento, pois viam a felicidade nas crianças quando podiam movimentar-se. Passa a existir uma preocupação com a higiene corporal: a cultura física. “É necessário que o corpo humano se agite muito enquanto cresce... Considero que os jogos que incluam exercícios devem ser preferidos a todos os outros”. (ARIÈS, 1981, p.113). No fim do século XVIII, enxergaram outros benefícios em relação aos jogos de exercício, que era preparar os rapazes para guerra. “Estabeleceu-se um parentesco entre os jogos educativos dos jesuítas, a ginastica dos médicos, treinamento do soldado e a necessidade do patriotismo”. (Ariès, 1981, p.113). Toda essa evolução passa a ter um fim: a preocupação com a moral, a saúde e bem comum de toda a sociedade.

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3. O BRINCAR NO CONTEXTO ESCOLAR

Falar da educação da criança sem dar importância do brincar é negligência, a escola precisa considerar o lúdico. Sabemos que está acontecendo um vazio dessa prática, as crianças não estão tendo espaço para se desenvolver culturalmente, pois a escola tem que ter a consciência que o brincar é um processo que contribui para o desenvolvimento da criança. Vemos a importância do brincar juntamente com o ambiente escolar, pois ambos são indissociáveis. Se isso acontece estamos negando às crianças o seu direito de serem quem são, indivíduos em desenvolvimento, que vão se construindo através da ludicidade. “A escola tem dado sua contribuição, digamos eficaz, com relação ao furto do lúdico, em especial quando se considera cultura da criança.” (MARCELLINO, 2012, p.75). Marcellino (2012), afirma que, raramente a atividade lúdica é considerada pela escola e, quando isso ocorre, as propostas são carregadas pelo objetivo “educativo”, que perdem as possibilidades de realização do brinquedo, da alegria, da espontaneidade. Mesmo nos intervalos, as filas para o lanche, banheiro, o acesso ao pátio etc., dificultam o brincar. Mal ele começa, já é hora de voltar para sala de aula. O autor ressalta a importância que a escola deve dar para o momento do brincar e que ele venha acontecer não somente na hora que é permitido às nossas crianças, mas também em outros momentos, sobretudo no pátio, filas, banheiro e intervalos, onde as brincadeiras acontecem de formas espontâneas e que levam as crianças a um momento de realização e alegria. Na escola, desde cedo, a criança também tem a necessidade de buscar como forma de socialização e de interação com a experiência sócio-histórica, dos adultos e do mundo por eles criado. Dessa forma, a brincadeira é uma atividade humana na qual as crianças são introduzidas, constituindo-se em um modo de assimilar e recriar a experiência sociocultural dos adultos. (WAJSKOP, 2007 apud TEIXEIRA, 2010, p.63).

De acordo com a autora, nas brincadeiras as relações sociais são reproduzidas nas relações das crianças entre si e interagem com suas experiências vividas, assim as mesmas vão assimilando e recriando situações sociais. Teixeira (2010) diz que, embora algumas escolas permitam que o brincar aconteça com a criação de brinquedotecas, espaço criado para promover brincadeiras espontâneas ou dirigidas, visando o desenvolvimento e a aprendizagem global da criança, os educadores se preocupam em cumprir os objetivos estipulados pelos programas escolares. Com isso o 26

brincar fica restrito aos intervalos entre as atividades. Não deveria ser assim, pois é fácil notar que as crianças não têm mais lugar para brincar; grande parte delas vive fechada em condomínios, prédios ou casas sem quintal. Por isso, encontrar na escola uma oportunidade de brincar, além de realizar as atividades curriculares, é também encontrar um espaço para um desenvolvimento saudável, como propõe Friedman (2006). (TEIXEIRA, 2010, p.64).

Para a autora, o brincar deve fazer parte das atividades curriculares, especialmente na Educação Infantil e no Ensino Fundamental. É importante também ter um tempo preestabelecido durante o planejamento em sala de aula para selecionar brinquedos que levem os alunos a transformarem, criarem e ressignificarem sua realidade, estimulando a criatividade, a tomada de decisão, a resolução de problema e a cooperação no trabalho em grupo. De acordo com Teixeira (2010, p.68.) “No cotidiano escolar, o brincar tem sido pouco presente, e é essa questão que os pesquisadores da área do lúdico querem resgatar. Pensar na atividade lúdica como meio educacional significa menos “brincar por brincar” e mais o brincar como instrumento de trabalho de trabalho, como meio para atingir os objetivos preestabelecidos”. A autora ainda ressalta que cabe às instituições de Educação Infantil criarem oportunidade de tempo e espaço, disporem de materias adequado e o educador ter conhecimentos sobre o brincar, pois a brincadeira é uma atividade que deve ser incentivada na Educação Infantil. Vemos a importância de valorizar a ação da criança quando está brincando e de profissionais conscientes para interagirem e organizarem o espaço de modo que contribuam para que essa ação venha a acontecer. “Para Teixeira, a atividade lúdica dirigida ocupa um lugar proeminente no desenvolvimento cognitivo, afetivo, social, linguístico, na motricidade e na construção de regras e valores do educando”. (TEIXEIRA, 2010, p.77). De acordo com Teixeira (2010), acreditamos que todo jogo infantil é educativo, até mesmo quando livre, na medida que tem um papel importante no desenvolvimento da criança, pois a criança da pré escola aprende de modo intuitivo, adquire noções espontâneas, em processos interativos, que a envolvem por inteiro, sua cognição, afetividade, corpo e interações sociais. No contexto da educação, em especial no período denominado Educação Infantil, observamos que as crianças procuram compreender o mundo adulto fazendo uso de alguns objetos, transformando-os de acordo com suas necessidades, para representar

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situações já vivenciadas ou pessoas de seu convívio. É uma forma de a criança ir entrando no mundo adulto pouco a pouco, elaborando e reinventando a realidade a partir da fantasia. (TEIXEIRA, 2010, p,47).

De acordo com a autora, a criança quando está brincando, pode se tornar algo que não é, ou seja, que ainda não é, mas que por meio da brincadeira a criança pode ser tudo o que imaginar, agir com objetos substitutivos e assim a mesma vai se aproximando de sua realidade. De acordo com Marcellino (2012, p.89), A negação da possibilidade da vivência do lúdico pelas crianças, sua não consideração pela Escola, contribui para que essa colabore não na montagem de um verdadeiro “teatro infantil”, onde “atores “interagem, criam coletivamente, mas sim de um “teatro de bonecos”, onde são encenados, diariamente, tristes espetáculos de ventriloquia. Recorrendo a Paulo Freire e a Sartre, Rubens Alves (1982b, p.63) nos lembra que “... o que caracteriza o oprimido é a sua incapacidade para, o medo de falar. Teme o autor, e do meu ponto de vista, seu temor é bastante justificado e embasado na experiência cotidiana escolar, que a Escola esteja contribuindo para a formação de bonecos “incapazes de dizer sua própria palavra” (ibid., p.64). Dessa forma, as crianças deixam de ser atores, com “alma” própria e passam a ser “animados”, como marionetes, ou manipulados por ventríloquos, que falam por elas, camuflando, fingindo que os sons saem de suas bocas. E isso do primário à Universidade.

O autor chama a atenção para refletirmos a falta que o lúdico pode acarretar na vida das crianças, a escola deve atentar para que o mesmo venha a estar sempre presente no contexto escolar, isso deve ser considerado para que possamos desenvolver crianças capazes de reagir frente à realidade. A escola ao propor atividades sem sentido, pelo menos aos olhos das crianças, principalmente na Educação Infantil, não estará contribuindo para que isso ocorra. A brincadeira, a fantasia e a imaginação são componentes importantes através da brincadeira infantil, na qual a criança se apropria do mundo real dos seres humanos. (TEIXEIRA, 2010). A autora ainda afirma que, na escola, o principal propósito é sugerir ideias, fazer fluir a imaginação e ultrapassar os limites da criatividade. Quando a criança brinca no espaço escolar, trata-se de um pedaço da cultura lúdica da criança, dentro de uma esfera real e imaginária vivenciada no momento do brincar. “Creio que a recuperação do lúdico pela escola, enquanto agência de educação, seria como redescobrir o sentido das próprias palavras: ludus, em sentido próprio significa jogo, divertimento e, por extensão, Escola, aula”. (MARCELLINO, 2012, p.93). Teixeira (2010) atenta para a recreação na escola, a mesma seria um descanso do 28

espírito, que o brincar aconteça de forma espontânea, não devendo ser associado à ideia de prêmio ou castigo. A autora Froebel (2001) deixou claro que a brincadeira através de jogos constitui o alto grau de desenvolvimento da criança, a manifestação espontânea e natural do mundo intuitivo, provocada por uma necessidade interior. Quando brinca a criança está imersa em um mundo de alegria, paz e harmonia, proporcionados pelo brincar espontâneo. O papel da escola, do professor, seria trabalhar a criança nessa zona de desenvolvimento potencial, provocando avanços que não ocorreriam espontaneamente. Pensar a escola de educação infantil como espaço de conhecimento nos leva à necessária criação de situações organizadas pela ensinante para que as crianças aprendam e desenvolvam suas capacidades. (HEINKEL, 2000, p.29).

Vemos a importância dos profissionais da educação, instigarem as crianças através das brincadeiras, através do lúdico, criando situações que as levem a desenvolverem suas capacidades e adquirirem novos conhecimentos. As autoras ressaltam que na escola as brincadeiras ficam muito vinculadas a seus objetivos didáticos, sendo negada, pois brincar é uma forma aprender, privilegiando-se assim a atividade cognitiva implícita na brincadeira, em detrimento de seu caráter lúdico. E na escola existe o professor, que é o adulto que conduz intencionalmente as relações de ensino, de acordo com objetivos e concepções didáticos-pedagógicos. Concepções e objetivos que constituem, ao mesmo tempo, o crivo de seleção das atividades apresentadas às crianças e a “lente” com qual ele focaliza o que elas fazem e dizem. Diferentemente do adulto que em casa vê a criança brincar, ou brinca com ela e para ela, “experimentando com o acaso” (Novalis), o professor relaciona-se com a brincadeira como um procedimento previsto em seu plano de ação com as crianças. (FONTANA e CRUZ, 1997, p.136-137).

Podemos refletir através da leitura das autoras que, o brincar na escola é diferente, o adulto tem uma intenção juntamente com o ensino através do brincar, observando sempre a criança e, através de seu comportamento frente à brincadeira, é possível notar como a criança está se desenvolvendo e intervir ajudando na construção de novos conhecimentos. Daí a importância da escola desenvolver brincadeiras que estimulem a criança a ser criativa e levá-la a exploração, pois brincadeiras através dos jogos incitam a atividade da mesma e acabam elaborando outras possibilidades e modos de brincar com elas. É importante à escola ter material disponível à exploração das crianças, constituído basicamente por jogos pedagógicos como: quebra-cabeça, jogos de encaixe e montagem, placas de alinhavo, etc. 29

Brincar é, sem dúvida, uma forma de aprender, mas é muito mais que isso. Brincar é experimentar-se, relacionar-se, imaginar-se, expressar-se, compreender-se, confrontar-se, negociar, transformar-se, ser. Na escola, a despeito dos objetivos do professor e de seu controle, a brincadeira não envolve apenas a atividade cognitiva da criança. Envolve a criança toda. É pratica social, atividade simbólica, forma de interação com o outro. Acontece no âmago das disputas sociais, implica a constituição do sentido. É criação, desejo, emoção, ação voluntária. Quando perde sua dimensão lúdica, sufocada por um uso didático que a restringe a seu papel técnico, a brincadeira esvazia-se: a criança explora rapidamente o material, esgotando-o. Isso se dá quando, em vez de aprender brincando, a criança é levada a usar o brinquedo para aprender. (FONTANA e CRUZ, 1997, p.139).

Teixeira (2010) ressalta que, apesar de sabermos da importância dos jogos, brinquedos e das brincadeiras para o desenvolvimento das crianças, essas atividades são barradas no espaço dentro das escolas. “A grande preocupação é preparar o aluno para o processo de alfabetização e desenvolver suas habilidades cognitivas. Neste sentido, a civilização tem se preocupado com a formação de novos indivíduos, moldando suas habilidades produtivas e racionais.” (TEIXEIRA, 2010, p.37). Levando em conta que o brincar é um processo que proporciona um modo de aprendizagem e resulta em comportamentos lúdicos, estes, em si mesmos, não constituem um currículo e sim um meio valioso para iniciar, promover e sustentar a aprendizagem dentro de uma estrutura curricular, pois de acordo com a autora, encorajar o brincar como um meio de aprendizagem e manter a motivação e o interesse por meio do brincar são estratégias equivalentes à instrução direta. Cabe então à escola dentro desta perspectiva, cuidar para que a elaboração do currículo apresente estratégias que integrem a importância do brincar e das atividades lúdicas no processo educacional das crianças. É possível, no entanto, fazer do jogo um momento de conhecimento e de convivência com as crianças, que nos permite a conhecer seus modos e percursos de apropriação e elaboração do mundo, pois podemos voltar nosso olhar não apenas para aquilo que elas fazem, mas para o como elas fazem. Quais as elaborações das crianças? Em que medida respeitam ou transformam o projeto, a estrutura e a tática do jogo? Que associações de idéias {sic} elas fazem no transcorrer da brincadeira? O que se mostra significativo para elas? Que elementos se tornam subitamente personagens, passando a agir por conta própria? Durante a brincadeira, o que elas dizem, a quem, quando, como? Como se relacionam com o outro (real ou imaginado)? (FONTANA e CRUZ, 1997, p.141).

Precisamos de uma atenção acerca da criança e da prática, buscar um novo sentido para o trabalho pedagógico: conhecer a criança para trabalhar com ela, para brincar com ela, para aprender com ela. 30

3.1 Metodologia

Guiados pela experiência da observação, com objetivo de compreendermos ainda mais sobre a importância do brincar na vida das crianças, realizamos uma pesquisa de campo, fora do ambiente escolar, ou seja, em um Parque Ecológico no município de Capivari/SP, em três momentos nos dias 27, 28 e 07, das 14h às 17h, capturando em registro de diário de campo, diferentes tipos de brincadeiras, que geraram, na convivência entre as crianças o conflito e muito aprendizado. O horário de funcionamento do Parque Ecológico é das 6h às 18h, e possui um espaço bastante amplo, contendo várias repartições entre elas: dois parques com balanço, escorregador, gangorra e escalador, área de vôlei, dois campos de futebol, uma pista de skate e aparelhos de ginástica. Nosso registro foi elaboro em Diário de Campo, o qual, conforme Falkembach (1987) é constituído no registro completo e preciso das observações dos fatos concretos, detalhando os acontecimentos nas relações verificadas nas experiências pessoais do investigador, que possui liberdade para apontar as suas reflexões e seus comentários. O registro em diário de campo além de facilitar o estabelecimento do hábito da observação, da descrição e da reflexão com atenção dos acontecimentos na rotina escolar, também provoca o observador a questionar a prática, buscando compreender de maneira empírica aquilo que foi estudado na teoria. O foco principal foi observar as crianças que frequentaram e que elaboraram situações de brincadeira, em um espaço não escolar, com a justificativa de que o brincar é tão importante e significativo para a vida da criança que ela não deixa de fazê-lo um dia sequer, sendo algo que naturalmente é realizado e que, em alguns momentos, sem que a mesma perceba. Falkembach (1987) considera o diário de campo um dos principais instrumentos científicos de observação e registro e ainda, uma importante fonte de informação daquilo que se pretende pesquisar, pois os fatos registrados oferecem uma garantia singular da fidedignidade da observação. As brincadeiras realizadas pelas crianças são, reinterpretadas por Freinet (1969), que de fato as considera como uma manifestação espontânea do trabalho numa reinterpretação do mundo adulto, influenciadas certamente pela atmosfera intelectual do período histórico no

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qual vivem, o que nos deixa comovidos em perceber o significado e a necessidade da criança de estar inserida nas atividades do brincar. Dentre as três categorias que Freinet (1961) trata do trabalho, a terceira e última trata da manutenção, ou como o próprio autor se refere à reprodução do conhecimento humano, em que estão incluídas, de forma generalizada, as atividades de ensino e aprendizagem, ou seja, é nesses momentos em que os mais antigos, até mesmo os mais experientes, passam o seu conhecimento aos mais novos, na esperança de que sejam os sucessores em seus trabalhos, condição de existência gerada, não por menos, pelo brincar, o qual é grande responsável pelo manutenção da cultura do trabalho. Observamos o quanto foi sério para as crianças observadas o seu envolvimento com o brincar, realmente como um trabalho. Portanto, temos como objetivo nesse 3° capítulo apresentar a riqueza do brincar livre, em um espaço não escolar, como forma de ressaltar as habilidades e capacidades da criança para desenvolver as atividades que para elas tem tanto sentido, que a escola deveria tê-lo como seu recurso principal.

3.2 Registro - DIÁRIO DE CAMPO 1º REGISTRO – DIA 27/08/2016 DAS 14h00 ÀS 17h00

No primeiro momento da pesquisa, das 14h00 às 17h00, foram observadas crianças de diferentes idades compareceram no parque, dez crianças (4 meninas e 6 meninos) acompanhadas com os responsáveis. As crianças maiores estavam brincando com um pedaço de papelão, em que escorregavam na grama em uma parte alta do parque ecológico. As mesmas subiam e desciam escorregando com papelão da parte alta, corriam para ver quem chegava primeiro para escorregar novamente. Os responsáveis estavam sentados próximos das crianças menores, devido ao cuidado para não machucarem. Enquanto os maiores continuaram escorregando, estes responsáveis acompanharam seus filhos pequenos até o escorregador e balanços, participando e interagindo com eles no momento da brincadeira. Permaneceram no local 45 minutos e depois foram chamar as crianças maiores para irem embora. As crianças não obedeceram, desceram de onde estavam e foram pendurar nos brinquedos do parquinho. Depois de muita insistência, as crianças obedeceram aos responsáveis e foram embora, reclamando que gostariam de ficar mais. 32

Em outro episódio, visualizei na pista de skate três meninos brincando e um adulto acompanhando, provavelmente era a mãe de uma dessas crianças, interagindo com elas. A mãe ditava as regras da brincadeira (apostando corrida) explicando e representando para que eles entendessem como seria feito. Ela dizia: - Vou contar até três, quando falar já, vocês podem correr. Pronto! Assim, a brincadeira começou, um empurrava o outro para chegar primeiro, outro caia na pista de tanto rir. A mãe colocava regras para que a brincadeira fosse respeitada e eles tinham que obedecer. Brincaram por muito tempo até cansarem e foram embora. Neste primeiro momento desta pesquisa, observando as brincadeiras das crianças, foi possível ver que a mediação com o adulto pouco acontece, quando acontece não levam elas a refletirem, criarem e inventarem, devido até mesmo por ser um ambiente não escolar e por os pais não terem esse conhecimento dos benefícios que o brincar tem na vida da criança. A brincadeira da corrida foi um caso raro que aconteceu no momento em que estive ali. As crianças neste dia não levaram nenhum brinquedo de casa, brincaram somente com os brinquedos que o parque oferece. Também foi possível ver que algumas mães impacientes, permaneceram uns quinze minutos no parque, alegando que o mesmo não tinha nada de interessante. Já outras mães foram preparadas para ficar o máximo possível com as crianças para que elas brincassem. No momento da brincadeira tudo começou em grupo, sem nenhuma criança tomando a frente ou querendo ser a “líder”, mas brincando juntas a todo instante. Observei que também não ocorreu nenhum conflito entre elas, a hora que elas cansavam da brincadeira que estavam partiam para outra. As brincadeiras sempre terminavam quando os pais avisavam que estava na hora de ir embora, e não porque as crianças queriam parar. Se fosse por elas, ficariam ali por mais tempo, pois foi notório que no momento que teriam que ir embora ficaram bem chateadas e que aquele momento era lúdico e prazeroso para elas. 2º REGISTRO – DIA 28 /08/2016 DAS 14h00 ÀS 17h00

No segundo momento no parque ecológico, das 14h00 às 17h00, ao chegar já tinha um número grande de crianças brincando e correndo.

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Aproximei-me onde tinha cinco crianças (três meninos e duas meninas) pulando corda, a mãe de uma das crianças segurava em uma ponta da corda e uma criança na outra ponta e batiam. Observando a mãe, que dizia: - Pula um de cada vez, vou contar até vinte quem errar vai saindo, entenderam? As crianças começaram a brigar, uma empurrando a outra para começar primeiro, até que a mãe interferiu e organizou a fila. Assim, a brincadeira começou: uma criança pulava até vinte e saía, entrava outra e assim por diante. Brincaram uns vinte minutos, até que uma criança deu sua opinião dizendo: - Vamos brincar diferente? As outras crianças olharam e disseram: - Como? A criança que tomou à frente disse: - Pular dois de uma só vez, vamos! As outras concordaram, mas teve conflitos, pois elas queriam escolher com quem iam pular e acabavam escolhendo a mesma criança. Uma criança muito brava e querendo mandar na brincadeira disse: - Eu não vou com ela, porque ela é muito ruim, não sabe pular corda, vou com outro e pronto, acabou. A outra criança grita: - Não, eu vou com ele, já tá decidido. O menino sentou-se no banco e ficou emburrado e as crianças começaram a brincar, até que passou alguns minutos e ele entrou na brincadeira, dizendo: - Depois vamos trocar né? A mãe para não gerar mais brigas, mudou os parceiros e continuou a brincadeira. Ela batia a corda e a outra criança que estava ajudando-a a bater revezava com outra criança para que também pudesse brincar. A mãe começou falando: - Pula com um pé só, agora com os dois pés, um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez, onze, doze, treze, quatorze, quinze, dezesseis, dezessete, dezoito, dezenove, vinte e saiam. Algumas crianças caiam porque não aguentavam pular com um pé só e seu colega do lado ficava bravo porque tinha que sair junto. 34

A brincadeira durou por muito tempo, até que as crianças resolveram brincar de forma diferente como: correr na pista de skate, subiam, desciam, corriam, imitando que estavam dirigindo caminhões, um dizia para o outro: - O meu caminhão corre mais que o seu. O outro respondia: - Vamos ver então, rum, rum, imitando o barulho do caminhão. Brincaram na pista umas dez vezes, por mais que as crianças estivessem cansadas, naquele momento realizavam o papel de faz de conta e era prazeroso para elas estarem ali. A brincadeira encerra quando a mãe diz que tem que ir embora. Do outro lado do parque, tinham algumas crianças brincando, me aproximei para ver que tipo de brincadeira estava sendo realizada pelas mesmas. A mãe e o pai estavam ao lado conversando e dê olho nos filhos. As crianças levaram brinquedos de casa como: bonecas, pá, baldinho, jogo de encaixe, pratinhos e outros. Tinha duas meninas e um menino, as meninas estavam com as bonecas nas mãos e o menino com as peças de bloco, enchendo de areia e dando forma e desmontando no chão. Uma das meninas pega sua boneca e fala: - Vamos brincar de boneca? A outra responde: - Sim, vamos! Elas começam a montar o cenário onde estavam criando e imaginando ser filhinha e mamãe, até que uma delas diz: - Você quer comidinha filinha, a mamãe vai fazer pra você? Elas pegam as panelinhas, pratinhos, areia e água, como se fosse papinha e fazem de conta que estão alimentando suas filinhas. A menina fala: -Agora que você já comeu sua papinha, vamos dormir, viu filinha? A outra criança diz: -É agora vamos dormir que a mamãe quer descansar também, bom soninho! As meninas colocam suas bonecas para dormir e correm até sua mãe e dizem: -Mamãe, nossas filinhas acabaram de dormir. A mãe diz: -Que bom, queridas! Cuidaram bem delas? Elas responderam: 35

-Sim E a mãe pediu que elas guardassem os brinquedos para irem embora, e que outro dia voltariam para brincar novamente. As crianças concordaram e foram guardar os brinquedos. Assim, quando aproximei dos pais e conversando com eles, a mãe disse que é professora e o pai encarregado de uma empresa e que sabiam da importância desses momentos na vida dos seus filhos e por isso sempre reservam um tempo para levá-los para brincar. Durante a observação feita no parque, os brinquedos nas mãos das crianças fazem com que elas mergulhem no seu mundo imaginário, podendo ser tudo que elas imaginam e criando situações, pois brincando a criança vai compreendendo e se aproximando do mundo real. Nesse sentido é importante que a criança tenha tempo e espaço para brincar, pois a brincadeira ajuda as crianças a se desenvolverem futuramente e brincando liberam sua criatividade. 3º REGISTRO – DIA 07/09/2016 DAS 14h00 ÀS 17h00

No terceiro momento, realizei o último dia de registro de campo. Chegando ao parque das 14h00 às 17h00, tinha quatro crianças brincando no parquinho, os outros espaços do parque estavam vazios, somente a área de vôlei estava ocupada por alguns adolescentes que jogavam. Então me aproximei do local onde estavam as crianças menores e fiquei olhando suas brincadeiras. Elas corriam o tempo todo e penduravam nos brinquedos. Como cheguei depois, elas já estavam brincando, pude presenciar que estavam brincando de pega-pega. E corriam, subiam e desciam nos espaços livres do parque. Assim, brincaram várias vezes e na hora que cansavam, sentavam e descansavam e depois voltavam para brincadeira. Uma criança, como pude observar, toma à frente a brincadeira e decide por seus amigos, demostrou ser uma criança que não aceita a opinião dos outros, ele manda e pronto, acabou. De repente ele grita: - Ninguém tem uma bola, estou cansado de brincar de pega-pega. Todos concordam: -É mesmo, eu também. 36

Outra criança se manifesta e diz: - Eu tenho uma bola, vou até minha casa buscar, é aqui pertinho, rapidinho já volto. Sentaram e aguardaram o menino chegar, passou-se dois minutos, o menino chega e eles gritam: - Valeu! - Joga a bola daí que pego daqui com o pé, diz um dos meninos. O menino jogou a bola, outro fez um pouco de graça com a mesma, segurou na mão e ditou como seria a brincadeira e disse: Vamos fazer um gol? Os outros responderam: - Com que? O menino responde: - Com chinelo mesmo, não tem nada vamos fazer com nossos chinelos. - Tudo bem, disseram os outros. E quem vai ficar no gol? Perguntou um dos meninos. Os outros dois respondem: - Eu não vou, vai você? Outro responde: - Eu não, porque não vai você. Tudo gerou um grande conflito, mas concordaram entre eles. Até que uma criança, de novo tomou à frente e escolheu qual jogador cada criança seria. Alguns insatisfeitos com a escolha do amigo aceitaram e assim deram continuidade com a brincadeira. Permaneceram ali jogando umas dez partidas e durante estas partidas teve conflitos e brigas, eram resolvidas entre eles mesmos. Mas sempre a mesma criança quem tomava à frente e pedia para que parassem de brigar, caso não acontecesse, eles iam sair da jogada e acabaria o jogo, assim todos obedeciam. É como se ele fosse o líder e eles tinham que obedecer. Cansados, pararam a brincadeira e foram todos juntos embora. Demonstraram satisfeitos e realizados com os momentos que passaram brincando. Em seguida, foram chegando mais crianças, dois meninos e uma menina acompanhadas de dois adultos. Um dos meninos estava vestido com a capa do Batman e outro com um carrinho na mão, já a menina segurava uma sacolinha com vários brinquedos. 37

O menino com a capa do Batman corria e descia a escada do parque segurando no corrimão e dizia: -Eu sou Batman, agora vou te pegar, saia da minha frente. O outro menino sentou-se sozinho na areia com seu carrinho e começou a encher seu caminhão de terra e despejar em um cantinho, imaginando que estava dirigindo um caminhão e fazia o som. Até que o menino vestido de Batman aproxima e diz: - Posso brincar com você? Ele responde: - Com meu caminhão não, pegue outro carrinho pra você brincar. O menino foi até sua mãe e pegou alguns brinquedos como: carrinhos pequenos e dois bonecos dos personagens Homem Aranha e o Huck. Sentou-se no chão e montou o cenário e começou a brincar sozinho, dizendo: - Agora você não me pega, eu sou o Homem Aranha, tenho poderes! E pulava com os bonecos como se estivessem lutando e usava os carrinhos para simular que estava fugindo do inimigo e dizia: - Você não vai vencer, porque vou destruir você. - Agora chega, você vai morrer. O menino continuou brincando sozinho, enquanto o irmão brincava ao lado com seu caminhão de areia. Ele demonstrou ser um menino que prefere brincar sozinho, porque toda hora que seu irmão aproximava dele, ele dizia: - Você não vai brincar comigo, você destrói toda minha brincadeira, sai daqui. A mãe dizia: - Deixa ele brincar com você ou vamos embora. O menino emburrava, mas não brincava com o irmão, até que a mãe falou: - O deixe sozinho, brinque com sua irmã. Assim o menino fez, juntou-se com sua irmã e começou a brincar. Pegaram alguns potinhos e encheram de areia e começaram a montar no chão, colocavam as peças dos blocos em volta e sua irmã lhe dizia: - Olha parece um castelo! O irmão responde: - Verdade, vamos fazer o castelo mais alto? A irmã animada diz: 38

-Vamos! Os dois brincaram por muito tempo na areia, até que resolveram ir aos escorregadores, subiam e desciam correndo e falavam um para outro: -Vamos ver quem desce mais rápido? A irmã grita: - Eu vou ganhar, eu sou mais rápida. A irmã, durante a brincadeira, brigou com seu irmão porque o mesmo agarrava na sua blusa para não subir primeiro, aí gerava briga e ela dizia que não ia brincar mais com ele. Mas mesmo assim continuou brincando. Desceram e subiram umas cinco vezes até que sua mãe chamou-os para irem embora. As crianças nem ligaram para a chamada da mãe, só depois de muita insistência é que pararam a brincadeira e foram para casa.

3.3 Análise do Diário de Campo

Durante a pesquisa realizada, pudemos observar que o brincar é muito importante na infância, pois quando a criança brinca com prazer, ela se realiza, se potencializa, trabalha múltiplas habilidades e ainda contribui para que a criança se aproprie de vários conhecimentos. Para Kishimoto (2007), a imagem da infância é enriquecida com o auxílio da escola que reconhece o papel das brincadeiras no desenvolvimento e na construção do conhecimento infantil. Segundo Fontana e Cruz (1997), brincar na escola é diferente de brincar na casa, na rua ou até no parque ecológico, pois o cotidiano escolar é marcado pelas características, pelas funções e pelo modo de funcionamento dessa instituição. Brincando a criança imagina, cria, faz de conta, ou seja, a criança tem a liberdade de ser tudo o que imagina. Fontana e Cruz afirmam que, “Brincar é experimentar-se, relacionarse, imaginar-se, expressar-se, compreender-se, confrontar-se, negociar, transformar-se, ser”. (1997, p.139). No parque ecológico, onde foi realizada a pesquisa, o ambiente é acolhedor para as crianças, pois as mesmas demonstraram muito prazer em estar ali. Para Teixeira (2010, p.48):

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Podemos dizer, então mesmo quando brinca espontaneamente, a criança não está apenas passando o tempo, já que sua escolha é motivada por razões internas, desejos e ansiedades. O que ocorre em sua imaginação é o que determina suas atividades, e o brincar funciona com sua linguagem secreta, sua forma de interagir com o meio, o que deve ser respeitado, mesmo quando não compreendemos.

Através das brincadeiras as crianças realizaram atividades vivenciadas no seu convívio, foi possível ver momentos em que fantasiavam e imitavam os adultos, com coisas e objetos da vida real e assim iam se aproximando da sua realidade. “O brincar também possibilita às crianças desenvolverem suas próprias habilidades de pensamento. Elas superam a sua própria condição infantil, agindo como se fossem maiores, desafiando seus limites.” (TEIXEIRA, 2010, p.48). Registro 2 p. 36 “Você quer comidinha filinha, a mamãe vai fazer pra você”. Registro 3 p. 38 “Eu sou o Batman, agora vou te pegar, saia da frente”. Em vários momentos onde aconteciam as interações e brincadeiras das crianças, as mesmas assumiam vários papeis como: super-heróis, mamãe, filhinha, jogador de futebol, caminhão e outros, ou seja, a criança transporta para a brincadeira tudo o que é do seu mundo real. Através de todas essas brincadeiras ela dá sentido às coisas da vida. Segundo Fontana e Cruz (1997), pelas brincadeiras a criança fala, pensa, elabora sentidos para o mundo, para as coisas, para as relações. A brincadeira é, então, a forma possível de satisfazer a essas necessidades, já que possibilita à criança agir como os adultos (dirigindo um carro, cuidando de um bebê, fazendo “comidinha”) em uma situação imaginária. Para Vygotsky, a situação imaginária da brincadeira decorre da ação da criança. Ou seja, a tentativa da criança de reproduzir as ações do adulto em condições diferentes daquelas em que elas ocorrem na realidade é que dá origem a uma situação imaginária. (FONTANA e CRUZ, 1997, p.123).

Conclui-se que o brincar, sendo ele livre ou dirigido, tem uma ação positiva na vida das crianças e elas precisam de tempo, espaço, companhia e material para brincar, pois geram aprendizagem e seu desenvolvimento intelectual. Segundo Teixeira (2010), no ato de brincar, a criança explora o mundo e suas possibilidades, e se insere nele de maneira espontânea e divertida, desenvolvendo assim suas capacidades cognitivas, motoras e afetivas. Criança que não brinca, que desenvolve, muito cedo, a noção do “peso” da vida, não tem condições de se desenvolver de maneira sadia. De alguma forma, esta lacuna irá manifestar-se em sua personalidade adulta. Se não se tornar completamente neurótica, perceberemos, em seu comportamento, traços neuróticos e até psicóticos e, muitas vezes, esta pessoa “carregara” sempre a vida como se esta fosse uma “provação”, um “sacrifício”, “um dever” a ser cumprido. Dificilmente conseguirá

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soltar-se, ser feliz com as pequenas coisas e sentir um prazer genuíno. (TELES, 1997, p.14).

Segundo Marcellino (1999), a escola de Educação Infantil precisa dar continuidade para que o brincar aconteça em seu espaço, para que a criança tenha direito de ser criança, de brincar, de jogar, ter contato com outras crianças. O brincar dirigido acontece com ajuda dos profissionais conscientes e preparados para interagirem e organizarem o espaço para que o brincar aconteça, para fins de aprendizagem, onde os mesmos irão propor desafios e seleção das brincadeiras adequando às crianças envolvidas, respeitando princípio e individualidade das crianças. Brincar é preciso, é dessa forma que as crianças descobrem o mundo, se comunicam e se inserem em um contexto social.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa levou-me à descoberta de quanto o brincar é fundamental na vida da criança, considerando que o brincar faz parte da infância e que contribui para o desenvolvimento do pensamento da mesma. O presente trabalho leva a refletirmos e entendermos a importância do brincar na Educação Infantil e, como educadores, não devemos negar este momento, seja no ambiente escolar ou fora dele. Sabemos que o brincar é fundamental na vida da criança, pois é por meio dele que ela se desenvolve, aprende a se relacionar com as outras crianças e com o mundo em que está inserida. É importante que as escolas de educação infantil ofereçam um ambiente de qualidade, no qual o brincar seja favorecido, para que as crianças possam ser estimuladas às interações sociais e que seja um ambiente enriquecedor para a imaginação infantil, porque é através do brincar que as mesmas aprendem, tornando os momentos das brincadeiras em aprendizagens que fazem sentido para a criança. Ressaltamos a importância de valorizar a prática do brincar, do lúdico, para incentivar as crianças na Educação Infantil a desfrutar das contribuições que o mesmo trará para o desenvolvimento, pois o brincar comunica e faz descobrir suas habilidades com prazer, no seu mundo de faz de conta. As crianças possuem inúmeras maneiras de pensar, de jogar, de brincar, de falar estudar e se movimentar e, por meio destas diferentes linguagens, se expressam no seu cotidiano, ou seja, no convívio escolar e familiar, construindo assim uma identidade infantil. No entanto elas imaginam, falam, fantasiam, colecionam, reconstroem o seu mundo infantil e torna-se muito importante oferecer várias atividades com as mesmas brincadeiras que estimulem suas habilidades e possam descobrir seus talentos próprios. A brincadeira na Educação Infantil não deve ser entendida apenas para a melhoria das aprendizagens cognitivas, mas também para satisfazer as necessidades das crianças, viver a brincadeira. Quando a criança está brincando, seu corpo está em movimento interagindo com outras crianças e com o meio em que vivem produzindo culturas. Desta forma, as práticas escolares devem respeitar e compreender a capacidade de produzir conhecimentos fundamentais para desenvolvimento das crianças no brincar, levandoas a pensar nas suas atitudes, que geram novas capacidades, que desenvolvem novas habilidades de descoberta do mundo. 42

A criança quando está realizando vários tipos de brincadeira, estas têm efeitos significativos no seu desenvolvimento afetivo, motor, social e cultural. Por meio da pesquisa de campo concluímos que por meio das brincadeiras a criança tem enorme oportunidade de se desenvolver, pois possibilita a ampliação das habilidades motoras, bem como dos aspectos sociais e emocionais. A escola de Educação Infantil deve assumir a responsabilidade de proporcionar momentos bem planejados, envolvendo a brincadeira, organizando, participando, observando e dando oportunidade para que a criança possa criar maneiras autônoma. Portanto, espero que esta pesquisa sirva de auxílio para futuros pesquisadores que buscarão conhecimento do quanto o brincar contribui para desenvolvimento/aprendizagem da criança, podendo fazer com que essa prática se realize de verdade no contexto escolar e na vida da criança.

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